A emergência da sociedade de
consumo, na maioria dos países ocidentais, nos anos 60 é indissociável do
aumento do rendimento familiar. Este facto permitiu expandir o consumo para níveis
que não tem paralelo em qualquer outra época histórica. Assistiu-se então,
ao que Jean Baudrillard caracterizará como culturalização do consumo, que
encontrará no centro comercial o seu paradigma.
O Centro Comercial foi e continua
a ser o principal paradigma destas novas relações. Nele o consumidor alterou
de forma radical hábitos seculares de relação com os produtos e bens
culturais. A "ambiência" passou a contar tanto os próprios produtos.
Esta organiza-se de forma a gerar uma panóplia de desejos e diversões
previamente estudados e permanentemente dinamizados.
Nos centros comerciais
esbateram-se as distinções entre a obra de arte e a pasta dentífrica, entre o
tratado de astronomia e a revista pornográfica, tudo é tratado como objectos
para serem desfrutados pelo olhar, e consumidos depois, sobretudo pela sua relação
de significação.
Em Portugal, o fenómeno só se
começa a impor na década de oitenta, sobretudo depois da inauguração do
Centro Comercial das Amoreiras (1985). O modelo foi rapidamente difundido por
todo o país.
1.2. O aumento dos tempos
livres
Uma das componentes essenciais da
sociedade de consumo foi o aumento dos tempos livre, reduzindo drasticamente
aquele que é ocupado no trabalho. O Direito à Preguiça de Paul Lafargue,
tornou-se um valor essencial para as novas gerações.
1.3. Ética do Consumidor
A nova sociedade de consumo criou
uma ética própria para os consumidores, capaz de os impelir a reproduzirem,
pelo consumo, o sistema económico e produtivo que a gerou.
"O homem- ser consumidor
considera-se como obrigado a gozar e como empresa de prazer e de
satisfação, como determinado-a-ser-feliz, amoroso, adulador/adulado,
sedutor/seduzido, participante, eufórico e dinâmico. Eis o principio de
maximação através da multiplicação dos contactos e das relações, por meio
do uso intensivo de sinais e objectos, por intermédio da exploração sistemática
de todas as virtualidades do prazer".
Os apelos ao prazer tornaram-se o
corolário dos apelos ao consumo. Ao contrário dos valores anteriores para os
quais o prazer era encarado negativamente( como desperdício de tempo, recursos,
energias...), o consumidor actual é obrigado a gozar, a divertir-se para que a
economia se desenvolva.
É por isso, que para o
desenvolvimento da sociedade se tornou vital o aumento dos tempos de lazer, ócio,
na medida que os mesmo permitem aumentar as possibilidades de consumo de
inutilidades, de experiências que proporcionam a descoberta de novos prazeres
fundados no consumo.
1.4. A omnipresença da Diversão
Os consumidores ao passarem a ser
estimulados a consumirem em doses que ultrapassam as suas capacidades de
assimilação, buscaram o seu equilíbrio na diversão. Transformaram tudo num
divertimento familiar ou individual. Assistir a um espectáculo de ópera,
cinema, ler um romance, ouvir música, ou simplesmente consumir passou a
encarado no quadro mais amplo de opções de diversão, que se realizam em
qualquer momento não importa sequer a finalidade.
2. Diversão, Festa e Espectáculo
O conceito de diversão é dos
mais polissémicos da cultura contemporânea. As ideias básicas não são
novas, o que parece ser radicalmente novo é a dimensão integradora que a
diversão passou a assumir. Durante muito tempo, o conceito de diversão esteve
ligado apenas a ideia de divertimentos, como o jogo. Hoje, tende a ser encarado
como uma vivência global característica da sociedade de consumo.
As fronteiras entre a diversão,
as cerimónias, as festa e o espectáculo esbateram completamente.
2.1. Cerimónias
As cerimónias mediatizadas
,privadas ou publicas, sobretudo as políticas, fazem hoje parte integrante das
ofertas de diversão. As cerimónias públicas, entrecortadas por anúncios,
telejornais, entrevistas, estão ameaçadas no seu simbolismo pela banalização
que o "continunn" televisivo que transforma tudo em paródias.
