O enigma de Colombo é
indissociável das conspirações que entre 1483 e 1484 ocorreram contra D. João II,
lideradas pelas duas principais familias da nobreza em Portugal - os
duques de Bragança e os duques de Viseu-Beja -, tendo ambas contado com o apoio
da rainha de Castela.
Estas conspirações, inserem-se
na disputada pelo controlo da costa Ocidental de África e das ilhas atlânticas
que opunham portugueses e castelhanos.
D. João II, que assumiu o trono
em 1481, fez logo questão de afirmar que pretendia continuar com a
política de controlo absoluto da costa ocidental de África, não hesitando em
lançar um novo pesado empréstimo (cortes de 1481), e a anunciar a construção
de um forte na Mina (Gana). Ninguém duvidava que esta política iria implicar
novas guerras, nomeadamente com Castela.
As duas casas ducais, que se
opunham a esta política exclusivista, defendiam a abertura das costas de
África a outros reinos cristãos, nomeadamente com Castela e Aragão.
Colombo,
cuja família da esposa estava ligada ao Ducado de Viseu-Beja, surge
naturalmente envolvido nestas conspirações contra o rei. Este facto explica a
sua fuga precipitada para Castela, em fins de 1484, e de ter ido ao encontro de
outros exilados portugueses em Sevilha.
a
) Sucessão Interminável de Guerras
Os
únicos inimigos que Portugal teve durante séculos foram os reinos muçulmanos e os
reinos de Castela e de Leão. O reino de Aragão, com raras excepções
foi visto com um aliado estratégico na outra costa da Península Ibérica.
A afirmação de Portugal como um reino
independente, no século XII, foi sobretudo a manifestação da vontade colectiva
de um povo, sendo neste caso os factores geográficos pouco relevantes.
O seu início simbólico desta guerra ocorreu em 1122, quando D.
Afonso Henriques, se armou a si próprio cavaleiro na catedral de
Zamora. O momento decisivo ocorreu, em 1128, quando se assumiu como um novo rei.
Esta Guerra de Independência só terminou
em 1143, quando o papa (Papa Inocêncio II ) e os rei de Castela e de
Leão reconheceram formalmente a soberania do novo reino. A manutenção da Independência de
Portugal, tornou-se mais complicada quando Castela e Leão se uniram em
1230. As tentações hegemónicas de Castela, na Península Ibérica,
não terminaram e provocaram aos longos dos séculos muitas e sangrentas
guerras, alimentando as inimizades entre os dois povos.
O
território de Portugal não parou de se expandir ao longo de toda a costa
Atlântica, nos séculos XII e século XIII, originando permanentes conflitos
com Castela. D. Sancho II de Portugal,
entre 1234 e 1238 conquista o Algarve oriental. D. Afonso III, como
ajuda da Ordem de Santiago de Espada toma Faro, concluindo a conquista de todo o
Algarve em 1249. O reino de Castela e Leão reclama para si o Algarve, mas
Portugal não cede. Pelo Tratado de Badajoz, em 1267, são fixadas as
actuais fronteiras territoriais, que se mantiveram inalteráveis, com uma
única excepção: Olivença,
usurpada em 1801.
Nestas
guerras entre portugueses e castelhanos foram sendo abertas várias frentes de
combate: .
Andaluzia. Entre
o século XII e finais do século XV que os reis de Portugal procuraram primeiro
conquistar e depois apenas controlar a Andaluzia:
-
Fazendo ou participando em acções
militares contra os reinos muçulmanos. Milhares
de portugueses até final do século XV participarem nestas acções e estiveram
envolvidos no repovoamento da Andaluzia. O mestre da poderosa Ordem Militar de
Santiago que conquistou Sevilha, em 1248, era português (D. Paio Peres
Correia).
-
Estimulando casamentos entre a nobreza de Portugal e as grandes casas da nobreza
castelhana com forte implantação na Andaluzia, como os Duque de
Medina-Sidónia, os Duques de Medinacelli e outros. A corte
portuguesa, na segunda metade do século XV, financiava inclusive muitos nobres
locais. Não se coibiu
de apoiar diversos
movimentos separatistas
(Mais ).
