Lisboa foi o grande centro das
navegações dos séculos XV e XVI, onde se realizaram notáveis avanços na
cosmografia, cartografia, construção naval, farmacopeia e em muitas outras áreas
do conhecimento.Aqui viverem grandes navegadores e aventureiros
como Diogo Cão, Bartolomeu Dias, Cristovão Colombo, Vasco da Gama, Pedro Alvares
Cabral, John Cabot, Juan de La Cosa, mas também aldrabões como Américo Vespúcio.
Colombo fez questão de deixar
escrito que durante catorze anos, isto é, entre 1470-1484 ou 1474-1488, procurou convencer D. João II, a aceitar
a aceitar a sua ideia de atingir a Ásia navegando para Ocidente, mas o rei não
se deixou convencer. A maioria dos seus encontros com o principe e depois
rei, terão ocorrido certamente
em Lisboa.
Foi em Lisboa, como veremos, que viveu, casou
com Filipa Moniz Perestrelo e teve vários filhos. Aqui residia também o seu
irmão Bartolomeu Colón, ao que sabemos desde muito novo.
2. Fixação
Hernando Colón, afirma que o seu
pai - pobre tecelão de Génova - veio para Lisboa, em Agosto de 1476, na
sequência de uma batalha e de um naufrágio ao largo do cabo de S. Vicente, no Algarve.
Colombo teria nadado até à costa, onde foi socorrido e protegido pela população,
vindo depois para Lisboa.
Estamos
perante uma historieta fabricada para ocultar a sua identidade. A sua presença
em Lisboa é seguramente muito anterior. Sabemos que, em 1470, um corsário de
nome Pedro Coulão andava ao serviço de
D. Afonso V, nomeadamente a atacar navios de Veneza.
2.1. Local de Culto
Após se fixar em Lisboa, ao contrário do que seria de esperar, não frequentava a
Igreja da comunidade italiana de Lisboa, a Igreja do Loreto
Escolheu para ir à missa uma
igreja fora de portas, distante do centro da cidade: - a Igreja do Convento de Santos,
viuvas e familiares dos cavaleiros da Ordem de Santiago de Espada de Portugal.
O local marcava o fim da cidade e o inicio do campo.
O convento era frequentado por
D. João II, que
foi mestre
desta Ordem militar entre 1472/3 e 1491 (11).
"...( Colombo ) costumava ir à
missa ao mosteiro de Santos de que Filipa era comendadora, e teve tanta prática
e amizade com ele que se casaram.", Hernando Colon, Historia del Almirante
A acreditar na
biografia oficial, Colombo frequentava um dos conventos mais importantes da
cidade no século XV, onde só a alta nobreza tinha acesso.
Real Paço de
Santos, na primeira metade do século XVI. Reparar nos barcos na praia de
Santos, num marco cravado na areia, assim como na magnifica cerca do convento
que chegava até ao rio Tejo. Pormenor da iluminura de Simon Bening (1483-1561),
na Genealogia dos Reis de Portugal, Londres, Museu Britânico.
História da Zona
de Santos. O Convento de
Santos guardou até 1490, as relíquias dos santos mártires de Lisboa - Veríssimo, Máxima
e Júlia -, as mais antigas da cidade e que simbolizam a sua
conversão ao cristianismo (4). A procissão dedicada a estes santos mártires era das
mais imponentes.
Após a reconquista de Lisboa
(1147)
foi erguida no local uma ermida em memória destes mártires. Em 1194 junto à
ermida foi construído
um convento para os cavaleiros da
Ordem de Santiago de Espada. Quando estes mudaram a sede Ordem para
a vila de Alcácer do Sal, o Convento de Santos passou para a albergar
viúvas e filhas solteiras destes cavaleiros (1233).
A zona de Santos até
ao século XVI era um arrabalde de Lisboa, caracterizado por uma extensa praia. O
cruzado Orborne diz que o local pertencia a Campolide, outros mais tarde dirão
era da Bela Vista.
Apesar da praia não
possuir um cais, não deixava de ser muito frequentada por navios que aí
estacionavam, nomeadamente os que estavam envolvidos no tráfego marítimo entre
as duas margens do rio Tejo. No princípio do século XV, Fernão Lopes,
escrevia o seguinte sobre a praia de Santos: "par a gramde espessura de mujtos
navios que assi jaziam ante a cidade, como dizemos, híam ante as barcas Dalmadaa
aportar a Santos que he hum gramde espaço da çidade, nom podendo marear
perantrellas".