2.2. A Festa
O conceito de festa ( lat. festa
dies, die de festa) é geralmente entendido como a manifestação de alegria
destinada a comemorar um acontecimento importante ou a celebrar um herói ou um
santo. Na festa a separação entre os actores e os participantes é ténua. A
Festa tem um caracter limitado no tempo, pressupõe uma intenção previamente
definida entre seus participantes. As festas populares, como os arraias ou
romarias, ilustram este conceito. Apesar destas características, as festas
podem constituir também momentos de diversão para os que nelas participam.
2.3. O espectáculo
No espectáculo a separação
entre os actores e o público é rígida, ainda que o público seja por vezes
chamado a participar. Neste sentido se distingue da festa. Como veremos, mesmo o
espectáculo erudito pode ser encarado como uma diversão para a maioria dos
seus espectadores.
Algumas teorias sobre o jogo,
tendem a encarar os espectáculos(teatrais, cinematográficos, televisivos,
desportivos, etc), como jogos por interpostas pessoas.
a) Permite o reconhecimento dos
limites do jogo na realidade. O espectador cria um ulterior ecran
projectivo contra as pulsões e as emoções que, vividas directamente, se
arriscariam a ser destrutivas. O espectáculo torna-se assim, um alargamento
dos limites do jogo.
b) Permite viver o próprio
jogo. A ficção, pressuposta de todo o jogo, torna-se dúplice no espectáculo:
Os espectadores identificam-se com os jogadores (...) e os jogadores com os
espectadores. Os jogadores imitam uma socieade que se reflecte nos eu jogo.
Dede modo, possibilita-se que o espectador entre em cena.
Certos mecanismos neste jogo,
como o aplauso, permitem não apenas um reforço da identificação entre o
jogador e o espectador, mas também afirmar a fronteira entre a ficção e a
realidade, "escaregando-se" a tensão desta relação.
2.4. Teorias sobre a Diversão
O conceito de diversão, é
como dissemos, dos mais difíceis de precisar, sobretudo porque é dificilmente
objectivável, na maioria das actividades.
Aristóteles
,
Poética,..encara a diversão como uma catarse, na qual os individuos se
libertavam dos seus temores. Montaign, Ensaios,II, afirma que a diversão
é uma forma de fugir ao isolamento. Blaise Pascal, Pensamentos, fala da
diversão como um processo de fuga aos infortúnios da vida e a infelicidade.
Nietzsche, A Vontade de Poder, apresenta os artistas como manipuladores
de emoções, excitações de pessoas insatisfeitas, procurando-lhes encher o vácuo
de uma existência vazia de sentido. Recentemente, Huizinga e Norbert Elias,
procuraram explicar o porquê da importância histórica que a diversão tem
vido a assumir nas nossas sociedades.
Procurando fazer uma síntese
deste conceitos, podemos afirmar que a diversão é indissociável, de
componentes como:
a) Actividades lúdicas
destinadas a proporcionar aos participantes a vivência ou experiência de emoções
que lhes dão prazer. Num nível menos imediato podem contribuir para aumentar
a auto-estima ou possibilitar a identificação imaginária com certos grupos
sociais ou culturais de referência. Um grande número das actuais diversões,
por exemplo, os jogos electrónicos, reproduzem situações imaginárias.
Outras, como as danças nas discotecas ou as "raves" limitam-se
apenas a criarem uma ambiência gradável para actividades grupais. A maioria
dos divertimentos fazem apelo, em graus variáveis, à destreza física,
capacidades individuais de desempenho, ou ainda a conhecimentos particulares
ou genéricos.
b) Actividade estimuladora de
posturas activas. Ao contrário dos espectáculos, os participantes são
impelidos a uma interacção física com os eventos, e a abandonarem atitudes
contemplativas substituindo-as por activas em função de dados cenários
comportamentais pre-estabelecidos.
c) Actividade de fuga ou escape
para os problemas quotidianos. Esta é a vertente mais referida pelos teóricos
actuais que analisam as actividades culturais. A diversão funcionaria como
uma espécie de entorpecimento voluntário, para esquecer a ausência de
sentido da vida ou a sua monotonia. Num célebre Inquérito, J. Dumazedier,
conclui que a maioria das pessoas iam ao cinema, numa pequena cidade de província
francesa, o faziam para se libertarem, isto é, para escaparem ao
"contexto familiar , romperem com a monotonia do dia-a-dia, esquecer o
tedioso, "arejar" as ideias. As preferências do público íam para
os filmes de distracção, com enredos simples, temáticas em torno do amor,
erotismo, luta, aventura ou simplesmente para provocarem o riso.
