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Há
um facto indesmentível: Colombo conhecia o Mediterrâneo, onde como corsário andou no saque de navios do
Reino de Aragão, pelo menos até 1473.
A sua
trajectória de vida era comum à de muitos portugueses da sua época, que
percorriam todo o Mediterrâneo. Nunca se
se afastou de locais onde existiam comunidades portugueses ou com os quais
Portugal tinha uma forte ligação. .
As
referências de Colombo faz ao Mediterrâneo, nomeadamente algumas
cidades italianas como Génova ou a Quios (Grécia), correspondem a portos regularmente frequentados por
marinheiros, mercadores, piratas e corsários portugueses (5 ).
No caso de Génova, existia na cidade uma importante comunidade portuguesa.
O rei, nobreza e mercadores portugueses eram clientes do Banco
de S. Jorge, em Génova, o mesmo terá feito Colombo para assegurar os rendimentos do seu filho Diego (português). Não
admira sequer que enquanto corsário tenha vivido algum tempo em Génova, como
muitos outros portugueses corsários ou piratas também o fizeram.
Os
locais que escolheu em Espanha, como veremos, estão historicamente ligados a Portugal e contavam como importante
comunidades de portugueses. A situação anterior volta a repetir-se.
a
) Rotas Marítimas
Portuguesas
Desde
a independência de Portugal, em 1128, que os portugueses procuraram reforçar
as suas ligações a todos os reinos e repúblicas do Mediterrâneo para fazerem
frente ao Reino de Leão e Castela.
O primeiro rei - D. Afonso
Henriques - definiu desde logo esta estratégia, ao casar-se com uma
"italiana" da Casa de Sabóia. Outros casamentos se
seguiram, nomeadamente com princesas do Reino de Aragão. D. Pedro, Condestável
de Portugal e mestre da Ordem de Avis foi
um dos últimos reis de Aragão (1464-1466).
Estes
casamentos reflectiam uma estratégia económica mais vasta que consistia em
criar um eixo económico-maritimo atravessaria todo o Mediterrâneo desde
Constantinopla (Império Bizantino), entrava no Atlântico, passava por Lisboa e se prolongava até aos portos do Europa do Norte, incluindo o portos do
Báltico.
Foi um dos maiores empreendimentos económicos da Europa e de
Portugal. Lisboa e os portos portugueses assumiam um papel estratégico
fundamental neste comércio marítimo.
No
final do século XIII os marinheiros e mercadores portugueses já uniam por mar
Génova a Hamburgo, ligando desta forma as principais rotas internacionais que
uniam todo o mundo conhecido dos europeus. Nas principais cidades portuárias foram surgindo
comunidades de marinheiros e mercadores portugueses.
Desde
a 1ª. metade do século XII que navios portugueses percorriam todo o
Mediterrâneo. Há notícia de mercadores portugueses nas grandes
feiras orientais, como a de S. Demétrio em Tessalónica, na rota de
Constantinopla e do Mar Negro.
Em 1240 existia em Marselha uma importante
comunidade mercantil portuguesa (12). Visitavam igualmente os portos do Norte da
Europa, como Londres, Harfleur (na foz do rio Sena) ou Bruges. Em 1197, por
exemplo, já haviam estabelecido na Flandres uma feitoria comercial.
Na
1ª. metade do século XIV estes mercadores já tinham estabelecido carreiras regulares entre as principais cidades italianas, como Genova ou Veneza
(1314) e as cidades portuárias do Norte da Europa ( 1 ).
No inicio do século XV, o mediterrâneo não tinha
segredos para os portugueses que para aí navegavam a partir
de portos como o de Lisboa, Lagos e pouco depois da Madeiras, Açores e das suas
colónias africanas. Faziam-no regularmente, não apenas no transporte de
mercadorias, mas também de pessoas nas suas deslocações a Aragão, Sul da França
e Itália.
A princesa Leonor de Portugal, por
exemplo, fez a sua viagem nupcial por via maritima de Lisboa a Livorno (Itália), fazendo escala em Ceuta, Marselha e Grimaud (Nov.