A partir do século
XV, com o impulso dado pelos descobrimentos marítimos começam a surgir no local
estaleiros navais ao longo da praia de Santos e de Boa Vista, assistindo à
fixação de grande número de pescadores, marinheiros e gentes do mar.
Em resultado
do crescente número de navio no local, em 1478, segundo Júlio de
Castilho, surge um "empalmadeiro" de naus e navios na praia de Santos. A praia
começa a ser alvo de sucessivos aterros para a construção de estaleiros e
ancoradouros, constituídos por tabuleiros assentes em estacas muito juntas,
espetadas a maço no mar (Damião de Góis).
D. João
II mandou erguer na praia de Santos uns marcos que assinalavam aos que chegavam
de barco à cidade, que careciam de autorização para o puderem fazer, uma medida
destinada a evitar a propagação de
epidemias.
Face a esta profunda
transformação da zona de Santos, D. João II, 1490, mandou construir um novo convento para as comendadeiras a
oriente da cidade. O
local do antigo convento passou a ser denominado de Santos-o-Velho, e o do novo
de "Santos-o-Novo", para onde foram
levadas as relíquias dos santos mártires.
Com
excepção da Igreja, o que restava do antigo convento de Santos foi
"alugado", pouco depois de 1490, por Fernando Lourenço (9), feitor da Casa da Mina,
que o transformou num bonito palácio.
O rei D. Manuel I gostou tanto do
palácio que dele tomou posse, em 1501, transformando-o no Paço Real de
Santos. O Rio Tejo banhava a cerca do paço.
Foi nele que recebeu
neste ano, o embaixador de Veneza que vinha solicitar o seu apoio na luta contra
os turcos. Reza a tradição que foi nele que assistiu à chegada da
armada, a 25/2/1514, que trazia a embaixada do Prestes João, e aqui recebeu o embaixador. Com
a morte de D. Sebastião, em Alcácer-Quibir, o paço entrou em decadência.
Mais tarde tornou-se na residência dos descendentes do Duque de Aveiro
(1626),
e de seguida morada dos marqueses de Abrantes. O magnifico edificio alberga
atualmente a
embaixada da França.
A criação do Paço
Real de Santos deu um enorme impulso à fixação no local da população. A comunidade de
pescadores e negros acabou por dar origem ao bairro da Madragoa, onde
surgirá o conhecido o Mocambo, um bairro dos
negros.
2.2. Uma lenda
Inspiradora
A lenda dos santos
mártires de Lisboa terá inspirado a criação da história de duas chegadas de
Colombo a Lisboa.
A versão mais antiga
da lenda destes mártires aparece no Martiriológio de Usuardo que data de
875. A partir desta data estes mártires são referidos noutros textos, sendo o
seu culto muito difundido no antigo condado Portucalense, no condado
de Coimbra e na Galiza (8). Lendas que seriam do conhecimento dos
frequentadores do Convento de Santos.
Numa versão da lenda afirma-se que
os três irmãos, de origem aristocrática, viviam em Roma quando lhes apareceu um
anjo que lhes disse para virem para Lisboa, onde "alcançariam a coroa do
martírio"(9). Em Lisboa foram martirizados e os seus corpos atirados à água no
meio do Rio de Tejo, mas milagrosamente vieram ter ao local que ficou conhecido
de Santos.
No século XV, antes
de 1471, foi escrita uma narrativa apócrifa destes mártires (5) que Colombo
certamente conheceu (6).
Terá igualmente
conhecido o mais famoso dos milagres do século XV ligado ao culto destes
mártires (7).Este milagre ocorreu, em 1471, envolve uma batalha, uma tempestade
e um naufrágio. Quando D. Afonso V conquistou Arzila, haviam muitos soldados no
mar, que foram apanhados por uma tempestade de noite. Perante o perigo pediram perdão e protecção aos mártires de Lisboa.
Milagrosamente foram levados até Cádiz e dali a Barrameda, regressando são e salvos a
Portugal.
2.3. Um Episódio
Marcante
Na altura que
Colombo frequentava o Convento de Santos, D. João II, ainda príncipe,
também o fazia. Há um episódio histórico que regista este facto.
