|
Brasil
Entre 1808 e 1821, o
Brasil viveu num curto espaço de tempo a maior transformação da sua
história. Nunca os progressos alcançados foram tão rápidos e duradores.
Quando D. João VI regressa a Portugal após 13 anos nos trópicos, deixa atrás
de si um "império" com um Estado e instituições consolidadas não
apenas no plano interno, mas também internacional. Trata-se de um feito
extraordinário de um rei apresentado como "indeciso".
.
D.
João VI e Carlota Joaquina, uma rainha tipicamente espanhola (uma continua
fonte de problemas).
.
D. João VI, ainda principe
regente, desembarcou em Salvador, na
Bahia, a 22 de Janeiro de 1808, só chegando ao Rio de Janeiro a 8 de
Março de 1808. A colónia que encontrou tinha as suas fronteiras praticamente
definidas, possuindo uma forte unidade interna e sem grandes movimentos
separatistas, característica comum às colónias espanholas.
Seguindo um plano previamente
definido, mal chegou ao Brasil, tratou desde logo de criar um novo reino à
imagem do Estado Português. Em menos de 7 anos, o Brasil ascendia já à categoria de "Reino
Unido a Portugal e Algarves " (1815), na prática era o seu reconhecimento como um reino e o Rio de
Janeiro como a capital do império português. Não existe em todo o mundo uma
situação similar.
1 ) Administração pública.
O Brasil foi dotado de estrutura política-administrativa complexa. Na cúpula
tinha apenas três ministérios: o da Guerra e Estrangeiros, o da Marinha e o da
Fazenda e Interior. Foi criada a Casa de
Suplicação (Supremo Tribunal), Intendência Geral da Polícia, etc. As capitanias transformaram-se em províncias (1816), e tudo
mais seguiu a mesma estrutura existente em Portugal. Se não encontrava no
Brasil quadros qualificados para a Administração Pública, requisitava-os de Portugal.
D. João VI desde o inicio que deu sinais claros que estava a criar um novo
Estado, embora replicado do existente em Portugal. Criou no Brasil também uma
nova nobreza. Entre 1808 e 1821 concedeu títulos a 28 novos marqueses, 8
condes, 16 viscondes, 21 barões, 4 mil cavaleiros.
2 ) Política Externa.
Nada foi deixado ao acaso na afirmação do Brasil no Mundo, os
diplomatas portugueses no estrangeiro promoviam activamente a imagem do novo
Estado. O próprio D. João VI foi o primeiro e o único monarca europeu que se
fez coroar no Novo Mundo (1818), como o 27º rei de Portugal e o 1º do Reino
Unido do Brasil e Portugal. O casamento do seu filho D. Pedro foi
feito no Rio de Janeiro com Dona Leopoldina, filha do arquiduque da Austria, uma
das grandes potências do tempo. Procurou-se transmitir a ideia que o Brasil era
não apenas um novo país, mas uma potência.
Numa
clara afirmação de força internacional, invadiu
a Guiana Francesa (1808-1817) e a Provincia Cisplatina (actual Uruguai), anexada
em 1821, em represália ao auxílio dado pelos espanhóis à invasão francesa
de Portugal. Através de
hábeis manobras políticas, militares e diplomáticas continuou a expandir as
fronteiras do Brasil na América do Sul.
3 ) Finanças Públicas.
Criou o Banco do Brasil, a Casa
da Moeda e outras instituições próprias de um Estado independente.
4 ) Defesa.
Num mundo em guerra tratou de imediato em assegurar a defesa do Brasil,
reconstruíndo as suas fortificações, melhorando o exército e marinha de guerra. Criou a Real Militar
(1810), a Academia da Marinha, um Conselho Militar, uma fábrica de pólvora,
organizou fundições de ferro, etc. Atendendo às necessidades de militares especializados, contratou profissionais
como os tenentes
engenheiros Halfeld e Koeler,
o major Schaeffer
que trouxe mercenários da Alemanha, para formar o "Corpo de Tropas Estrangeiras",
etc.
Prosseguindo uma forte política
de unidade nacional, em 1817, aniquilou com tropas vindas de Portugal a
Revolução de Pernambuco que pretendia separar Nordeste do resto do Brasil.
5 ) Comércio.Os
portos do Brasil foram abertos ao comércio mundial
(28/1/1808), criando múltiplos mecanismos de controlo do comércio e navegação marítima.
