I. Mudança de regime
A monarquia em Portugal não caiu
devido à força das ideias republicanas, mas ao descalabro do próprio regime
monárquico.
- Monarquia
Constitucional. O regime
constitucionalista implantado em 1834, não apenas limitou o poder dos
reis, mas desarticulou o que restava do poder das grandes famílias
nobres. Esta situação nunca foi aceite pela Casa Real. Os reis através de
diversas manobras palacianas procuraram controlar os partidos monárquicos,
formando e destituindo governos. Uma prática que contribuiu e muito para o
descrédito do regime monárquico.
- Rotativismo
e corrupção. Os dois
principais partidos monárquicos - o Regenerador e o Progressista -, assentes no
Erário Público, no caciquismo e na corrupção dominavam a política em
Portugal.
Não eram apenas os casos da
grande corrupção minavam o regime, como os que envolviam os caminhos de ferro,
os tabacos, as obras do porto de Lisboa ou o crédito, mas também a pequena
corrupção proliferava pelo Estado e as autarquias.
O orçamento da Casa Real fora
estabelecido no reinado de D.Maria II, com o tempo tornou-se manifestamente
insuficiente. A fim de levantar polémica, a solução que o monárquicos
arranjar foi dar à Casa Real sucessivos Aditamentos. Em 1907, as dívidas
acumuladas destes Adiantamento correspondiam a cerca de metade do orçamento do
próprio Estado. O escandalo foi enorme.
Na última fase do regime os
partidos monárquicos, registavam permanentes convulsões e cisões internas. A
única ideia política consensual era a do "bota abaixo !".
Enquanto isto acontecia, a situação
económica do país piorava ano após ano, obrigando a emigrar centenas de
milhares de portugueses.
- Exemplo
brasileiro. A republica
francesa foi sempre a principal fonte de inspiração dos republicanos
portugueses, mas o fim da monarquia no Brasil, em 1889, que terminou ali
com dinastia dos braganças, produziu um profundo impacto em Portugal. Muitos
eram os que passaram a apontar o Brasil como o exemplo político a seguir.
Coincidência ou talvez não, o
certo é que os republicanos resolveram marcar a data da implantação da república
para a altura em que o presidente da república do Brasil (marechal Hernes da
Fonseca) passava por Portugal.
- A
questão colonial. Desde
1415 a história de Portugal estava intimamente ligada à existência de domínios
além-mar. O comportamento de João VI, entre 1807 e 1820, abandonando o país,
foi o inicio do descrédito da dinastia de Bragança. A independência do
Brasil, em 1822, acentuou esta tendência. Apesar disto, eram muitos poucos os
que em meados do século XIX advogavam o fim da Monarquia. A situação mudou
quando por volta de 1890, as diversas potências europeias resolveram-se na
repartição entre si do continente africano. Portugal reclamava os territórios
entre Angola e Moçambique (Mapa Cor de Rosa), mas a Inglaterra, histórica
aliado de Portugal, defendeu que os territórios eram seus e exigiu a retirada
dos portugueses (11/01/1890), o que foi prontamente acatado pelo governo monárquico.
Aos olhos da população, a dinastia de Bragança, revelou a sua total
incapacidade para defender os interesses coloniais de Portugal.
O descontentamento foi de
imediato aproveitado pelos republicanos. É neste contexto que ocorre, a
frustrada revolta republicana a 31 de Janeiro de 1891 no Porto, que
pretendeu acabar com a monarquia em Portugal. A resposta dos partidos monárquicos
foi a de instalar uma ditadura entre 1894 a 1896. A monarquia passou a ser
associada não apenas à corrupção e à venda de Portugal aos estrangeiros,
mas também à ditadura.
- Descrédito
da Família Real.
D. Carlos, notável artista e cientista, nunca conseguiu tornar-se um rei
popular. Os únicos êxitos que obteve era como anfitrião na cena
internacional. Lisboa, tornou-se no seu reinado, numa das capitais mais
visitadas por chefes de Estado de todo o mundo (Imperador da Alemanha, Eduardo
VII e Alexandra de Inglaterra, Afonso XIII de Espanha, Presidente da França, do
Brasil, etc), sendo os mais bem acolhidos pela população, os presidentes de
repúblicas !
- Violência
política. A
incapacidade dos governos monárquicos para acabar com a corrupção, geraram
uma crescente onda de contestação por parte das populações urbanas de Lisboa
e Porto. Como resposta procuraram calar a oposição, aumentando a repressão e
o controlo da imprensa.
O rei Carlos, em Abril de
1907, dissolve o parlamento e entrega o poder a João Franco, dirigente do
recém-fundado Partido Liberal.
Esta medida estimulou a oposição urbana de Lisboa,
liderada por anarquistas e republicanos a derrubar o regime monárquico.
D. Carlos e o principe Luis Filipe são abatidos a tiro a 1 de Fevereiro de 1908
no Terreiro do Paço, quando regressavam de Vila Viçosa. A população acorreu
em massa ao enterro dos regicidas, ignorando por completo os funerais do rei e
principe assassinados. Um facto revelador do estado de decadência a que havia
chegado o regime monárquico, e o descrédito que haviam atingido na população.