Quando D. Afonso V
foi para França, D. João ficou como rei em Portugal. Estando a viver nas casas
do convento ou num paço junto ao mesmo (10), no dia 10 de Novembro de 1477,
soube que D. Afonso V havia regressado a Portugal, e já se encontrava em Cascais.
Perguntou então ao Duque de Bragança e ao arcebispo de Lisboa D. Jorge
da Costa, como é que havia de tratar D. Afonso V, se como pai ou como rei. A resposta que
lhe foi dada, segunda a lenda, não lhe teria agradado.
3. Família
Colombo tinha família em Lisboa? As
versões são contraditórias.
3.1. Bartolomeu Colon
Uns afirmam que, em 1476, já residia Lisboa o seu irmão
Bartolomeu Colon, que se
dedicava à cartografia. Outros, dizem que Colombo foi o primeiro a residir em
Lisboa, tendo pouco depois mandado vir o seu irmão, ambos tendo-se dedicado
inicialmente à cartografia.
Bartolomeu Colón viveu em Lisboa até
1488, quando foi para Inglaterra para vender a ideia do seu irmão. Las Casas
afirma encontrou documentos que comprovavam que Bartolomeu e/ou Colombo
participaram na viagem de Bartolomeu Dias ao Cabo da Boa Esperança. A sua ida
para Inglaterra teria, segundo Jaime Cortesão, o objectivo de divulgar (vender)
esta preciosa informação. Em 1493 teria regressado a Lisboa, antes de se dirigir
para Castela.
3.2. Filipa Moniz Perestrelo
O convento de Santos, albergava no século XV, apenas 12 comendadeiras, isto
é, mulheres, viúvas
e filhas de cavaleiros da Ordem de Santiago de Espada. Esta ordem militar
foi estabelecida em Portugal, desde o inicio da nacionalidade (XII), podendo os cavaleiros
casarem-se.
Foi neste
convento que conheceu a sua futura esposa -
Filipa Moniz Perestrelo - uma das 12 comendadeiras
da Ordem de Santiago de Espada.
Quando Colombo
frequentava o Convento, a madre comendadeira - D. Ana de Mendonça
- era amante do próprio rei D. João II, tendo desta relação nascido um filho
- D. Jorge de Lencastre (1480 -1550). O seu pai fez tudo para que fosse
rei, entre 1491 e 1494, dando-lhe o ducado de Coimbra, o senhorio de
Montemor-o-Velho, tendo-lhe sucedido como mestre de Santiago de
Espada.
Igreja
de Santos, em Lisboa. Foi na primitiva Igreja que existia neste mesmo local
que Colombo conheceu e se casou com Filipa Moniz Perestrelo. Pode-se observar
ainda os enormes muros que rodeavam o convento, onde hoje está instalada a
Embaixada de França em Portugal.
3.2.1. Igreja de
Santiago
Não há
consenso sobre o ano em que Colombo se casou com Filipa Moniz Perestrelo.
Apontam-se datas entre 1478 e 1484 ! Uma coisa é certa: Este casamento carecia
de autorização real, dado que D. João II era o Grão-Mestre desta
Ordem Militar. O casamento terá sido realizado na igreja de Santiago
junto às Portas do Sol.
3.2.2. Filhos
Colombo deixou escrito, em três momentos diferentes, que tinha vários filhos de
Filipa Moniz Perestrelo, quando foi para Castela em fins de 1484. O único nome
que se conhece filho conhecido é Diogo
Colon, que veio a ser o 2º. Almirante das Indias.
3.2.3. Panteão
Familiar: Convento do
Carmo (Lisboa)
A familia
de
Filipa Moniz Perestrelo, tinha o
seu panteão na Igreja do Carmo em Lisboa.
Filipa foi aqui sepultada, em 1497, na
Capela da
Piedade. Ao contrário do que se afirma, não morreu em 1484. O próprio
Colombo desmentiu esta afirmação, ao dizer que em 1484 deixara em Portugal
"mulher e filhos".
Este convento era o terceiro maior edificio religioso da cidade,
logo a seguir à Sé e ao Convento de S. Francisco. Foi fundado por D. Nuno
Alvares Pereira e pertencia à Ordem dos Carmelitas.
Um dos tios de Dª.