1451- Fev. 1452) (16).
O rei D. Afonso V, em
Agosto-Setembro de 1476, deslocou-se a França, numa esquadra que navegou entre
Lisboa, passando por Lagos, tendo como objectivo Marselha. Aportou a Collioure (Roussilhão), onde o aguardava um capitão de Luis XI, rei de
França (14).
Entre os muitos portos que frequentavam contavam-se os
de Veneza (9), Génova, Sícilia e Quios (Grécia, mar Egeu), mas igualmente muitos
outros muçulmanos no Norte de África.(8).
A rede marítima e comercial de
Portugal, aberta no século XII, estava na segunda metade do final do
século XV solidamente implantada em todo o Mediterrâneo, em particular na
Itália, no Sul da França e no Norte de África, mas também em toda a Espanha - Aragão (22), Andaluzia (24) ,
Galiza, Biscaia (23) Canárias (25),
Castela e nas próprias Indias
espanholas - , mas também na Inglaterra, em França, em especial na
Bretanha (26), Flandres ou na Alemanha. É contra esta rede
internacional portuguesa que se irá virar a Inquisição Espanhola, numa brutal
perseguição que se irá prolongar até meados dos século XVIII.
b )
Corsários Portugueses no Mediterrâneo
Para
garantirem a segurança desta rota, nomeadamente dos ataques dos piratas e dos
muçulmanos, os portugueses aplicaram-se no conhecimento e desenvolvimento das
técnica do corso. Não nos podemos esquecer que os muçulmanos vindos do
Mediterrâneo, do Reino de Granada e do Norte de África faziam verdadeiras
razias aos navios e povoações na costa portuguesa.
As
primeiras notícias de corsários portugueses no Mediterrâneo datam do inicio
do século XIV. A crescente actividade de corso exigiu um mais perfeito domínio da navegação com galeras (barcos a remos), os navios mais utilizados nestas acções
de saque até finais do século XV. Foi com este objectivo que o rei D. Dinis, em
1317, contratou o corsário genovês Manuel Pessanha para ensinar os portugueses a
manobrar este tipo de navios.
No
final do século XIV,
os portugueses já dominavam não apenas as artes náuticas, mas também as
artes da guerra no mar e o corso. Os corsários genoveses não tardaram a ser dispensados. A guerra de
corso passou a fazer-se também no alto mar, com barcos à vela munidos de
canhões (uma inovação portuguesa).
Com
a conquista de Ceuta, em 1415, os portugueses passaram a controlar as entradas e
saídas do Mediterrâneo e a terem aí um magnifico porto para acções dos seus
corsários e piratas.
No século XV
piratas e corsários portugueses pululavam ao longo de todo o Mediterrâneo,
atacando não apenas navios de muçulmanos, mas também cristãos: genoveses,
florentinos, venezianos, aragoneses, castelhanos, etc..
No
tempo do D. Duarte, em 1434, uma nau portuguesa capturou, por exemplo, um barco
genovês no mar da Sícilia (10), mostrando a longa penetração pelo
Mediterrâneo destes piratas-corsários.
Armadas
portuguesas foram também enviadas para o Mediterrâneo para combaterem contra
os turcos, nomeadamente de ataques que faziam a cidades italianas ( 2 ). D. Afonso V, por exemplo, em 1480 envia uma expedição para socorrer o Rei de
Nápoles que estava a ser atacado pelos turcos, na qual participa Afonso de
Albuquerque.
Colombo,
como veremos, fez o seu tirocínio marítimo como corsário, ao serviço do rei
de Portugal e dos Duques de Beja e de Viseu. Mais
Este profundo conhecimento do
Mediterrâneo, reflectiu-se na própria cartografia deste mar. O português - Diogo Ribeiro - foi o primeiro que, em 1527-29, representou o Mediterrâneo
em carta graduada em latitudes, corrigindo a declinação magnética fonte de erro
das cartas anteriores (15).
c) Rodes (Grécia) - Hospitalários
Portugueses
A Ordem Militares de S. João de
Jerusalém dos Hospitalários implantou-se, por volta de 1126 ou 1128, no antigo Condado Portucalense.