Foi criada a Junta Geral de Comercio, Despachante das Embarcações que saíssem dos portos
(7/06/1809), Mesa de Despacho Marítimo que, além de
outras atribuições, regulava a maneira pela qual deviam ser efetuados os
Despachos dos navios que saíssem dos portos (3/02/1810), etc.
6 ) Industria.
Autorizou e incentivou a criação de manufacturas, pondo a um decreto datado de
1785 (D.Maria I). Entre as muitas manufacturas que então
surgiram, sobressaem as seguintes a primeira fábrica de Vidro
(Salvador,
1810),
seguiram-se outras de tecidos, ferramentas, corantes, óleos de
iluminação, ferro (Usina de Ipanema nas províncias de São Paulo e Minas
Gerais), pólvora, etc.
7 ) Agricultura.
A produção agricola foi incrementada:o açúcar e o algodão,
passaram a ter primeiro e segundo lugar nas exportações. Incentivou a produção de Café. Em 1810 ou 1812, D. João VI mandou
vir de África, sementes de café e distribuiu-as pelos fidalgos que tinham
terras no vale do Paraíba e norte de São Paulo. Ele mesmo, com as próprias mãos,
dava-lhes pequenos sacos com as sementes e estimulava o seu plantio. Outras das
plantações que procurou introduzir no Brasil foi o Chá da China, tendo
para o efeito contratado cerca de 200 chineses, muito experientes no seu
cultivo. Um cultivo que se revelou um falhanço.
Não ficou por
aqui a sua acção, pois está ligado ao estudo cientifico de novas plantas a
cultivar no Brasil. Nesta
época são introduzidos no Brasil os célebres
Cavalos de puro sangue da Caudelaria de Alter do Chão (Alentejo, Portugal). Foi igualmente
criada uma Aula de Agricultura na Bahia (1812).
8 ) Colonização Interna.
O Brasil em 1808 era uma enorme colónia, mas fracamente povoada, sendo o
trabalho realizado por escravos. Embora não tenha acabado com a escravatura,
limitou os abusos dos brancos em relação aos escravos.
Tomou as primeiras medidas para
subituir a mão-de-obra escrava, por trabalhadores assalariados fomentando a Emigração. Em 1818
deu início ao processo de colonização no Brasil, trazendo colonos
estrangeiros. Emigrantes suiços criaram, neste ano, Nova
Friburgo, famílias alemãs estabeleceram-se em Ilhéus, São Jorge (Capitania da
Bahia), etc. Trata-se uma verdadeira revolução no contexto colonial.
9 ) Comunicações.
Ainda antes de chegar ao Brasil já D. João VI estava a ordenar um vasto plano
de abertura de estradas de modo a ligar todo o território, por exemplo, a
importante estrada entre Rio de Janeiro e a Bahia. Uma rede de fortificações ao longo destas vias
garantiam a sua segurança dos Indios. Todos os portos foram complemente remodelados. a
a 10 ) Saúde Pública.
Entre as muitas medidas que foram tomadas para melhorar a saúde pública,
regista-se a criação da Escola de Cirurgia da Bahia e da Escola Anatômica,
Cirúrgica e Médica do Rio de Janeiro (1808), Botica Real (1808), Junta Vacínica (1811),etc.
11 ) Educação. A
acção de D. João VI, embora muito centrada no Rio de Janeiro, Salvador e
Bahia, foi notável no domínio do ensino, rompendo com o passado. Para além de
ter criado muitas escolas elementares, está ligado também a criação des Escolas de
Comércio, a Escola Real de
Ciências, Artes e Ofícios e a Academia de Belas-Artes
12 ) Ciência.
É espantosa a obra de D. João VI no Brasil. Entre outras fundações de raiz
conta-se o Observatório
Astronômico e o
Jardim Botânico, criado em 1808, destinado à
cultura de plantas exóticas, é um parque sem rival no mundo dada a variedade
de espécies cultivadas. Oficiais portugueses enriqueceram-nas com preciosas
colecções de plantas vindas de todo o Império, mas também das Maurícias e
das Guianas Francesas. Na àrea da Química, entre os laboratórios
criados
no
Rio de Janeiro, o Laboratório do Conde da Barca (1808-?), o Laboratório Químico-Prático
do Rio de Janeiro (1812-1819), etc.