Filipa - Frei Christovam Moniz -, pertencia a Ordem dos Carmelitas, tendo
sido eleito prior deste convento em 1510, cargo que exerceu até 1528. Em
1518 recebeu um avultado empréstimo de D. Diego Colón - 100 castelhanos em
ouro. Em 1523 estava em Sevilha a fazer negócios com Diego Mendez Segura. D.
Diego Colón contemplou Frei Christovam Moniz, neste ano, no seu Testamento.
A familia de Colombo
estava certamente envolvida nas cerimónias que, em 1522, rodearam a
transladação dos restos mortais de D. Nuno Alvares Pereira para um novo
túmulo em alabastro. O túmulo foi oferecido por Dona Joana (1479-1555),
Duquesa de Borgonha e da Flandres, mulher de Filipe I de Castela, filha dos reis
católicos e mãe de Carlos V e tetraneta de D.Nuno. A cerimónia de
transferência foi feita na presença de D. João III.A neta de
Colombo, casou-se com D. Jorge de Lencastre, descendente directo de D. Nuno
Alvares Pereira.
4. Amizades e
Cumplicidades
Quem eram os amigos
de Colombo em Lisboa? Se tivermos em conta, os seus escritos, mas também outros
que lhe são atribuídos pela historiografia italiana, tinha um numeroso e
influente grupo de amigos em Lisboa.
4.1.D. João, Principe e
Rei
Colombo, como
dissemos, afirma que durante 14 anos andou em conversações com este rei, cujos
explorações marítimas lhe haviam sido confiadas, em 1474, pelo seu pai D. Afonso
V.
O rei ter-lhe-á
facultado, por exemplo, a correspondência trocada com Toscanelli, por
intermédio do cónego Fernando Martins,
em 1474.
Paços
da Alcaçova, no início do século XVI.
Fragmento
da iluminura da Crónica de D. Afonso Henriques, por Duarte de Galvão. Museu
Castro de Guimarães, Cascais. O
Palácio real das Alcaçovas foi durante todo o século XV a principal
residência dos reis de Portugal. Foi aqui que nasceu e viveu grande parte do
tempo D. João II. Estes Paços estão ligados ao momentos decisivos das
explorações marítimas do mundo. D. João III também aqui nasceu (1502), dois
dias depois o mestre Gil Vicente fez nestes Paços a sua 1ª. apresentação de
um Auto ( Monólogo do Vaqueiro ).
Colombo faz questão
de assinalar alguns encontros, em Lisboa, onde D. João II esteve presente
Igreja de Carnide
Era nesta igreja de Lisboa que os navegantes deixavam muitas coisas curiosas,
como as célebres canas de bambu que vieram dar à ilha da Madeira e ilha do Faial
(Açores) e que comprovavam a existência de terras a Ocidente. Colombo, Martin
Behaim e Jerónimo Munzer falam delas. Foi aqui que D. João II se reuniu,
em Junho de 1483, com Cristovão Colombo para discutirem, uma vez mais, a
questão da existência de terras a ocidente.
José Vizinho
No ano
de 1485 regressou a Lisboa para assistir nos
Paços Reais à exposição de matemático José Vizinho dos seus cálculos
astronómicos feitos na Guiné, com vista à determinação da altura do Sol.
Elementos fundamentais para a navegação astronómica.
Bartolomeu Dias
Em Dezembro de 1488 estava novamente em Lisboa para assistir à chegada de
Bartolomeu Dias da sua viagem ao Cabo da Boa Esperança. Ter-se-á deslocado a
Beja, para assistir nos Paços do Duque de Beja à discussão dos resultados da
expedição com D. João II.
A amizade era enorme
entre o rei e o navegador, ao ponto do primeiro o tratar por "especial amigo"
(1488). Esta ligação a D. João II revelou-se sempre perigosa, por isso a
procurou ocultar. No célebre Memorial de Mejorada
(1497), afirma que a 4 de Março de 1493, D. João II estava em Lisboa, querendo
desta forma dizer que não teve outro remédio senão encontrar-se com o rei.
Trata-se de uma típica mentira de Colombo. Na verdade teve que fazer uma grande
jornada para se encontrar com o rei, tendo mantido conversações durante três dias. Em 1500 refere,
numa carta, as acusações que foi alvo quando se dirigiu para Lisboa. Acusaram-no
de ter ido entregar as Indias a D. João II (Textos, 434).
