Extremadura
Monasterio
Real de Nuestra Señora de Guadalupe
O culto de Nossa Senhora de
Guadalupe difunde-se em Portugal e Castela a partir da batalha do Salado, em
1340, quando os castelhanos, com a ajuda de portugueses derrotaram um poderoso
exército muçulmano.
A vitória dos cristão foi
atribuída à intervenção divina desta virgem, cuja imagem, segundo da lenda,
tinha estado enterrada séculos até ser descoberta no século XIV por um pastor,
junto ao Rio Guadalupe (Cáceres).
Afonso XI, rei de castela
e a sua esposa D. Maria de Portugal-, tomaram sob a sua protecção a
pequena capela onde estava a imagem, transformando-a num mosteiro. Entre
os primeiros frades que em 1373 entraram no mosteiro contavam-se portugueses. Em
1389 foi entregue aos frades Jerónimos.
Tornou-se talvez,
por esta razão, um dos locais privilegiados de encontro entre a nobreza portuguesa e
a
castelhana.
Século XV
Este mosteiro já no século XIV
estava ligado à nobreza portuguesa. Em meados do século XV foi aqui sepultado um dos
filhos de D. Pedro I e Dona Inês de Castro, o Infante D. Dinis de Portugal (1354-1397).
Na
crise de 1383-85 foi um dos pretendentes ao trono de Portugal, juntamente com a
sua irmã Beatriz de Portugal (casada com o rei Juan I de Castela) (4)
O tumulo estava
inicialmente no meio da Capela de Santa Catarina e foi realizado em 1461 pelo
escultor holandês Anequín Egas, por ordem de Beatriz de Portugal (?-1470). Na
tampa do sepulcro estava escrito: "Rey de Portugal" (1). No
século XVI foi resolvido retirar o tumulo do centro da capela, ficando os dois
esposos em dois "altares" separados com as armas de Portugal,
tendo em cada deles estátuas dos defuntos da autoria de Pompeo Leoni
(c.1533-1608).
O Mosteiro a partir
de segunda metade do século XIV passou a ser muito concorrido pelos portugueses,
nomeadamente para pagarem as suas promessas pela cura de maleitas, salvação de
naufrágios, fuga ou resgate do cativeiro no Norte de África.
D. Nuno Alvares Pereira,
depois de combater os castelhanos em Valverde de Mérida (1385) veio em
peregrinação a este santuário, o revela como o culto de Guadalupe estava
acima das rivalidades entre Portugal e Castela.
Muitos foram os
marinheiros portugueses que constam do registos deste mosteiro. Dois casos
espantaram em 1495 Jerónimo Munzer quando o visitou:
- O crocodilo que
os portugueses trouxeram da Guiné;
- O "círio"
que D. João II ofereceu ao mosteiro, em 1490, por a virgem ter salvo Lisboa
da peste e de alguns dos seus súbditos se terem salvo de um naufrágio e
regressado salvos a Portugal. Dada a importância da expedição é possível que
tenha sido a de Bartolomeu Dias ao Cabo da Tormentas/Cabo da Boa Esperança
(1488) (2).
O Infante D.
Fernando, Duque de Beja-Viseu e mestre das Ordens de Cristo e de Santiago
foi outros dos muitos nobres que o visitou.
A popularidade deste mosteiro
atingiu o seu apogeu nos séculos XVI e XVII. Os monarcas
portugueses não eram alheios a este fenómeno popular. Três exemplos:
D. Afonso V.
Este rei visitou
visitou o santuário três vezes - 1458, 1463 e 1464. A sua ligação a Guadalupe
era profunda. Durante a Guerra da Sucessão (1474-1479), o Mosteiro de
Guadalupe foi um verdadeiro bastião na defesa da causa do rei português e da
Excelente Senhora (a Beltraneja). Os seguidores de Isabel de Castela e Fernando
de Aragão foram perseguidos em Puebla de Guadalupe e arredores.
D. Afonso V foi um dos protagonistas de um dos mais famosos milagres deste santuário,
milagre destacado nas crónicas do tempo e nas pinturas existentes no Claustro
Mudejar. A sua filha, a princesa Joana ( 1452-1490),
poucos dias antes de falecer em Aveiro, pediu a um dos seus capelões para ir por
ela em peregrinação ao santuário de Guadalupe.