Esta ordem militar, devido ao seu
carácter supranacional, veio a despenhar um importante pape na ligação
estratégica de Portugal ao Mediterrâneo, mas também ao reino de Aragão (21).
A primeira sede em Portugal foi no
convento de Leça do Bailio (Porto), fixando-se mais tarde no Crato,
onde o prior D. Álvaro Gonçalves
Pereira, pai de D. Nuno Alvares Pereira, mandou erguer o Mosteiro
da Flor da Rosa. Os reis portugueses deram-lhe importantes domínios
como os castelos da Sertã (1174), Cernache do Bonjardim (1182), Belver (1210?),
Amieira e Crato, e muitas outras comendadorias como Oliveira do Hospital,
Oleiros, Gavião, Gáfete, Proença, Pedrogão, Álvaro, Marialva (1297), Guarda, Aguiar, Fontes, Vera
Cruz de Marmelar, Serpa, Moura, etc.
A principal missão destes
frades-cavaleiros era proteger os peregrinos cristãos que se deslocavam à Terra Santa,
atacando os piratas muçulmanos.
A presença dos
hospitalários portugueses nos combates da Ordem no
Mediterrâneo, contra os muçulmanos, foi sendo reforçada depois da queda da Cidade
Santa (1187), quando a Ordem se estabeleceu primeiro em S. João de Acre (1187-1291), depois em Chipre (1291-1309) e finalmente na ilha de Rodes (1309-1522).
Fruto desta activa acção dos
portugueses foi a eleição de D. Afonso de Portugal (1135-1207), em 1202, para Grão-Mestre da Ordem dos Hospitalários.
No século XV, os hospitalários
portugueses tinham não só um forte presença na sede da Ordem, mas sobretudo,
tinham já uma
grande experiência nos combates navais no mediterrâneo. Os hospitalários eram os
grandes corsários deste mar.
A ordem estava dividida em linguas,
cada uma com o seu albergue. Portugal integrava a línguas hispânicas (Castela e
Leão, Catalunha, Navarra e a castelhania de Amposta). O mestre eleito destas
linguas foi sempre um português (20).
Os priores do Crato, no século XV,
não apenas estão envolvidos em combates contra os muçulmanos no Mediterrâneo,
mas também em acções político-diplomáticas ao serviço do rei Portugal:
- Alvaro Gonçalves Camelo, e
o capitão Afonso Furtado Mendonça, foram enviados por D. João I à Sicilia, sob o
pretexto de negociarem o casamento do infante D. Pedro, com a ex-rainha D.
Branca (filha de Carlos III, rei de Navarra). O objectivo era outro, foram espiar os
movimentos dos muçulmanos, antes do assalto a Ceuta.
- João de Ataíde, em 1444,
comandou um grupo combatentes, aquando do cerco de Rodes pelo sultão do Egipto.
Em Outubro de 1448 foi enviado como embaixador do rei ao papa.
- Vasco de Ataíde,
entre 1462 e 1466 (pelo menos), era simultaneamente lugar tenente do mestre da
Ordem e governador geral do tesouro comum de Rodes (18).
- Diogo Fernandes de Almeida,
por exemplo, entre 1480 e 1486 (?) andou por Rodes a atacar muçulmanos, tendo
feito ricas presas (17). Em Portugal, durante dois dias acompanhou Colombo, quando este regressou
da América em 1493. Mais
Foi para Rodes que se dirigiu, em
1487, Pedro da Covilhã e Afonso Paiva, antes de entrarem em
territórios muçulmanos. Foram alojados na ilha por dois portugueses.
Antes da Batalha de Diu (1509), os
portugueses a partir de Rodes destruíram vários navios com madeiras e armas que
os venezianos pretendiam fazer chegar ao sultão do Egipto, para este atacar os
portugueses no Indico. -Ainda a partir de Rodes, mas já depois da batalha de
Diu, o frade-cavaleiro André do Amaral, destruiu a esquadra do
Mediterrâneo do Sultão, estacionada no porto do golfo de Âyâs (23/8/1510).