4.2. Alta Nobreza
Colombo, devido ao
seu casamento com Filipa Moniz Perestrelo era aparentado com a alta nobreza de
Portugal, nomeadamente a Casa de
Bragança e a casa do
Duques de Beja-Viseu. Esta terá sido uma das razões porque "fugiu" para
Castela, como fizeram muitos outros nobres portugueses envolvidos nas
conspirações de 1483 e 1484. Mais
Entre os seus protectores e amigos
em Castela, destaca-se o
poderoso chanceler do reino - D. Alvaro de Bragança -, que tinha o seu paço na
freguesia de S. Cristovão. Ainda subsiste um dos portais deste paço. O seu filho - D. Jorge de Bragança -, casou-se com a neta de
Colombo. Os descendentes de D. Alvaro vieram a herdar o títulos e domínios de
Colombo.
Não muito longe dos Paços de S.
Cristovão, ficava os Paços de Santo Elói da rainha Dona Leonor, com quem Colombo
se reuniu no Convento da Castanheira após o seu regresso da América.
4.3. Navegadores
Colombo faz questão de assinalar o
nome de navegadores e cosmógrafos portugueses, procurando demonstrar a sua
enorme familiaridade com os mesmos.
Distingue, inclusive, homónimos. A 4
de Março de 1493, faz questão de afirmar que conversou no Tejo com Bartolomeu
Dias de Lisboa, que era distinto do Bartolomeu Dias do Cabo da Boa Esperança.
Fica em Pirescoxe
(Sacavém), nos Paços do almirante Castelo Branco, em Alhandra na casa de Afonso
de Albuquerque, etc.
4.4. Florentinos
Em Castela os únicos
italianos com que se dava era com os florentinos, mas desde que estivessem vindo
de Lisboa. Entre eles destacam-se Bartolomeu Marchione e Juanoto Berardi.
Bartolomeu Marchione
(ou Marcchionni), o possível financiador da 1º. viagem de Colombo Foi
sepultado, em 1527, na Igreja de S. Domingos, mas precisamente na Capela do Espírito Santo, onde tinha jazigo perpétuo
para si e a sua descendência.
Em 1497
quando D. Manuel I para agradar aos reis de Espanha, obrigou os judeus a
converterem-se à força ao cristianismo, um grande número deles escolheu esta
igreja para o fazer. Dez anos depois foi na mesma que ocorreu um pseudo-milagre envolvendo um judeu que acabou por desencadear um pavoroso
massacre de judeus na cidade de Lisboa. A Inquisição anos depois instalou-se
junto ao local.
Juanoto de Berardi, era filho de
Lourenço de Berardi. Estabeleceu-se em Lisboa, na primeira metade do
século XV. Foi sócio de D. Lopo de Almeida na exploração das minas de ouro
da Adiça, na foz do Rio Tejo (1469-1473?).
Hernando Colon
(Hist. del Almirante, cap.VII), afirma que Lourenço de Berardi foi quem
em Lisboa, ao saber do interesse de Colombo pelas coisas do mar, o informou da
correspondência entre o cónego Fernando Martins da Sé de Lisboa e Paolo
Toscanelli sobre as possibilidade de uma viagem entre Lisboa e a Ásia navegando
sempre para ocidente, e os colocou em contacto. A célebre carta de Toscanelli
foi escrita em Florença, a 25 de Junho de 1474.
4.5. Judeus
Colombo tinha uma
relação muito intima com os judeus e
cristãos-novos. Lisboa, no século XV, tinha uma enorme comunidade de
judeus, três grandes sinagogas, etc. Entre os judeus com quem se cruzou em
Castela, destaca-se Isaac Abravanel,
natural de Lisboa.
É quase certo que Colombo viveu em Alfama. Conhecedores deste facto, os
falsários das suas alegadas dividas, fizeram-no amigo de um "judeu" que vivia
nas portas de Alfama (Codicilo, 1506).
4.6. Genoveses
Ao contrário do que se possa pensar,
Colombo não se dava com genoveses. Em Castela ignorou os grandes mercadores
genoveses. Os únicos que lhe são associados, aparecem apenas em documentos
considerados falsos ou falsificados. Tratam-se de papéis que foram forjados para
estabelecerem uma ligação do mesmo à cidade de Génova. Para dar alguma
credibilidade aos mesmos, os falsários viram-se na obrigação de associarem os
ditos genoveses sempre a Lisboa.