Expansionismo Além Mar
D. Afonso IV (reinou entre
1325 e 1357) foi quem assumiu de forma clara a estratégia expansionista de
Portugal para além do continente europeu. Para tal obteve do papa uma bula de
cruzada que reconhecia os reis de Portugal o direito à conquista do reino de
Fez (Marrocos) e reclamou o senhorio das ilhas canárias, sob o argumento da sua
proximidade geográfica (22). O expansionismo português tem neste monarca o seu
primeiro impulsionador.
A conquista ou controlo de
posições na Andaluzia revelavam-se imprescindíveis para Portugal poder avançar
para a conquista do Norte de África.
A
conquista de Ceuta ao Reino de Fez, em 1415,
mostrou a importância estratégica desta forte presença portuguesa na
Andaluzia, vital para os abastecimento das fortalezas no Norte de África. Uma
presença que suscitava apreensão pelos castelhanos.
Norte
de África. A
conquista de Ceuta, não foi em recebida pelos castelhanos, que não tardaram a
unirem-se aos muçulmanos para atacarem os portugueses. A razão era simples:
Ceuta, transformou-se num importante centro de corso e pirataria dos
portugueses, permitindo um controlo da entrada e saída de navios do Mediterrâneo.
Os navios de
corsários de portugueses ou ao serviço de Portugal praticam o saque a longo do
Atlântico, no Mediterrâneo e sobretudo no Estreito de Gibraltar. Desde 1468
multiplicaram os seus ataques às costas da Andaluzia e pouco depois às da
Catalunha. Colombo, como vimos, participou activamente nestes saques.
As
posteriores conquistas ao longo da costa atlântica do Norte de África,
suscitaram uma crescente reacção violenta de Castela.
Os
portugueses, por sua vez, procurarem impedir a presença de castelhanos nas
costas
africanas, sobretudo nas contíguas às Canárias. Os conflitos
político-militares entre os dois reinos, com um grau de
violência variável, prosseguiram até inícios do século XVI.
Canárias
e as Ilhas Atlânticas. A guerra pela
posse das Canárias entre Portugal e Castela remonta ao inicio do século XIV. Numa manobra diplomática, em 1344, o
Papa Clemente VI, concedeu a um nobre castelhano (Luís de la Cerda) a posse das
Canárias sob a promessa da cristianização dos indígenas. Portugal não
aceitou e os conflitos prosseguiram.
O Infante D. Henrique, Duque de
Viseu e mestre da Ordem de Cristo, relança a luta pela conquista das Canárias
na qual participara mais tarde o próprio o próprio Colombo. A guerra
prosseguiu até 1479/1480,
quando se estabeleceu uma paz temporária (Tratados de Alcáçovas e Toledo), na
qual Portugal abandonou as suas reivindicações sobre as Canárias, a troco do
exclusivo da exploração do hemisfério a sul deste arquipélago.
O Infante não se limita a tentar
conquistar as Canárias, em 1418 manda
explorar e povoar a Madeira e Porto Santo. Por volta de 1427,
os seus nautas já haviam atingido os Açores, entre a Europa e a América. Não
tardam, como vimos, a explorar a Terra Nova (Canadá) muito antes do século XVI.
Castela
sente-se completamente ultrapassada pelos conhecimentos e as descobertas feitas
pelos portugueses. Os seus navegadores mais experientes, como os irmãos Pinzon
de Palos, limita-se ao corso e pirataria de navios muçulmanos e
portugueses.
Costa
da Guiné - Política do Mar Fechado. Os portugueses
não
se confinam ao norte de África avançam decisivamente para sul ao longo de toda a costa
africana.
Em 1470 já tinham ultrapassado a linha do Equador, atingindo
uma região rica em ouro. As enormes riquezas que começam a afluir a Lisboa,
despertam a cobiça de outros reinos, não apenas dos castelhanos.
Depois de
dobrarem o cabo do Bojador, os portugueses passam a reclamar o monopólio do
comércio, navegações e mares a sul deste cabo. As primeiras acções, como
veremos, ocorrem logo, em 1443. Portugal para defender este monopólio dos
mares é obrigado a desenvolver uma violenta guerra contra todos os
invasores (castelhanos, ingleses, franceses, etc), afundando sem contemplações navios inimigos
e matando as respectivas
tripulações. Em 1478, por exemplo, 35 navios "castelhanos",
quando vinham da Guiné foram aprisionados por uma armada portuguesa. O saque
foi extremamente lucrativo.