Como é sabido, a tomada de Rodes
pelo imperador otomano Solimão, dito, "o magnifico", envolve um português - André do Amaral
(chanceler-mor de Rodes),
que foi acusado de traição (1522). A presença portuguesa não desapareceu, muito
pelo contrário, reforçou-se ainda mais quando a Ordem se estabeleceu na ilha
de Malta. |
d
) Génova - Colónia portuguesa
As viagens regulares
entre os portos de Portugal e Génova datam pelo menos de 1277. Se havia
mercadores portugueses em Génova, havia também mercadores genoveses em
Portugal. Este facto não impedia a pirataria, nem o corso entre ambos os
países. Em 1370 estabeleceram um Tratado sobre o corso (3 ).
Um caso amoroso ligou Portugal a
Génova na segunda metade do século XIV. A infante Maria, filha de D. Pedro I,
rei de Portugal e de Constança Manuel, princesa aragonesa, casou-se em 1354 com
o infante Fernando de Aragão (1329-1363), marquês de Tortosa (27).Tornou-se senhora de Fraga de
Aragão. Após o assassinato
do seu marido, apaixonou-se por um marinheiro genovês (Baldassare Spinola ou
Badasal (1470),
que integrava uma expedição que o rei D. Fernando I, enviara a Barcelona para
resgatar ouro que aí se encontrava e que pertencia a um português. A
infanta portuguesa apaixonou-se pelo genovês e partiu com ele para Génova, onde
acabou por morrer na miséria (cfr. Fernão Lopes, Crónica de Fernando, cap.LIV).
No século XV, a
comunidade portuguesa na cidade era já muito numerosa. Na segunda metade deste século, um grande número de navios portugueses estavam ao serviço de Génova
abastecendo a cidade de trigo que traziam da Sícilia e do Sul da Itália. O
conflito de interesses entre portugueses e genoveses (7), não impedia a
cooperação comercial.
Recorde-se
que toda a industria textil de Génova, era abastecida também de lãs
provenientes da Península Ibérica, transportadas por navios portugueses e da
Viscaia.
Os
interesses de Portugal em Génova, levaram inclusive o próprio
rei português (D. Manuel I) a ter no princípio do século XVI um feitor na cidade (Vicente
Rodrigues de Calvos, cavaleiro da Ordem de Cristo).
Acontece
que foi durante este período que Colombo estabeleceu os seus alegados contactos
com o Banco de S. Jorge desta cidade. Terá a Ordem de Cristo funcionado como
intermediária ou fez apenas parte da manobra de diversão/ocultação?
A nobreza portuguesa
tinha aqui os seus próprios advogados para se fazerem representar nos seus negócios.
Muitos destes portugueses atingiram elevados cargos públicos em Génova, como foi o caso de Afonso
Cordato, eleito em 1535 ajudante do Juíz da cidade, cujos serviços são
depois requeridos também por Beatriz de Portugal, esposa de Carlos III de Sabóia. O
Banco de S. Jorge tinham entre os seus clientes muitos mercadores e nobres
portugueses.
Portugueses ao serviço de Génova
O conhecimento náutico dos
portugueses, no século XV, está incomparavelmente mais avançado do que o dos
genoveses. Estes não tardaram em pedir a ajuda a Portugal para se puderem
defender.
O historiador Jacques Heers, refere
significativamente que, em 1463 (?), um navio do Infante D. Henrique, chamado "Santa
Maria Flor da Rosa" andava ao serviço da comuna de Génova a lutar contra os
corsários (11).
e ) Chios (Quios)
- Agente comercial
Os
navios portugueses na segunda metade do século XV penetravam por todo o
Mediterrâneo até Constantinopla. Na ilha de Chios (Quios), onde comerciavam e
faziam escala. Devido à intensificação do tráfico, em finais do século., a
corte passou a ter um agente - Gaspar Pereira, moço de câmara (6). O açúcar
da Madeira era para aqui exportado.