A verdade é que Hernando Colon e Las
Casas, tentando dar alguma coerência à história que criaram, afirmaram que
depois do naufrágio de 1476 (descrito com base num relato de 1486), Colombo veio
para Lisboa, onde se integrou na comunidade de genoveses aqui residente.
5. Aprendizagem
- Latim
Partindo do pressuposto que Colombo era o tecelão
genovês descrito na historiografia italiana, os historiadores foram obrigados a
admitir que o mesmo quando chegou a Lisboa era analfabeto (1). Foi aqui
que aprendeu a ler e escrever, aprendeu latim, aritmética e outros saberes que
quando foi para Castela revelou dominar.
- Cosmografia
Em Lisboa estudou cosmografia, astronomia e aprendeu a arte de navegar pelos
astros. É com grande orgulho que escreve que estava em Lisboa, junto de D. João
II, quando o mestre José Vizinho regressou da Guiné, com os
cálculos que efectuara sobre as alturas do Sol (Textos, 91). Diz que em Dezembro de 1488, estava
também em Lisboa quando regressou Bartolomeu Dias do Cabo da Boa Esperança. Deslocou-se
depois a Beja, para assistir junto do rei à apresentação dos resultados
da expedição. (Textos, 92).
"Este Cristóbal Colombo ...
cuando ya fué mancebo se dió al arte de la mer y pasó a Lisboa, em Portugal,
donde aprendió las cosas de cosmografia, etc". Bartolomeu las Casas, Hist. das
Indias, I, p.25.
Hernando Colon, afirma que Colombo,
depois de casar com Filipa Moniz Perestrelo foi viver para casa da sogra em
Lisboa, e não em Porto Santo, como se afirma. "Esta, al ver que él era tan
aficionado a la cosmografía .... le dio los escritos y cartas de marear que le
habían quedado de su marido. El Almirante, con ello, se entusiasmó aún más, y se
informó de los otros viajes y navegaciones que entonces los portugueses hacían
por la Mina y la costa de Guinea, gustándole mucho hablar con los que por allí
navegaban", Hernando Colon, Hist.del Almirante, cap. IV
Quem aprendeu primeiro cosmografia
em Lisboa? Colombo ou Bartolomeu Colon? Hernando Colon (Hist. del Almirante,
cap.II), afirma que foi Colombo que depois a ensinou ao seu irmão em Lisboa.
É possível que tenha aprendido estes
saberes nos Estudos Gerais de Lisboa. Como é sabido, aUniversidade de Lisboa
foi criada em 1290, sendo transferida para Coimbra em 1308. Depois de várias
andanças fixou-se em Lisboa entre 1377 e 1537.
Entre
os seus protectores foi o Infante D. Henrique que em 1431 lhe doou várias casas
e estabeleceu os estudos de Astronomia, apoiados na Aritmética e Geometria como
ferramentas imprescindíveis para os estudos nauticos.
Apesar
dos seus enormes conhecimentos nauticos, não é certo que Colombo tenha
estudado nas Escolas Gerais, situadas junto ao Mosteiro de S.
Vicente. O primitivo edificio ficava no Pátio dos Quintalinhos, no n.º 3 das
Escolas Gerais.
6. Navegações
Colombo faz questão de assinalar que
a partir de Lisboa navegou por todo o Oceano Atlântico, e contou não apenas na
cidade, mas também nestas viagens com os indícios da existência de terras
habitadas a Ocidente.
Afirma que com frequência navegou
de Lisboa para sul, tendo ido à Guiné (Textos, 90) e à Costa da Malagueta. Foi
ao Castelo de S. Jorge da Mina, que D. João II, mandou construir em 1481. Las
Casas afirma que encontrou provas nos documentos que consultou de Colombo que o
mesmo, e/ou o seu irmão foram em 1488 na expedição ao Cabo da Boa Esperança...
Para norte, a partir de Lisboa e ao
serviço de Portugal diz que foi a Inglaterra, a Galway (Irlanda), terá ido
também à Islandia ou mesmo à Gronelândia. Viagens que tem sido fixadas entre
1476 e 1477.
No final da vida, faz questão de
assinalar aos reis católicos numa carta, datada de 1502, para terem cuidado
com a escolha dos pilotos, porque nem todos conheciam efetivamente as rotas que passavam por Lisboa (Textos,
475).