Castela acabou
por recuar nas suas investidas às Costas Africanas, mas só depois dos Tratados de Alcaçovas (1479) e Toledo
(1480). Em troca da Canárias, os portuguesas obtiveram o exclusivo da
explorações, conquistas e comércio a sul destas Ilhas e a Ocidente das mesmas.
Os ingleses tentaram também
aceder à Guiné, em 1481, mas graças a uma eficaz acção diplomática de D.
João II foram impedidos pela própria corte.
A construção do
Forte da Mina, em 1481, marcou o momento em que as explorações marítimas
portuguesas se tornaram verdadeira rentáveis. O açúcar da Madeira, o
tráfico negreiro da Guiné, o ouro e especiarias da Mina passaram a afluir em
grande quantidade a Lisboa, fazendo disparar a pirataria no mar. A situação foi-se
agravando ano, após ano.
Plano da India.
A ideia de atingir à India, esteve de inicio ligada à guerra contra o Islão. Os
portugueses, no século XV, acreditavam que a India era habitada por cristãos. O
Infante D. Henrique ( -1460), pensava encontrar aí um aliado poderoso para
expulsar os muçulmanos da Terra Santa - o célebre reino cristão de Prestes
João.
Por volta de 1474, na Corte Portuguesa, impôs-se o mais ambicioso de todos o
projectos: - atingir a India contornado África. Um projecto geo-político que se
tornou possível devido às enormes quantidades de ouro que começaram a afluir a
Portugal com a descoberta da Mina.
As
expedições marítimas aceleraram ao longo da costa africana. Em 1482,Diogo Cão, chega ao Zaire
(Congo), seis anos depois Bartolomeu Dias atinge o extremo sul do continente
(1488). O
rei D. João II, está agora convicto que era possível desviar o comércio das
especiarias da Ásia para a Europa através da rota do Cabo da Boa Esperança,
atacando deste modo, a principal fonte de receitas dos sultões mamelucos, que
controlavam a Terra Santa e o Mar Vermelho.
Os portugueses
pretendem não apenas dar um duro golpe no comércio das especiarias controlado
pelos muçulmanos, mas atacá-los pela "retaguarda", atingindo o Golfo Pérsico,
Meca...
O
problema de fundo não se altera: Teria Portugal meios para manter e assegurar
as suas conquistas e descobertas? Dada a exiguidade da população, muitos eram
os que discordavam desta estratégia real.
b) A Nova Ameaça
A
expansão portuguesa em África e no Atlântico, foi acompanhada da crescente
limitação do acesso de Castela
a importantes riquezas, como o regaste de escravos das costas da
Guiné ou o ouro da Mina.
Era evidente que Portugal não tinha meios
humanos para assegurar o exclusivo destas conquistas e prosseguir as descobertas geográficas.
O
problema agravou-se a partir dos anos 60 do século XV.
O poderoso grupo de nobres portugueses, exilados em Castela, o chamado
"partido portugués" assume um crescente protagonismo (17), acabando
por dominar a política castelhana, arrastando Portugal para uma intervenção
activa nas lutas internas em Castela e Aragão.
Em
1461, João Pacheco,
marquês de Villena, sente-se traido por Henrique IV de Castela (1425-1474)
o ter substituído por seu valido por Beltrán de la Cueva, retirando-lhe
também o mestrado da Ordem de Santiago. Liderando o grupo dos restantes
portugueses em Castela (portocarreiro, coelhos, girões, etc), lança Castela
numa guerra civil, sob o pretexto que a alegada filha deste rei - Joana -,
afinal era de Beltrán de la Cueva. Em 1468, Enrique IV nomeia sua herdeira
Joana, conhecida por "Beltraneja" (Castela) ou "Excelente
Senhora" (Portugal).
A
guerra civil que se prolonga entre 1464 e 1474 enfraquece o poder real, dando a
estes nobres de origem portuguesa um enorme poder. O seu objectivo político,
como veremos, era o domínio de Castela por um rei português.
É
neste contexto que Pedro de Avis, Condestável de
Portugal e mestre da Ordem de Aviz, filho do Infante D. Pedro, em 1463, aceita ser rei de Aragão,
Catalunha e Valência. Foi aclamado em 1464, tendo falecido em 1466,
possivelmente envenenado. Muitos dos portugueses que o acompanharam, passam a
apoiar Renato d`Anjou contra Juan II de Aragão e depois Fernando II. Colombo foi
um dos que assumiu também este combate.