F ) Sicília - Feitoria portuguesa
Desde
pelo menos a primeira metade do século XIV que os mercadores portugueses
adquiriam trigo na Sicilia. Uma destas expedições documentadas, partiu de
Lisboa, em 1334, enviada pelo alcaide, juizes e homens bons. Em 1395, o
tesoureiro do rei de Aragão, dava conta da chegada à Sicilia de uma esquadra
portuguesa.
No início do século XV
foi criada uma feitoria portuguesa, uma das suas principais funções era adquirir
trigo, para abastecer as
fortalezas do Norte de África. Ainda não foi estudada a documentação desta
Feitoria, existente no Corpo Cronológico da Torre do Tombo.
As
intensas relações com a Sicilia, acabaram por estimular a fixação de grupos
de portugueses. Em 1443, um grupo de judeus portugueses foi autorizado a fazê-lo.
G ) Chipre - Casamentos Reais
A presença de portugueses nesta
ilha, data provavelmente da época em que a mesma foi sede da Ordem dos
Hospitalários (1291-1309).
Na
primeira metade do século XV, Portugal procurou conhecer as rotas que do
Oriente atravessavam o Mediterrâneo. Para além da acção própria dos
espiões, o Infante D. Pedro, Duque de Coimbra teve neste domínio um
papel de fundamental ao percorrer todo o Mediterrâneo Oriental, incluindo o
Egipto e a Terra Santa.
Em
resultado desta acção diplomática e comercial, o seu filho o infante João de
Coimbra, casou-se em 1456, com Charlotte de Lusignan, princesa herdeira de Chipre.
O seu vedor - Vasco Gil Moniz ( falec.1497), casou-se com Eleanor de Lusignan, pertencente à família real da ilha. A intervenção política de
Portugal penetrava no século XV por todo o Mediterrâneo.
O Infante D.
Henrique, segundo uma antiga tradição (errada), mandou vir de Chipre, a cana do açúcar que
foi plantada na Ilha da Madeira.
Recorde-se
que Vasco Gil Moniz era parente de Filipa Moniz Perestrelo, esposa de Cristovão
Colombo.
i ) Portugal e o Norte da Itália (Saboia e
Milão)
Portugal
tinha importantes interesses estratégicos no Mediterrâneo, quer em Itália, quer
em Aragão, que tradicionalmente disputava aos
franceses o domínio da costa ocidental da Itália. A explicação, como
dissemos, era criar alianças locais para contrabalançar o poder de
Castela na Península Ibérica.
D. Afonso Henriques, primeiro rei
Portugal, por idênticas razões estratégicas foi a Ducado de Saboia, que
procurou a sua esposa: Mafalda (ou Matilde) de Mouriana e Savoia (1130-1158). A
ligação do país ao norte de Itália, como veremos, nunca mais se perdeu.
Após
assinatura do Tratado de Tordesilhas (1494), não é de excluir a hipótese, como já dissemos, da própria Corte Portuguesa ter começado a difundir a
ideia que Colombo ser italiano, inclusive genovês, tendo em vista ocultar a traição que fora
cometida por nobres ligados à Casa de Bragança e o logro para onde
acabaram por conduzir a Espanha.
Nesta
acção de mistificação Portugal serviu-se da sua excelente rede
contactos internacionais, mas também dos laços de parentesco da nobreza portuguesa que cobriam toda a Europa.
A criação de alegados "heróis" italianos era também uma forma de
incentivar o nascimento de sentimentos independentistas entre os italianos, de
modo a enfraquecer o domínio que os espanhóis e franceses tinham no
Mediterrâneo.
O Duque de Bragança, D.Jaime,
manteve em Itália durante 7 anos (1510-1517), um espião (fidalgo de Chaves) para
recolher informações, nomeadamente sobre possíveis alianças matrimoniais no
norte de Itália (28).
Um
dos exemplos destas cumplicidades (ou troca de favores ? ) está no facto de Carlos III, Duque de Saboia, em 1516,
ter pedido em casamento
a infanta Dona Beatriz de Avis ( 1504-1538), filha de D. Manuel I.