7. Cartógrafo
Um dos grandes falsários italianos -
Agostino Giustiniani - foi o primeiro a afirmar que Bartolomeu Colon estava em
Lisboa, antes de 1476, dedicando-se à atividade de cartógrafo, tendo nela
iniciado Colombo.
Hernando Colon e Las Casas
acusaram-no de ser um falsário, deixando todavia entender que os dois irmãos
haviam exercido durante algum tempo a atividade de cartógrafos em Lisboa.
Em Castela, Colombo ter-se-ia
dedicado à venda de livros em Sevilha...
8. Agente Comercial
Um dos polémicos papéis falsificados
pelos italianos, os de "Assereto" (1904), tiveram o condão de introduzir ideia
que Colombo andou também no comércio de açucar da Madeira. Em Julho de 1478, o
mercador Paulo (ou Lucas) de Negro, residente como Colombo em Lisboa, enviou-o
como seu agente comercial à Madeira para adquirir uma quantia não determinada de
açúcar.
O dinheiro não apareceu no valor
acordado e o patrão do navio - o português Fernando Palensio não fez o
carregamento, manifestando-se prejudicado. Colombo atua como um simples agente
comercial, atribuindo todo o conhecimento dos factos e dos navios a Fernando
Palensio. No Tribunal de Génova, onde teria sido ouvido em 1479 sobre
caso, limita-se a afirmar que estava de partida para Lisboa onde residia.
Noutros escritos releva-se um
observador dos movimentos da Andaluzia para o porto de Lisboa. No dia 28 de Maio de 1498, assinala
que uns piratas franceses tomaram um navio que saiu de Palos para Lisboa,
carregado de trigo.(textos, 365).
Atento ao comércio de Lisboa, assinala em
Janeiro de 1505 que chegou da India navios carregados de ouro (textos, 526).
9. Imagem da Cidade
No dia 14 de Março de 1493, faz
questão de assinalar numa carta que o porto de Lisboa era a "maior maravilha do
mundo" (Textos, 226).
No dia 19 de Fevereiro de 1493, associa Lisboa a uma terra
de segurança.
Faz questão de assinalar no
Diário de Bordo da primeira viagem, que sabia muito bem a localização de Lisboa.
No dia 15 de Fevereiro de 1493, regista que havia muitos enganados se julgavam
junto ao Cabo da Roca em Sintra, junto a Lisboa. A partir da ilha de Santa Maria
(Açores), dirigiu-se directamente para Lisboa. Se alguns a bordo continuavam sem
saberem onde estavam, Colombo no dia 4 de Março faz questão de assinalar onde se
encontravam - cabo da Roca, perto de Sintra- , e que o sabia reconhecer
perfeitamente.
Colombo, não necessita de ajuda para
entrar no Rio Tejo, no regresso da primeira viagem. Faz questão de assinalar que
conhece muito bem a sua foz do Rio Tejo , nomeadamente as minas de ouro da
Adiça.
Conhecedor do sistema defensivo do
Tejo, Colombo não deixa de registar o imponente navio que D. João II havia
mandado construir para defender a cidade. No Diário de Bordo, a 5 de Março 1493,
escreve que a nau estava fundeada no Restelo era " la más bien artilhada de
artillería y armas que diz que nunca nao se vido", o seu patrão chamava-se
Bartolomeu Dias de Lisboa e o capitão Alvaro Damião.
Garcia de Resende, numa descrição
próxima da de Colombo, refere que esta nau tinha "mil tonéis... que foy a mayor
e mais armada que se nunca vio, mais a fez pera guarda do rio que pera nauegar"
(cap.CLXXXI).
10.
Recepção Entusiástica
Se população de Cascais rezou para
que a caravela de Colombo se salvasse da tempestade, quando este regressou da
América, a população de Lisboa recebeu-o de forma
entusiástica. O capitão da nau, depois de saber que quem vinha a bordo da
Niña era Colombo, "con mucha orden, con atabales y trompetas y añafiles,
haziendo gran fiesta vino a la caravela, y habló con el Almirante y le ofreció
de hazer todo lo qu`él mandase." (5/3/1493)
&
A caravela de Colombo começou por lançar ferros, no dia 4 de Março de 1493, no
Restelo, à entrada de Lisboa, um local carregado de história das
explorações maritimas ao longo de vários séculos (2). Pertencia à Ordem de
Cristo. O local pareceu-lhe pouco seguro, porque estava deserto de navios. Uma
situação que poderia ser aproveitada por ladrões para a assaltarem, julgando que
trazia muito ouro. Corria também a notícia que a caravela não vinha da Guiné,
mas das Indias. Foi por esta razão que solicitou para vir para Lisboa, a
Ribeira das Naus, um local mais seguro.