Mais
A Infanta Isabel ( filha de uma rainha portuguesa - Isabel de Aviz), toma a dianteira e
casa-se, em 1469, com Fernando de Aragão.
Portugal ficou deste modo numa perigosa situação. O reino de Aragão deixara de ser um aliado de
Portugal na Península Ibérica, Castela, o seu principal
inimigo, reforçara-se, formando com Aragão um reino que era 4 vezes maior do que
Portugal, sem contar com e a Sicilia. A tensão é enorme entre os dois
reinos peninsulares.
Quando Enrique IV morre, em 1474, os nobres portugueses em Castela convencem D. Afonso V, rei de Portugal a
consumar o seu casamento com Joana, a Beltraneja ou Excelente Senhora,
declarando-se rei de Castela. A infanta Isabel declara-se, por sua vez, rainha
de Castela.
D. Afonso V temendo
que a união entre Castela e Aragão pudesse colocar em causa a sobrevivência de
Portugal e dos seus domínios, lançou-se
em 1475 invadiu Castela, contando com o apoio a nobreza de origem
portuguesa aí exilada.
A ameaça persistiu e até
agravou-se, quando, em 1479, Juan II de Aragão faleceu e lhe sucedeu
Fernando, consumando-se assim a união entre o reino de Castela e Aragão
A guerra só terminou, quando 1479,
os dois reinos exaustos pela guerra, resolvem fazer as pazes, dividindo pela
primeira vez o mundo ente si - Tratado de Alcáçovas-Toledo (1479/80).
A queda do Reino de Granada, em 1492, aumentou ainda mais o poder do novo reino (Espanha), colocando sérios problemas
a Portugal, dada a desproporção que
passou a existir entre os dois reino ibéricos. Era agora preciso muita inteligência e determinação
para lidar com o seu principal inimigo.
Espanha
depois da conquista do Reino de Granada (1492), incluindo os seus domínios em
Itália (Sardenha e Sicilia). O Reino de Napoles estava igualmente sob o
controlo da Espanha. O rei D. João II já em 1488 tinha a percepção clara que
tinha que desviar as atenções dos espanhóis de África, se Portugal pretendia
continuar a sua expansão marítima neste continente.
c ) As duas Estratégias
Quando D. João
II chega ao trono, em 1480, a questão africana reveste-se de enorme
importância para a corte. Não se trata apenas de prestígio que estes
domínios pudessem dar, a questão era essencialmente económica. As rendas obtidas
pela Corte com o comércio de escravos, ouro, marfim,
malaguetas eram essenciais para assegurar a sobrevivência de Portugal.
Muitos
mercadores portugueses, mas também alguns estrangeiros, como o florentino Bartolomeu
Marchione, retiravam deste comércio africano fabulosos lucros.
A
continuação da expansão implica, todavia custo em termos humanos cada vez
maiores. Colombo, afirmará repetidamente que a metade da população portuguesa foi morta
nesta expansão marítima.
Durante o século XV definem-se
duas estratégias em relação à expansão:
1. Guerra contra o Infiéis e
Livre Comércio. Uma parte da alta nobreza defendia que Portugal não
possuía humanos suficientes para manter a politica do "Mar
Fechado", as fortalezas do Norte de Africa e assegurar a protecção das
Ilhas do Atlântico (Açores Madeira, Cabo Verde) e a Mina. Nesse sentido, devia limitar-se a
fazer guerra ao Reino de Granada e de Fez no Norte de Africa, desenvolver o comércio marítimo, evitando a ocupação de
novos territórios. O comércio marítimo, em todo o caso, devia ser partilhado com outros
reinos cristãos.
Esta era a posição defendida pelos
representes das duas principais casas da nobreza portuguesa:
- D. Fernando I (1403-1478),
2º. Duque de Bragança, defendia que Portugal devia concentrar os seus
esforços na expulsão dos muçulmanos da Península Ibérica, participando na
conquista de Granada. Condenava a conquista e expansão territorial em África,
secundarizando a importância das explorações marítimas (16). Não admira que
os seus filhos, em 1483, estejam à frente de uma conspiração contra D. João
II.
- Infante D.