O seu fim estava traçado.
Nas eleições de 5 de Abril de
1908, os republicanos conseguiram em Lisboa uma vitória estrondosa. A reacção
do governo foi brutal: 14 pessoas foram assassinadas no centro da cidade.
Mercê de uma aliança entre
anarquistas e republicanos, o operariado, envolveu-se directamente no derrube da
Monarquia, depositando num novo regime as suas esperanças de melhoria das condições
de vida. As greves tornaram-se cada vez mais frequentes, assim como a sua
violenta repressão por parte do governo.
II. Implantação
O derrube da monarquia, iniciado
na madrugada do dia 4 de Outubro de 1910, é o resultado da acção de um
bando de conspiradores da carbonária portuguesa (fundada em 1896),
envolvendo anarquistas e republicanos, chefiados por um tenente da marinha - Machado
dos Santos.
A implantação da República no
país é revelador do estado de decrepitude atingido pela monarquia, que já nem
aos próprios monárquicos convencia. Muitos poucos foram aqueles se mostraram
no momento dispostos a defendê-la. Paiva Couceiro foi dos raros a fazê-lo.
O Partido Republicano só
se envolveu verdadeiramente na acção da carbonária, quando ao fim da tarde do
dia 4 de Outubro, se apercebeu que esta desmoronara o que resta da monarquia, e
na manhã do dia seguinte apressou-se a tirar partido da situação, proclamando
a República na varanda dos Paços do Concelho de Lisboa. É desta forma que
termina em Portugal um regime com cerca de sete séculos, mas que no último se
arrastava moribundo. Ao todo morrem nesta acção 76 pessoas, sendo
apenas 15 militares. Os conflitos armados posteriores entre republicanos
matarão muitíssimo mais pessoas.
III. 16 Anos Turbulentos
Os grandes inimigos da 1ª.
república foram os republicanos, a começar por aquelas que a implantaram. Á
frente de bandos de arruaceiros e de damagogos, com o apoio de militares, foram
os primeiros a lançar num caos o novo regime.
- Eternos Conspiradores.
Um dos passatempos preferidos dos republicanos eram conspirarem para derrubarem
governos ou envolverem-se em confrontos físicos com os seus adversários.
Machado dos Santos,
o fundador da República, foi o exemplo paradigmático deste comportamento político.
Após a implantação da República foi um permanente conspirador, sempre
envolvido em golpes de estado e matanças até que foi assassinado na
noite de 19 de Outubro de 1921, com dezenas de destacados políticos
republicanos.
- A
questão Religiosa.
Assumindo-se como herdeiros dos jacobinos de 1789, os republicanos mal chegaram
ao poder, iniciaram uma perseguição sistemática à Igreja Católica, de forma
a eliminar a sua influência social: expulsão dos jesuitas, extinção das
ordens religiosas, proibição da Igreja criar associações educativas e
assistenciais, fim das missões católicas em África, fim das manifestações
exteriores religiosas, anulação da validade jurídica dos casamentos
religiosos, expulsão dos bispos das dioceses durante dois anos (1911), etc.. Foi
a guerra aberta entre o Estado e a Igreja.
Afonso Costa o paladino da
luta anti-clerical, prometeu erradicar o catolicismo de Portugal em duas gerações.
A liberdade religiosa tornou-se uma miragem. Em apenas dois anos os republicanos
dividiram a sociedade portuguesa, passando a ter contra si a maioria da população.
É neste ambiente que entre Maio
e Outubro de 1917 ocorrem as célebres aparições de Fátima,
transformadas rapidamente numa poderosa manifestação de resistência católica
à propaganda anti-clerical. As crianças que alegadamente viram uma
"senhora" tornaram-se os símbolos das vítimas da intolerância
republicana, e mais tarde a única sobrevivente (Lúcia) a promotora da cruzada
anti-comunista a nível mundial.
- Monárquicos.
Os monárquicos não tardaram a aproveitarem-se do descontentamento da população,
organizando incursões e revoltas militares para tentarem restaurar a monarquia.
O exílio forçado de pessoas de convicções monárquicas, entre as quais se
contavam muitos polícias, padres e destacados militares, engrossou naturalmente
as forças hostis ao novo regime. Paiva Couceiro, demitido do exército
em 1911, comanda as incursões monárquicas de 1911, 1912 e 1914. A sua mais
expressiva acção ocorreu em 1919 quando se auto-proclamou presidente da Junta
Governativa do Reino, na chamada Monarquia do Norte (1919), que quase derrubou a
república.
Não está feita a contabilidade
do número de mortes destas incursões monárquicas, apoiadas pelo estado
espanhol e o Vaticano (Santa Sé).
O recurso sistemático à força
passou a ser a única forma para manter o novo regime. Os atentados a tiro
ou a bomba entraram no quotidiano dos portugueses. Esta era a forma preferida
para eliminar vozes incómodas ou resolver assuntos de Estado.
- Governos.