Na Ribeira das
Naus, junto à
Casa da Guiné e da Mina, onde fundeou no dia 6 de Março, a festa foi
enorme. Uma multidão veio vê-lo, mas também aos indios que vinham a bordo, dando graças pela
descoberta que havia sido realizada. O Diário de Bordo deixa entender que seria
muito conhecido em Lisboa.
No dia 7 de Março,
no Diário de Bordo assinala a "infinitíssima gente" que continuava a ocorrer à
caravela, entre os quais se contavam muitos cavaleiros e oficiais do rei, todos
dando "infinitíssima" graças pelo feito conseguido em prol do cristianismo.
No dia 8 de Março,
nada mais regista sobre a cidade, pois partiu Tejo acima a caminho de Vale do
Paraíso, para se encontrar com D. João II, só regressando a Lisboa no dia 12
de Março à noitinha. Partiu no dia 13, pelas oito da manhã com maré a encher e
como vento noroeste, na direcção de Sevilha. No dia 14 ainda aportou a Faro
(Algarve).
11. Carta de Colombo
Anunciando a Descoberta das Indias
Num acto de
verdadeira traição aos reis espanhóis, resolve anunciar aos quatro ventos a sua
descoberta. A partir de Lisboa, escreve pelo menos três cartas: uma para Luís de
Santagel em Barcelona, outra para Gabriel Sanchez e a última para os reis
católicos.
Não possuímos os
originais das referidas cartas, mas apenas 12 edições que foram impressas em
1493 por toda a Europa. Em Abril surgiu uma edição em Barcelona. Traduções
em latim, três foram publicadas em Roma, uma em Amberes, uma em Basileia e três
em Paris. Em italiano, versificada por Giuliano Dati, saíram três edições: uma
em Roma e duas em Florença. Ao todo 17 edições entre 1493 e 1497 (3).
Colombo procurou
dar à descoberta das Indias o máximo de publicidade, de modo a suscitar o
interesse de outros reinos europeus, mas também a cobiça de piratas e corsários
pelos recéns adquiridos domínios espanhóis.
Esta carta escrita
em Lisboa tem uma grave erro, que muitos atribuem aos impressores. No último
período lê-se: "Fecha en la calavera sobre las islas de canarias a XV de febrero
año mil CCCCLXXXXIIII" (15 de Fevereiro de 1493). Acontece que neste dia não se
encontrava nas Canárias, mas segundo o Diário de Bordo estava a avistar a ilha
de Santa Maria nos Açores, donde só partiu a 27 de Fevereiro.
A referência às
ilhas canárias não parece tratar-se de um erro do impressor, mas de uma mentira
de Colombo, para ocultar as razões da sua visita a Lisboa para conferenciar com
D. João II e a facção de Dona Brites. Noutra nota escreve que a carta foi
escrita sobre o "mar de castela", quando na realidade estava em Lisboa. Diz que
a enviou a 14 de Março, quando neste dia já não se encontrava na cidade, estando
ao largo de Faro (Algarve).
Colombo fez questão
de associar a descoberta do "Novo Mundo" a Lisboa.
12. Acusação de Traição
A vinda de Colombo
directamente do Açores para Lisboa, em 1493, irá constituir um dos principais
argumentos dos seus inimigos para o acusarem de traição aos reis católicos. Uma acusação
que persistirá mesmo
depois do mesmo falecer.
Na célebre carta que
dirige, por volta de 1500, a Joana de la Torre, ama do Principe Juan, evoca esta
acusação: "Yo creo que se acordará vuestra merced, cuandob la tormenta sin velas
me echó en Lisbona, que fui acusado falsamente que avía yo ido allá al Rey (D.
João II de Portugal ) para darle las Indias. Después supieron Sus Altezas el
contrario y que todo fue con malicia."
Colombo para evitar
esta acusação de traição, no regresso da segunda viagem, dirigiu-se não para
Lisboa, mas para Odemira, na costa Alentejana de Portugal...
Carlos Fontes
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