Fernando (10 ), Duque de Beja-Viseu, mestre da Ordem de Cristo e de
Santiago, em Abril de 1460 (11) , perante D. Afonso V define também com
clareza a sua posição: O reino
não tinha meios militares para prosseguir de forma sistemática a cruzada contra os mouros em África,
continuar as explorações marítimas e ao
mesmo tempo defender-se do reino de Castela e assegurar as suas conquistas além-mar
alvo de uma crescente cobiça
de outros reinos europeus.
2. Guerra e Monopólio dos
Mares. D. Afonso V, rei de Portugal, defendia uma política oposta: "Mar Fechado", o domínio territorial das costas de Africa e o
prosseguimento sistemático da expansão maritima. Os custos desta política
eram naturalmente muito elevados em termos de vidas humanas (15).
D. João II quando assumiu o trono, em 1480, fez logo questão de reafirmar a continuidade da
política do seu pai. Embora não tenha realizado novas conquistas no Norte de
África, não deixou de mandar construir o
célebre Castelo na Mina (1481-1485). Uma fortaleza cuja manutenção durante
mais de um século, custou inúmeras vidas humanos e enormes recursos
económicos. Para custear este esforço de guerra e expansionista contraiu, em 1481, um pesado
empréstimo.
Nas Cortes de Évora de 1481, as
primeiras no novo monarca, as
duas posições anteriores enfrentaram-se. Contra a estratégia de D. João II
manifestou-se de forma veemente Alvaro de Bragança (13), Chanceler-mor do reino,
irmão do 3º. Duque de Bragança (14).
O resultado do choque destas
posições estratégicas foi o acumular crescentes tensões entre o rei e
as duas principais casas nobres do reino: os Duques de Viseu-Beja e os Duques de
Bragança
d
) Conspirações Contra o Rei
Este mal estar acabou, em 1483 e 1484,
por motivar duas conspirações destinadas a matar D. João II, as quais contaram com o apoio dos reis católicos (Castela e Aragão).
O
motivo imediato para a 1ª. conspiração teria sido o processo de
centralização que D. João II impôs no reino. Os grandes senhores ao
tempo - o Duque de Bragança e o Duque de Viseu - defendiam uma
concepção de poder de feudal (20), idêntica à preconizada por Colombo em
relação às Indias espanholas.
1ª.
Conspiração: Duque de Bragança
D.
João II (1455-1495) se era um mestre na diplomacia, foi também um mestre na arte da
guerra, não recuando perante os poderosos. Com
apenas 16 anos participou
na conquista de Arzila (1471), no norte de Àfrica, onde foi armado
cavaleiro. Na
constantes lutas contra Castela, em que se pai se envolveu, por questões de sucessão,
participou na guerra contra os "reis católicos" -
Fernando e Isabel. Em 1476, ainda príncipe, vence o rei Fernando na batalha de Toro
(perto de Zamora).
Quando
é coroado rei, em 1481, os grandes senhores do reino, em particular os
da Casa de Bragança sentem que tem pela frente um inimigo.
A
primeira grande medida foi combater os privilégios da grande nobreza, dando
inicio a um
processo de centralização real, assente numa completa obediência ao monarca.
Este processo já havia custado a vida, ao Infante D. Pedro na Batalha de
Alfarrobeira (1449). D. João II, ao contrário do seu pai - D. Afonso V -não
estava habituado a recuar.
Em 1478,
ainda era principe, enfrentou as primeiras revoltas de nobres,
centradas no Alentejo, onde muitos deles se recusaram a contribuir com mais
dinheiro para o esforço de guerra com Castela (Guerra da Sucessão). Lopo de Vaz de Castelo
Branco, monteiro-mor do reino e alcaide-mor de Moura
recusa obedecer e proclama a sua obediência a Castela. D. João não tarda a mandá-lo matar. A
seguir, em Serpa, o cavaleiro Alvaro Mendes Cerveira revolta-se e os seus
bens são confiscados. A sua mão é pesada e nenhum traidor fica impune.
A
conspiração em 1483 era chefiada pelo 3º. Duque de Bragança - D. Fernando II
-, filho do Infante D. Fernando I, irmão de D. Afonso V e da
Infanta D. Beatriz. Casou-se em segundas núpcias, com Dona Isabel, irmã da
rainha Dona Leonor. Era portanto cunhado do rei D. João II.
D.