d) Actividade de recepção
primária. Um numero significativo de estudos tem posto em evidência o facto,
que a simples assistência a eventos de natureza erudita, não lhes retira a
componente de diversão. Para um público pouco preparado para determinadas
experiência estética, a sua recepção não passa de uma simples diversão
sem qualquer conteúdo específico.
e) Ruido. Os sons emitidos pela
rádio, as emissões de televisão, a música da aparelhagem, tudo pode
transforma-se numa espécie de ruído de fundo, que se ouve ou vê sem se
ouvir ou ver. Está lá apenas para preencher uma vazio qualquer, distrair...
3. A
Osmose Cultural
Produto da a sociedade de
consumo, as industrias culturais, alimentam esta cultura onde a diversão se
tornou numa componente essencial. Tudo passou a ser inserido numa ambiência
global de diversão, alimentado a curiosidade mais que o conhecimento, fazendo
recurso a jogos, festas, espectáculos, numa ausência completa de apelos a
atitudes de reflexão por parte dos participantes.
A cultura erudita, por exemplo,
tornou-se num agradável ruído de fundo, que pontualmente retém a atenção
dos consumidores, para logo de seguida desaparecer na profusão de novas
imagens ou novos produtos culturalizados.
As diferenças entre culturas
(cultura erudita, cultura popular, cultura de massas...), esbateram-se numa
panóplia de produtos cujas ligeiras diferenças, são agora significantes
para diferenciarem os vários grupos sociais.
4. A expansão das Industrias
Culturais
A expansão destas industrias
culturais está ligada a cinco movimentos de dimensão mundial.
Primeiro foram os orgãos de
comunicação de massas, que transportaram a qualquer ponto da terra, imagens,
sons e textos até há bem pouco tempo raras, ou apenas acessiveis a grupos
restritos.
Segundo foi a consumo de
massas, consagrado nos centros comerciais com as suas panóplias de produtos,
onde passaram a incluir, por exemplo, galerias de arte, livrarias, discotecas,
cinemas, teatros, fonotecas, artesanato...
Terceiro, ocorreu com a explosão
dos acessos domésticos aos bens culturais, nomeadamente com a difusão dos
aparelhos dos gira discos e dos gravadores (anos 60-70), e nos anos 80, do
video doméstico, jogos electrónicos, Cds, CD-Rom, televisão por satélite,
televisão por cabo, etc, uma panóplia de possibilidades que nivela todos os
produtos manuseados ou manipulados.
Quarto, com o incremento de
grandes áreas de diversão. Portugal acompanhou, neste caso, a movimento
internacional, sem grandes desfasamentos. As discotecas, bares, pubs, desde
então um forte crescimento, quer em número, quer em dimensão. Os grandes
espectáculos, sobretudo os de grupos de rock internacional, ensaiaram uma
mistura de música, dança, efeitos visuais, encenações colectivas dos
espectadores, que ultrapassam em muito o conceito tradicional de espectáculo,
e se inserem no âmbito dos divertimentos. As salas de jogos inundaram o país,
só recentemente adquiriram a dimensão de panóplia. Os jogos electrónicos
domésticos, com consolas ou em computadores, alteraram completamente a
capacidade dos jogos tradicionais de envolvimento dos participantes. Os últimos
apostam na criação de uma relação afectiva entre utilizador e a máquina.
O "Tamagotchi" que simula os hábitos de uma criança, exige uma
atenção permanente dos que o possuem.
Quinto, com a expansão de
grandes empreendimentos de diversão colectiva, como os parques temáticos que
constituem verdadeiros paraísos de uma eterna e sempre renovada diversão,
sublimando os próprios centros comerciais. O Centro Comercial Colombo
insere-se nesta linha.
5. As Cidades de Diversão
A criação de parques temáticos,
como os da Disney nos EUA, foram o inicio da criação de grandes cidades a
diversão, onde se pode sentir todas as emoções, viver todas as situações
a fingir.