.

História da Formação Profissional e da Educação em Portugal

Carlos Fontes

Inicio . Anterior.  Próximo

Idade Contemporânea - (Séc.XIX)

Escolas Profissionais Particulares

Ao longo do século XIX abriram inúmeras escolas de formação, devidas à iniciativa particular, com ou sem apoio oficial. A maioria corresponderam a necessidades pontuais de uma dada industria. Estas escolas estavam longe de serem lucrativas, sendo muitas vezes sustentadas por beneméritos locais.

Em Peniche , onde a produção  de rendas de "bilros", teve no século XIX uma larga expressão surgia outra importante iniciativa. Nesta vila só em 1862 haviam ai cerca de 1000 rendeiras, e contavam-se segundo Joaquim de Vascocelos, cerca de 8 escolas de ensino de Bilros nesta Vila. Delas e dos métodos de ensino seguidos escreve Joaquim de Vasconcelos:

   "Apenas contam quatro anos, as raparigas de Peniche são mandadas para a "escola da renda". É um modo de dizer, porque não há ali organização, nem direcção racional, nem desenho, nem modelos, nem prémios" (... )

    "As "Escolas " são casas regidas por mulheres que, além das rendas, ensinam outras prendas e também a ler e a rezar. São as casas ordinariamente ao rés-do-chão ; vê-se ali a mestra encruzada, (...) diante da almofada, tendo sempre junto de si uma longa cana; diante dela, em fileira, estão vinte ou  mais raparigas, de costas para a mestra, sentadas ás almofadas. A cada uma já foi destinada a empreitada ou tarefa que deve acabar num determinado espaço de tempo, e ai daquela que fala com a companheira, que lhe fica próxima, ou se distrai, porque se a mestra  dá por isso lá vai a cana adverti-la; a vitima chora, as outras raparigas riem até lhes chegar a vez de chorar     "As mestras ganham muito pouco: 80 réis ou quatro vinténs por mes é um mesquinho salário , que cada discípula paga por aprender a fazer renda; mas se aprende outras prendas e a ler, o preço varia até 200 réis"[2]

Nas três ultimas décadas do século, as escolas profissionais privadas, nem sempre com fins lucrativos, expandiram-se por todo o país, mas em numero muito inferior ás que se dedicavam á instrução primária e ensino liceal. Algumas iniciativas atingiram mesmo uma projecção internacional, apoiando-se em métodos inovadores. Entre elas, destacamos 10 que nos permitem apreender este movimento.

A Associação de Protecção e Instrução do Sexo Feminino Funchalense, em 1876, por iniciativa de Maria Helena Jervis e João de Tamara, promovia cursos de instrução primária e profissionais. O filantrópismo estava bem presente na actividade desta escola, muito acro ao século XIX.

A Escola Livre das Artes do Desenho, criada em 1878 por António Augusto Gonçalves em Coimbra,  procura dar resposta á necessidade de uma estética que a cidade sente, mas que na Universidade não tinha lugar ao tempo. E hoje terá ?

A Sociedade de Instrução do Porto fundada em 1880 ministrava cursos de aperfeiçoamento em ourivesaria, e em desenho- modelação, possuía ainda um Museu de Artes Industriais e uma biblioteca de artes industriais. Um projecto que não pode ser desenquadrado da importancia que esta actividade tinha na cidade, e de que a escola é um excelente exemplo.

O Centro Artistico Portuense, no Porto, animado por Joaquim de Vasconcelos ( ? ), proponha-se em 1882, estabelecer um "Curso de Desenho Graduado e de Modelação", para "Artistas industriais", baseado em métodos austriacos e alemães[3]. Embora nunca tenha chegado a funcionar revela o labor e a acção do principal teórico do ensino artistico aplicado neste país.  