Fernando II, para além de Duque de Bragança, era Conde de Guimarães,
fronteiro-mor de Entre o Douro e Minho e de Trás-os-Montes. Era terceira
pessoa mas rica de Portugal. Tinha 50 vilas, cidades e castelos,
muitas quintas e herdades, defesas e lugares fortes.
Podia recrutar nas suas terras 3.000 homens a cavalo e 10.000 a pé (18).
Assumia-se como grande senhor feudal. A
Casa de Bragança estava nesta altura já sediada em
Vila
Viçosa.
Os espiões de D. João II, descobrem a correspondência que o duque trocava com
Isabel, a Católica. O Duque é
preso a 30 de Maio de 1493, julgado e logo executado em Évora. As
acusações eram três: 1.Tinha correspondência secreta com os reis católicos,
na qual conspirava para desfazer o Tratado das Terciarias, provocar a absorção
de Portugal por Castela e revelar os segredos da Mina; 2. Instigar os
procuradores dos concelhos contra o rei; 3.Impedir o recurso à justiça real.
Ao todo 21 juizes, a maioria nobres, condenaram por unanimidade o Duque de
Bragança (9).
Em
resultado desta conspiração fugiram para Castela, entre outros membros
da Casa de Bragança - Filipe, Jaime e Dinis,
filhos de D. Fernando, 3º. Duque de Bragança, Alvaro de Bragança
e
João de Bragança, Afonso de Bragança
e respectivas familias,
para além de outros nobres como Isaac Abranavel
. Mais
Argumentação
dos Conspiradores
Estes
conspiradores, segundo Rui de Pina, prometeram aos "reis católicos"
que após matarem D. João II aboliriam os Tratados de Alcáçovas e Toledo,
dando-lhes desta forma livre acesso à Mina e aos segredos da Corte sobre os
descobrimentos.
Esta foi a argumentação que usaram para obterem protecção dos monarcas
espanhóis, como recompensa obtiveram elevados cargos na corte.
A
questão interessava igualmente os Duques de Medina-Sidónia e de Medinacelli,
dado que haviam sido os principais lesados com as limitações à navegação
dos castelhanos nas costas ocidentais de África.
O
fim desta proibição interessava também aos próprios nobres portugueses exilados ou
radicados em Espanha, pois a mesma impedia-os de obterem
importantes ganhos que as explorações marítimas possibilitavam.
Alvaro de Bragança é um caso típico de um nobre português que defendia e fez
uso desta posição, pois quer em Espanha, quer em Portugal nunca deixou de
estar envolvido nas explorações marítimas.
2ª.
Conspiração:
Duque de Viseu e de Beja
Outros
conspiradores:
Em 1484,
descobre-se uma nova conspiração desta vez dirigida por Diogo (1452?-
1484), 4º Duque de Viseu e 3º. Duque de Beja, condestável do reino,
fronteiro da Beira, governador da
Ordem de Cristo, senhor das ilhas atlânticas (Madeira, Açores e Cabo
Verde), senhor da Covilhã, Gouveia, possuidor do monopólio do fabrico de sabões
e do monopólio da pesca de atum, herdeiro dos regalengos de Almada, Azeitão,
Belas, Colares. Tinha as rendas de Beja, Serpa e Moura, para além da mouraria de
Loulé (19).
D.
Diogo herdou
dois ducados ligados à exploração sistemática do Atlântico Ocidental,
conhecendo melhor do que ninguém os seus segredos.
O
seu objectivo era matar D. João II e o príncipe
herdeiro e assumir-se como rei de Portugal (7). D. Joana, a Beltraneja (ou Excelentissima Senhora)
seria entrega aos reis católicos.
D. João II foi informado a tempo da conspiração.
Atraiu o cunhado (Diogo de Lencastre ) à sede a Ordem de Santiago de Espada, em Setúbal
e assassinou-o. Os acontecimentos, nunca devidamente esclarecidos ( consultar
), geram uma nova vaga de mortes, prisões e fugas
para o estrangeiro.
Garcia de Menezes, Bispo
de Évora, foi morto no Castelo de Palmela, mas antes denunciou dezenas de
conspiradores. Fernando
de Menezes, irmão do
bispo, foi também condenado à morte. Guterre
Coutinho, comendador da
Ordem de Santiago, foi atraído a uma silada e acabou por
ser morto no Castelo de Aviz. Foi denunciado pelo irmão
Vasco Coutinho que
recebeu como recompensa o título de Conde de Borba. D. Manuel retirou-lho,
mas em troca deu-lhe o título de Conde do Redondo.