O rei só lha concedeu, em 1521,
pouco antes de falecer.
Anos depois, os italianos voltam à carga conseguem casar,
em 1565, a Infanta
Dona Maria (1538-1577), filha do Infante D.
Luis, irmão de D. João III, com Alexandre Farnésio, 3.º duque de
Parma e Plasencia.
Estes casamentos consolidam a
ligação de Portugal ao norte de Itália, e em particular ao Ducado de Saboia (29).Uma ligação que nem sempre deixou boas recordações (30).
Estes e outros casamentos
de nobres portugueses em Itália,
poderão ter sido o pagamento da cumplicidade dos italianos na ocultação
da traição (1483/4) e do logro a que os espanhóis foram conduzidos por Colombo. Uma das figuras mais enigmáticas que entre 1498
e 1506 privou com Colombo foi o padre Gaspar Gorricio, natural de Novara,
pertencente aos domínio destes duques italianos.
Carlos
Fontes. |
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Notas:
( 1 ) F. Braudel, Civilização
Material. Economia e Capitalismo. Séculos XV-XVIII.
( 2 ) L. A. da Fonseca.
Navegacion y Corso en el Mediterrâneo Ocidental. Los Portugueses a Mediados dei
Siglo XV. Pamplona, 1978.
( 3 ) Luis de Albuquerque,
Introdução à História dos Descobrimentos.
( 5) António Romeu de Armas, procurou em 1492
demonstrar este facto, recorrendo apenas a alguns dos inúmeros exemplos
históricos (cfr. Presencia Temprana de Cristobal Colón en Portugal .... ). A
bibliografia que aponta é muito limitada, mas a suficiente para revelar que o
Mediterrâneo que Colombo inscreve-se integralmente na rota dos
navios portugueses neste mar.
(6) A carta de quitação data de 14/3/1499. Cfr.
Freire, A. Bramcamp - Cartas de Quitação del Rei D. Manuel, AHP, II, 1904,
p.429
7) Heers, Jacques - Portugais et Génois au
XVéme Siécle. La Rivalité Atlântique- Mediterrané. Separ. das Actas do III
Colóquio Internacional de Estudos Luso-Brasileiros. II,
pp.138/147.Lisboa.1960
(8) Barata, Filipe Themudo - Navegação,
Comercio e Relações Politicas: Os Portugueses No Mediterraneo Ocidental (1385-1466). Fundação Calouste Gulbenkian. 1998.
(9) A Senhoria de Veneza, por
exemplo, a 5/10/1410, publicava um decreto que estabelecia facilidades
comerciais aos navios portugueses que andavam no Adriático (Cfr. Visconde da
Lagoa - Estimulo Económico da Conquista de Ceuta, pp.70-71 e 77)
(10) Dias Dinis - Monumenta
Henricina, Vol. V, pp. 52-54
(11) Jacques Heers - L'Expansion Maritime
Portugaise a la fin du Moyen Age: La Miditerranee, in «Revista da Faculdade de
Letras», Tomo XXII, Lisboa, 1956, p. 10
(12) Albuquerque, Luis - Introdução à História
dos Descobrimentos, cap. I. 1962.
(13) Grande parte da documentação da Ordem dos
Hospitalários foi destruída, em 1662, quando o exército espanhol, comandado por João de Áustria, arrasou a Vila do Crato e os arquivos da Ordem .
Um dos seus objectivos foi destruir a memória dos portugueses.
(14) Gomes, Saul António - D. Afonso V, pp.280
-24
(15) Godinho, Vitorino Magalhães - A Expansão
Quatrocentista Portuguesa. p.247.