D. João II. Se não é certo que
D. João II tenha visitado este santuário, a verdade é que muito a apoiou.
Deu-lhe, por exemplo, dois quintais de marfim, e um magnifico "Círio" mencionado
por Jerónimo Munzer.
Foi neste mosteiro que se soube da conspiração que estava a ser organizada
contra D. João II (1483).
O cronista Rui de
Pina teve uma relação muito especial com o mosteiro, em 1482 teve aqui conversações sobre o
caso de Dona Joana, a Beltraneja. O seu filho - Fernão de Pina,
também cronista mor, perseguido pela Inquisição, foi bafejado por um
milagre de Nª. Srª. de Guadalupe.
D. Manuel I. Enquanto foi Duque de Beja financiava regularmente este santuário, e continuou
a fazê-lo depois de ser coroado
rei de Portugal (1495). Em 1498 quando se dirigiu para
Toledo, para ser jurado herdeiro do trono de Espanha não deixou de visitar
Guadalupe. Os contratos de casamento com as duas filhas dos "reis católicos" -
Isabel e Maria - foram acordados em Guadalupe.
D. Manuel I doou
grandes quantidades de açúcar da ilha da Madeira ao mosteiro (6). Os reis
portugueses autorizaram também que durante o verão, 15 mil ovelhas do mosteiro
pudessem pastar na Serra da Estrela.
Em Portugal o culto de Nossa Senhora da
Guadalupe contava no século XV com várias capelas e igrejas, como
a Ermida de Santa Maria de
Guadalupe
(Serpa,
Portugal), Capela
de Santa Maria
de Guadalupe ( Raposeira,
Algarve), o Mosteiro
de Santa Maria de Guadalupe (Lisboa).
Mais
Século XVI
No século XVI
houve a clara intenção de difundir o culto de Nª. Srª de Guadalupe em Portugal e nos seus
territórios pelo mundo, desde o Brasil à India, como parte de uma estratégia de
"união ibérica".
Vila Real.
No princípio do século XVI, na atual freguesia de Mouçós, é construída ou
reconstruida uma Capela dedicada a Nª.Srª. de Guadalupe.
Ilha Graciosa,
Açores. Domingos Pires da Covilhã (c.1540-1617), em meados do século XVI, trouxe do México uma imagem
de Nª.Srª. de
Guadalupe, tendo sido então erguida uma capela. Em 1713 foi decido construir uma
igreja que se concluiu em 1756.
India,
Maharashtra. Em Chaul os dominicanos criam, em 1548, um mosteiro dedicado a
Nª.Srª. de Guadalupe, do qual atualmente só restam ruínas.
D. João III,
quando pretendeu reformar a Ordem de Cristo, encarregou desta missão o
seu confessor Frei António da
Silva, dito de Lisboa, religioso dos
Jerónimos do Mosteiro de Guadalupe.
A Ordem de Cristo perdeu a sua função militar e confinou-se à contemplação.
D. Sebastião.
Em 1576 reuniu-se em Guadalupe (Espanha) com Filipe II de Espanha, onde terá sido
discutido a sua malograda expedição militar em Marrocos, na sequência da qual
Portugal acabou por perder durante 60 anos a sua independência.
A Capela de Santa
Catarina, junto à sacristia foi completamente remodelada no século XVI, ficando em cada um dos
quatro cantos altares com os escudos de Portugal. Em dois ficou D. Dinis e a sua
esposa, e nos restantes Santa Catarina e Santa Paula.
Século XVII
Depois de 1580
certa nobreza mais ligada a Espanha reforçou a tradição de apoiar o Mosteiro de
Guadalupe e difundir o seu culto em Portugal e nos seus territórios, movimento
que só terminará no princípio do seculo XVIII. Esta divulgação incluiu a
edição de livros, divulgação de imagens de milagres, etc. (5)
Tratou-se de uma
estratégia de espanholização de Portugal, para a qual contribuiu os
Duques de Aveiro.
Título criado por D. João III, em 1547, para o neto de D. João II e filho de D.