Há
uma personagem misteriosa nesta conspiração. Trata-se de alguém
entendido em astrologia
que disse a D. Diogo que a conspiração teria êxito e que o mesmo seria coroado
rei Portugal.
Estes
casos se desonravam as respectivas famílias perante o povo português,
despertavam o ódio da nobreza contra D.
João II.
Fugas para Espanha
Em
1484 e 1485 fogem de Portugal para Castela, Inglaterra e
França muitos nobres e serviçais ligados à Casa
do Duque de Beja e de Viseu.
A
família da esposa de Colombo, ligada à casa
dos Duques de Viseu-Beja, é das
primeiras a fugir, fixando-se na Andaluzia. O próprio Colombo, temendo possíveis
represálias de D. João II, inicia também uma fuga precipitada
como escreve o seu filho Hernando Colón .
Alguns
destes nobres, como Lopo de Albuquerque,
Alvaro e Pedro de Atayde,
Fernão da Silveira e
outros, desempenhavam em Portugal elevados cargos
na Corte,
tendo acesso privilegiado ao seus segredos, nomeadamente os relacionados com as
explorações marítimas.
Mais
Em Castela e Aragão não paravam de aumentar o numero de exilados das
principais famílias nobres de Portugal, a maioria das quais era sustentada pela Corte de Castela.
A
Posição dos Conspiradores
Colombo
e outros membros ligados ao D. Diogo terão usado a mesma argumentação dos conspiradores
de 1483 ? . É muito provável que sim.
-
O Infante D. Fernando, pai de D. Diogo, em 1460, tinha-se já manifestado
contra a estratégia de D. Afonso V, que implica um grande envolvimento de
Portugal em África, nomeadamente para defender as suas possessões. Claramente
opunha-se a uma visão exclusivista dos descobrimentos, que excluía
nomeadamente castelhanos e aragoneses. Recorde-se que este Duque tinha no seu
brasão, as armas de Aragão.
-
A Infanta D. Brites (ou Beatriz), mãe de D. Diogo, foi a arquitecta do
Tratado de Alcaçovas(1479), para acabar com a guerra entre Portugal e Castela e
os ataques aos seus domínios no Atlântico e na Guiné.
Em
finais de Fevereiro de 1479, manda os seus emissários a Cáceres, onde se
encontrava a sua sobrinha -Isabel,
rainha de Castela, propondo-lhe um encontro "de mulher para mulher". O
encontro inicia-se a partir de 20 de Março em Alcantara. A Infanta portuguesa
negocia a paz, mostrando-se também disposta a propor uma partilha do mundo
entre portugueses e castelhanos. Cedia as Canárias e a região do mundo que corresponde
actualmente à América central e do norte. A conquista das Canárias,
recorde-se era um
objectivo estratégico do Infante D. Henrique, Duque Viseu. Recorde-se que
navios a seu mando, desde 1470, andaram a explorar as Antilhas e o continente
americano.
Depois
da morte do seu filho, D. Diogo, é muito provável que tenha cedido a Isabel, a
católica, sua sobrinha, segredos que a sua casa possuía da existência de
terras a ocidente. A família da esposa de Colombo pertencia à Casa dos Duques
de Beja e Viseu.
-
O Duque D. Diogo, mestre da Ordem de Cristo, tinha uma profunda ligação
a Aragão, e dificilmente aceitaria a política de D. João II, de excluir
Castela e Aragão dos mares e terras descobertas pelos portugueses. Em Aragão, com apenas 16/17 anos andou amantizado com Leonor de Sotomayor y Portugal,
1ª.Duquesa de Villahermosa (Aragão), nobre de origem portuguesa, da qual teve um filho bastardo -
Afonso de Bragança que veio a ser o 8º. Condestável de Portugal (6).
O 1º. Conde de Villahermosa - Afonso de Aragão (1417-1495), era filho bastardo
de João II de Aragão, pai de Fernando de Aragão, o
Católico...
Durante
as terçarias entre 1481-15/5/1483, D. Diogo e o seu irmão D.Manuel, foram
alternadamente confiados aos reis de Castela e Aragão, com os quais mantiveram
relações muito intimas.