(16) Coelho, Maria Helena da Cruz - A Política
Matrimonial da Dinastia de Avis: Leonor e Frederico III da Alemanha, in, Revista
Port. História. Coimbra. T. XXXVI (2002-2003). pp 41-70
(17) "Foi destes reinos (Portugal) Dom Diego
Fernandes d`Almeida, que era eleito para ser prior do Crato, e foi bem
aparelhado, e no caminho e em Rodes ganhou muita honra, sendo ferido, pelejando
com galés, fazendo ricas presas como homem de nobre sangue.", in, José Anastácio
de Figueiredo -Nova História Militar da Ordem de Malta ...Vol. 3
(18) Goñi, Carlos Barquero - Las Relaciones entre
Rodas y los Hospitalarios Navarros durante el siglo XV (años 1400-1480) ...
(1995)
i(20) Duran i Duelt, Daniel - Presencia Hispanica
em Rodas. A propósito del albergue de la lengua de España, in, Mramegh, 19
(2009), pp. 97-112.
(21) Consultar: XVII- Congreso de Historia de la
Coroa de Aragón. Actas Vol.II. Barcelona-Lleida.7 -12 Set. 2000
(22) Portugueses em Aragão: Muñoz Pomer, Maria
Rosa - Valencia y sus relaciones comerciales: dret de la mercaderia 1411. In:
Actas das 2.as Jornadas Luso-Espanholas de História Medieval, vol. 2. Porto,
Centro de História da Universidade do Porto, 1987, p. 677-719; Costa, Marisa - O
Elemento Estrangeiro nas cidades catalãs...; Luz, Francisco Mendes de - Aragão,
Relacões com Portugal, in, Dic. História de Portugal, dir. Joel Serrão, Vol. I,
Porto. 1975;
(23) Portugueses na Biscaia: Barros, Amândio
Jorge Morais - O grande comércio dos "pequenos actores". Portuenses e bascos na
construção do sistema Atlântico..., in, Revista Int. Estudos Bascos, 50, 2,
2005; Graça, Gonçalo - Portugueses na Biscaia nos finais da Idade Média....;Arízaga
Bolemburo, Beatriz - El comercio vasco-portugués a fines de la Edad Media.
In: Actas das 2.as Jornadas Luso-Espanholas de História Medieval...;
(24) Portugueses em Sevilha: González Gomez,
Antonio - Notas sobre las relaciones economicas entre el antiguo Reino de
Sevilla y Portugal durante el siglo XV. "Studia", Lisboa, 47, 1989, p. 41-59
(25) Portugueses nas Canárias: Machado, José Luis
- Importancia del Poblamiento Português...
(26) Portugueses na Bretanha: Marques, A. H. de
Oliveira - Bretanha e Portugal no século XV...
(27) Fernando de Oliveira, Três Ensaios Sobre
Figuras Medievais
(28) Lopes, Paulo - Um Agente Português na Roma
do Renascimento. Lisboa. Temas e Debates. 2013
(29) Raviola, Bythe Alice; Lopes, Maria Antónia -
Portugal e o Piemonte. A Casa Real Portuguesa e os Saboias. Universidade de
Coimbra. 2012.
(30) Na crise de sucessão de 1578/1580, um dos
pretendentes ao trono de Portugal foi Emanuel Filiberto, Duque de Saboia, filho
da infanta Dona Beatriz, neto de D. Manuel I.
Filipe
III, no século XVII, conhecendo estas cumplicidades e ligações entre os
nobres portugueses e italianos, nomeou para vice-rainha de Portugal, em 1634, Margarida de
Sabóia (1589-1656), Duquesa de Mantua e Monferrato, que acabou por ser presa e expulsa de
Portugal, em 1640, quando os portugueses restauração a Independência do país.
A seguir à restauração de
Independência, dois reis da Dinastia de Bragança - D. Afonso VI e D. Pedro II
- casaram-se com Maria Francisca Isabel de Sabóia (1646-1683), filha do Duque de Sabóia
- Carlos Amadeu de Sabóia.
No século XIX, temos Maria Pia de Saboia
(1847-1911) que se casou com o rei D.Luis.
Carlos Alberto de Savoia-Carignano, rei da
Sardenha, exilou em Portugal, onde faleceu na cidade do Porto a 28 de julho de
1849.
O último rei de Itália - Humberto II (Umberto
Nicola Tommaso Giovanni Maria di Savoia), exilou-se também em Portugal (1946). |