Jorge de Lencastre. Tudo terá começado em 1539, quando João de Lencastre
(1º. Duque de Aveiro) foi a Guadalupe e se encontrou com Frei Martinho de
Santa Maria, franciscano, filho dos Condes de Santo Estevam del Puerto. Desta
amizade irá nascer o Convento de Arrábida em Portugal e a forte ligação dos
Lencastres a Guadalupe. Quando foi restaurada a independência de Portugal
(1640), o 4º. Duque - Raimundo de Lencastre (1620-1666) por ser muito novo ainda
se manteve em Portugal, mas não tardou a fugir (1659) para se colocar ao serviço
de Filipe III, o qual lhe atribuiu vários títulos, como Duque de Ciudad Real. Em
1664 à frente de uma armada espanhola atacou sem grande êxito várias posições na
costa portuguesa. Os Duques de Aveiro procuraram difundir este culto pelos seus
domínios em Portugal: Em Samora Correia - Palhavã, por exemplo, mandaram
construir uma ermida, destruída em 1941.
Alguns exemplos
da expansão deste culto em Portugal e colónias:
No Norte do país
destacam-se: Em Maia, uma capela, construída em 1580; Cepães
(Fafe), capela provavelmente já do inicio do século XVII.
No sul do país
destacam-se: Em Évora ( a 12 km) na Ribeira de Guadalupe foi erguida capela e depois uma igreja
dedicada em 1615 que fica muito perto do conhecido
cromeleque dos Almendres. Em Vila de Frades (Vidigueira) uma capela de
meados do século XVII que se encontra em ruinas.
Ribeira
Grande, S. Miguel, Açores. Gonçalo Alvares Batateiro e a sua esposa Inês
Pires, em 1592, solicitaram ao bispo de Angra autorização para construírem uma
ermida sob a invocação de Nª.Srª. de
Guadalupe. Em 1612 a ermida foi anexada a um convento, inaugurado em 1620. É
atualmente um museu franciscano.
Agualva, Praia
da Vitória, Ilha Terceira, Açores. A igreja terá sido construída em 1594,
mas o culto foi introduzido após a ocupação espanhola.
Funchal, Ilha
da Madeira. Na freguesia de Santo António, no inicio do século XVII foi
erigida uma capela a Nª. Srª. de Guadalupe. Na mesma altura foi erguida em
Porto da Cruz (Machico), outra igreja que foi demolida em 1960.
Olinda
(Brasil). Entre 1626 e 1629 é construída uma igreja dedicada a Nª.Srª.
de Guadalupe.
No mosteiro de
Guadalupe, em Espanha, a nobreza portuguesa reforça a sua ligação simbólica ao
mesmo, contribuindo com importantes doações para o seu engrandecimento.
No
"claustro mudejar", entre 1621 e 1623, Frei de Santa Maria, religioso
do mosteiro, realizou 32 pinturas sobre outros tantos milagres atribuídos Nª. Srª de Guadalupe.
Várias destas pinturas retratam milagres que
aconteceram a portugueses: a cura de D. Afonso V; o cronista mor "Fernando de
Piña" (Fernão de Pina, filho de Rui de Pina) foi salvo três vezes; Lisboa em
1604 foi livrada da peste, etc.
Maria de
Guadalupe de Lencastre e Cardenas
(Azeitão,1630 -Madrid,1715),
descendente de D. Jorge de Lencastre, filho bastardo de D. João II ,
fugiu também Espanha, onde veio a casar em 1665 com Manuel Ponce de León,
herdeiro ducado de Arcos, entre outros títulos. Maria de Guadalupe, que veio a
herdar o título de Duquesa de Aveiro (6º), entre muitos outros títulos, fez-se
sepultar em Guadalupe. No final do século XVII fez uma importante doação ao
mosteiro para ser construído um faustoso o camarim onde hoje se encontra a imagem da
virgem. Maria de Guadalupe formou uma fabulosa biblioteca (4.347 entradas) que
foi doada ao convento franciscano de Santa Eulália em Marchena, na província de
Sevilha.
Século XVIII
A corte
portuguesa continuou a financiar o mosteiro de Guadalupe só interrompendo as
doações no século XVIII. Em Portugal uma das últimas igrejas a serem dedicadas a
Nª.Srª. de Guadalupe foi construída em Braga, no ano de 1725, a mando do
arcebispo Rodrigo de Moura Teles. Nos domínios dos Duques de Aveiro, em Torres
Novas, foi construída a ermida de Adofreire, vale da Serra (1753) dedicada
também a Nª.Srª. de Guadalupe.
A Casa dos Duques
Aveiro, os grandes promotores em Portugal do culto de Guadalupe, como é sabido,
apareceu envolvida em 1759 na conspiração contra D. José. Para além das várias
execuções, o Palácio dos Duques e Aveiro, em Belém, foi destruído e o de Azeitão
abandonado.
Carlos Fontes
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