Tendo
em conta estas ligações
familiares a Castela e Aragão, podemos inferior que D. Diogo, comungava das mesmas
ideias dos conspiradores de 1483. Compreende-se porque Fernando
de Aragão lhe tenha prometido que o casaria com a sua filha bastarda (cfr. S.
Agostinho Manuel, Vida y Acciones...., pág.137).
Os
Duques de Viseu-Beja defendiam a partilha do mundo entre Portugal e a Espanha,
é muito provável que tenham dado aos reis espanhóis para as informações necessárias para chegarem a novas terras, como a
actual América.
-
A Rainha Dona Leonor de Lencastre, filha do Infante D. Fernando e de Dona
Beatriz, assumindo-se como herdeira destas ideias paternas, fez questão de
convidar Colombo para um encontro no Convento de Santo António da Castanheira,
tendo ao seu lado D. Manuel. Mais
Colombo
comungava destas ideias, e chega a evoca-las, quando afirma que a política
seguida por D. Afonso V e D João II nas explorações
maritimas, tinha custado a vida a metade da população portuguesa.
O certo é
que a
partir de
Janeiro de 1486, passou a
receber dinheiro da rainha Isabel de Castela. Foi-lhe dado por pertencer à Alta
Nobreza Portuguesa ? Por passar a apoiar a causa de Castela ? Por andar a
estudar uma maneira de contornar o Tratado de Alcaçovas-Toledo ? Nada sabemos
de concreto. A única coisa com segurança se poderá afirmar é mudou de nome (
5 ) , como o fez,
por exemplo, Lopo de Albuquerque, um nobre português que, segundo
Garcia de Resende, na Flandres, Inglaterra, Dinamarca, França e Espanha defendeu o fim das limitações à navegação impostas
pelo Tratado de Alcaçovas-Toledo.
Outra
coisa que sabemos com segurança é que Colombo se dirigiu para Moguer, onde já se encontravam
entre outros portugueses, como a sua cunhada Violante Moniz Perestrelo e o frade João Peres
Marchena, no Convento de La Rábida. O Duque de Medinacelli, ligado aos
Duques de Bragança, em especial ao Conde Faro, recebeu-o em sua casa durante
dois anos...
Não
está feito o levantamento exaustivo destes nobres e dos serviçais que os
acompanharam, nem dos cargos e títulos que lhes foram dados em Castela.
E
) Estratégia de D. João II
A continuidade
das explorações, em 1479, tinha sido assegurada através da cedência das
Canárias e uma promessa de
casamento do principe D. Afonso, filho de D. João II, com a filha mais velha dos reis de Castela e
Aragão. Este casamento era importante para reter os rei espanhóis, no entanto
não bastava para assegurar os domínios de Portugal.
As
conspirações de 1483 e 1484 mostraram que o problema não estava resolvido,
mas apenas adiado. Era preciso afastar os espanhóis das costas de África e da
rota para a India. Os conspiradores que se haviam
exilado em Castela, constituíam sério
problema, pois manobravam no sentido de levarem Isabel, a Católica, a
envolver-se nas explorações marítimas. O que levou D. João II a reclamar que os
mesmos fossem expulsos (21).
A única forma
que D. João II encontra para continuar a manter as suas fontes de rendimentos e
atingir a India, era afastar a concorrência da rota africana,
para o que contou não apenas com uma eficaz rede de espiões, mas também com o
interesse de muitos mercadores, como Bartolomeu Marchione, ligados ao comercio
negreiro.
Era obvio que a Espanha, a França ou mesmo a Inglaterra não iriam ficar quietas,
quando os portugueses chegassem à India. Os ataques de corsários e piratas
iriam certamente aumentar contra navios portugueses envolvidos neste comércio.
O êxito da expansão
portuguesa estava dependente de uma estratégia que fosse capaz de afastar a
concorrência de África (a
grande prioridade) e da rota para a India que estava a ser aberta. É neste
ponto que Colombo, ligado à casa do Duque de Viseu-Beja, irá ser decisivo.
É neste contexto que adquire toda a relevância a reunião em Junho de 1483, que envolveu Diogo Ortiz de Vilhegas, o Calçadilha e Cristovão Colombo. O primeiro defendia a continuação do caminho para a India contornado África e o reforço do poder real. O segundo, um caminho maritimo em direcção ao Ocidente e uma concepção feudal do poder, defendida pelos conspiradores contra D. João II.r
Carlos Fontes
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