A Escola Pratica Comercial Raul Dória foi fundada a 30 de Novembro de 1902 no Porto, e foi desde logo considerada unica no seu género na Península Ibérica. Raul Dória ( 1878-1922) que foi o seu criador e director publicou um numero considerável de obras de carácter didáctico para apoiar o ensino de comércio nesta escola. O renome na escola ultrapassou fronteiras, sendo premiada com a medalha de ouro e prata na Exposição Nacional do Rio de Janeiro de 1908, com um Diploma de Mérito na Exposição Internacional de Joinville ( França) em 1912, e um Diploma de Honra na Exposição Internacional do Rio de Janeiro de 1923. O seu magnifico edificio próprio, com um escritório comercial e museus, representaram ao tempo um dos mais importantes investimentos privados no campo da formação profissional.

 A Sociedade Martins Sarmento, fundada em 1890, apresentou-se como um verdadeiro centro cultural na cidade de Guimarães. Entre as suas múltiplas actividades tinha cursos nocturnos de f.p., possuía um Museu Industrial, uma Escola na Cadeia desta cidade, para além de uma magnifica biblioteca de mais de 10 mil obras. Promovia ainda conferencias, editava a" Revista de Guimarães", e em colaboração com a Câmara Municipal realizará a primeira Exposição Industrial, Agricola e Artistica a nível concelhio no país. 

O Grémio Artístico, fundado em Lisboa em 1890, onde ensinou desenho e pintura o mestre A. Ramalho, iniciou um ensino que teve continuidade até aos nossos dias. Na realidade este Grémio juntou-se em 1899, á Sociedade Promotora de Belas Artes ( criada em 1861), dando origem em 1901 á actual Sociedade Nacional de Belas Artes que prosseguiu depois este ensino.  

A Escola de S. Patrício de Lisboa foi fundada em 1880 com o objectivo de promover a aprendizagem de oficios mecânicos e ministrar a instrução primária, não é um caso isolado.

O Real Instituto de Lisboa ou Instituto 19 de Setembro de Lisboa, foi fundado em 19 de Setembro de 1894, mas já em 1895 empreendia uma importante reforma dos seus estatutos concebida por António Cabreira, seu principal mentor. A formação profissional passava a ocupar uma lugar central na sua actividade. Para além cursos sobre matemática, geografia, abrangia as ciências industriais, comerciais, agricolas, e as belas artes, pretendia agora também organizar museus, gabinetes, etc, incluindo a abertura de escolas sucursais. A obra realizada excedeu todas as expectativas. A 10 de Setembro de 1899 abria uma importante Sucursal em Tavira. Um decreto de 11 de Abril de 1901 consagrou esta Escola como uma comunidade cientifica e escolar.

Esta Escola de carácter politécnico foi o primeiro estabelecimento português que ministrou cursos secundários, especiais e superiores gratuitos, chegando a possuir mais de 50 aulas, regidas, simultaneamente, por reputados professores que as davam graciosamente[4]. No vasto leque de cursos desta escola, frequentados por muitos milhares de alunos, destacavam-se o Curso Comercial dirigido por António Carreira e José Carreira, o Curso Colonial, o primeiro no país, um Curso de Educação Militar e Curso Artistico e as aulas de musica.  

A União Vinicola e Oleícola do Sul, Sociedade cooperativa com sede em Viana do Alentejo, no Alentejo defendia junto do monarca em 30 de Julho de 1893, a criação de uma oficina-escola de olaria da região, dadas as enormes carências locais que a arte atravessava, a despeito de ocupar um numero considerável de oleiros na região.

As escolas agrícolas particulares surgiram neste século, assumindo o carácter de escolas móveis agrícolas , destinadas sobretudo á divulgação de conhecimentos uteis. No final do século as Escolas Móveis de Agricultura Maria Cristina, que  editavam o jornal "O Lavrador", chegaram a possuir alguma influencia.  

 

Em construção !

  Carlos Fontes

Navegando na Educação

Notas:

 [2] Joaquim de Vasconcelos, in As Industrias Portuguesas

 [3] Arte Portuguesa, n.1. Janeiro de 1882. Orgão do Centro Artístico Portuense.

 [4] Portugal, Esteves Pereira e Guilherme Rodrigues, Vol.VI,pag.113.