Aproveitou todas as ocasiões
para mandar vir cientistas para estudar o Brasil. Entre elas destaca-se a
Missão científica
patrocinada pelos governos
da Áustria e da Baviera, que acompanhou a princesa Leopoldina de Habsburgo
que em 1817 chegou ao Brasil para se casar com o príncipe D. Pedro. Era constituída entre outros por Johhann
Christof Mikan, botânico e entomólogo; do Dr. Johann Emanuel Pohl, Médico,
mineralogista e botânico; de Johann Buchberger, pintor de plantas; de Johann
Natterer, zoólogo; de Rochus Schüch, mineralogista e bibliotecário; sem
esquecer ainda a presença do jardineiro botânico Heinrich Schott. A esta
missão se juntaram ainda, a convite do Imperador da Áustria e da Baviera, dois viajantes e pesquisadores que se celebrizariam pelos seus depoimentos e
escritos sobre o Brasil da época: o zoólogo Johann Baptista Spix e o botânico
Karl Friedrich Philip Von Martius.
13 ) Imprensa.
Em 1808 a Brasil travessa uma verdadeira revolução cultural, numa assentada é
criada a Imprensa Real e são fundados os
primeiros jornais do Brasil, um no Rio de Janeiro (Gazeta do Rio de
Janeiro) e outro na Bahia. Foram editadas obras de muitos autores e traduções
de obras científicas. O número de jornais não parou de aumentar, revelando
uma crescente abertura do Brasil em relação ao mundo.
14 ) Bibliotecas e Museus.
Em 1807 acompanharam a Corte várias bibliotecas arquivos de Portugal. Nos
anos seguintes outras continuaram a ser despachadas para o Brasil. Em 1810
fundou a Biblioteca Pública. A 6 de Junho de 1818 é criado por iniciativa,
o Museu Real (Museu Nacional da Quinta
da Boa Vista ligado à Universidade Federal do Rio de Janeiro).
15 ) Artes.
Para transformar o Rio de Janeiro, numa capital similar às principais capitais
europeias, investiu enormes somas na vinda de artistas e músicos, mas também
na realização de manifestações artísticas e religiosas. Entre as mais
importantes instituições que criou destaca-se a referida Academia de Belas Artes e o Real Teatro S. João (actual Teatro
João Caetano).
Entre os muitos músicos estrangeiros que passaram pelo
Brasil, destaca-se em 1816, o austríaco Sigismund
Neukomm, discípulo predileto de Haydn, acompanhou o Duque de Luxemburgo,
enviado pelo rei Luiz XVIII da França
ao Rio de Janeiro a fim de levar os cumprimentos reais ao recém coroado D.João
VI. Em quatro anos escreveu inúmeras obras, algumas com temas luso-afro-brasileiros,
como o lundum, modinhas, etc.
Desta vasta acção tem sido
destacada também a Missão artística Francesa, que chegou ao Rio em
Março de 1816, dela faziam parte, entre outros, Joachim Lebreton (pintor),
Nicolay Antoine Taunay (pintor), Auguste Marie Taunay (escultor), Jean-Baptiste
Debret (pintor), Augusto Henrique Vitorio Grandjean de Montigny (arquiteto),
Sigismund Neukomm (compositor, organista e mestre-de-capela). Um excelente
exemplo da obra desta Missão é a "Casa França-Brasil", mandada erguer em
1819 por D. João VI, ao arquiteto Grandjean de Montigny.
16 ) Remodelação do Rio de Janeiro. A chegada da família
real, acompanhada de 10 mil pessoas, provocou uma alteração completa
numa cidade que na altura contava com cerca de 60 mil habitantes. As obras de
remodelação da cidade iniciaram-se em 1808, alterando profundamente a sua
fisionomia. Entre as largas centenas de edificios privados e públicos construidos ou completamente
alterados, contam-se o Palácios de S. Cristovão e o Palácio de Santa Cruz. O facto de ser a capital de um Império Mundial, fez afluir
ao Rio de Janeiro estrangeiros das mais variadas partes do mundo, tornando-a
numa cidade cosmopolita nos trópicos. Em 1820 contava já com 100.000
habitantes.
D. João VI regressa a Portugal a
26 de abril de 1821, deixa atrás de si o seu herdeiro ao trono - D. Pedro -, que de acordo com o
esperado ( ou planeado ? ) não tardou a declarar meses depois a independência
do Brasil (1822), uma monarquia num continente dominado por repúblicas.
A transição política foi feita
sem grandes convulsões. Com esta estratégia de D. João VI foi possivel manter até 1889, num e outro do
Atlântico a mesma
dinastia dos "Braganças". Uma das grandes preocupações deste monarca
absolutista.
.
| |