Os constantes atentados à bomba, conspirações e golpes militares, produziram
uma incrível sucessão de governos. Durante os 16 anos que durou a 1º. República,
o país conheceu 45 governos, fora os indigitados !
No período entre 1910 e 1917
predominaram governos radicais do Partido Democrático, controlados por Afonso
Costa, no período seguinte, sucederam-se governos conservadores que prepararam
as condições para a emergência de uma ditadura.
Os próprios presidentes da república,
sete no total, sofriam da mesma instabilidade dos governos. Em 16 anos, apenas
um único cumpriu integralmente o seu mandato.
- Partidocracia.
O regime republicano montou um sistema político que procurava perpetuar o poder
de um único partido - o Partido Democrático, herdeiro do antigo Partido
Republicano.
As leis eleitorais republicanas
limitaram drasticamente o direito de voto da maioria da população. Em 1913,
por exemplo, apenas 10% da população total estava representada, e 30% dos
homens. Entre 1913 e 1925 o número de eleitores variou entre 397.038 e 574.206.
O sufrágio universal nunca foi aceite pelos republicanos que desconfiavam da
população, em particular dos analfabetos (70%) e das mulheres.
O número de cidadãos que
podia votar durante a República foi sempre muito inferior ao registado durante
a monarquia.
O parlamento dominado pelo
Partido Democrático, não podia ser dissolvido, podendo aprovar as leis que
queria sem qualquer controlo. O único meio para mudar de um governo era
frequentemente através de golpes militares, um expediente que acabou por se
banalizar. 24 governos foram derrubados por revoluções populares e golpes
militares.
O Partido Democrática, não
tardou a recorrer à violência política e à censura para impor o seu poder,
num ambiente político que lhe era hostil. Neste sentido criou bandos de
assassinos conhecidos por "Formiga Branca", que se
tornaram tristemente célebres por perseguirem e assassinarem opositores políticos,
jornalistas e sindicalistas. Em resposta, os outros partidos políticos,
organizaram os seus próprios bandos de arruaceiros para lincharem os seus
opositores à bengalada, tiro ou à bomba.
Os trabalhadores de Lisboa que
haviam sido decisivos para a implantação da República em 1910, são dos
primeiros a serem assassinados quando persistiram a reclamar por melhores condições
de vida. Os governos
republicanos queriam-nos obedientes.
A ruptura ocorreu durante a Greve
Geral de Janeiro de 1912, quando o governo de Afonso Costa, abre as
hostilidades mandando prender e reprimir de forma brutal os grevistas e os
dirigentes sindicais. A partir daqui a guerra estava declarada entre os
trabalhadores e a República.
A defesa militar do novo regime
era assegurada por três "organizações" que estiveram envolvidas em
inúmeras matanças:
- Os "batalhões de
voluntários" e os "Grupos de Vigilância Social",
bandos de rufias e cadastrados que sob o pretexto de defenderem a
República dos monárquicos e dos padres, a sua principal especialidade eram os
atentados e o roubo da população.
- "Guarda Nacional
Republicana", um corpo de polícias militarizado supostamente
defensores do novo regime, mas que na prática constituía o braço armado do
Partido Democrático contra a população e os militares. Andou permanentemente
envolvida em golpes de estado e sangrentos atentados, como o que ocorreu a 19 de
Outubro de 1921. Os governos republicanos depois deste acontecimento reduziram
bastante o seu poder.
- Parlamento.
A casa da democracia portuguesa durante os 16 anos da 1ª. República andou em
contínuas convulsões. Foi uma das causas do caos em que o regime mergulhou. A
vida do país era controlada pelo parlamento que nomeava o presidente da república
e o governo. Em 1911 era constituído por 234 deputados, em 1913 por 156 e
depois de 1915 por 163.
As oito eleições legislativas
que se realizaram durante 16 anos foram uma autêntica farsa. As leis eleitorais
estavam feitas para garantirem a vitória de um único partido - o Partido
Democrata -, cujos resultados eram em regra esmagadores.
A demagogia e a retórica vazia
imperavam no parlamento, mas as verdadeiras decisões políticas eram tomadas na
rua, nos quarteis e nas sociedades secretas.
- Ditaduras.
O descalabro dos governos republicanos, levaram-nos a instaurarem sanguinárias
ditaduras que não tardaram a colocar o país a ferro e fogo: ditadura de Pimenta
de Castro (1915), Sidónio Pais (1917-1918). A partir de 1917,
assustados com o rumo que o regime estava a tomar, um número crescente de
republicanos passou a defender a instauração de um ditadura, seguindo a tendência
de vários países europeus.
- Sociedades
Secretas. A
maçonaria durante o grão-mestrado de Magalhães Lima (1908-1928)
colocou-se abertamente ao serviço da causa republicana. O descalabro da
republica não tardou em provocar cisões internas no Grande Oriente Lusitano
Unido. Através de estratégias secretas
procurou controlar a situação política no país, o que se revelou numa
nefasta ilusão. Acusada de andar envolvida em contínuas conspirações, vários
foram os governos republicanos que assaltaram as suas sedes, perseguiram,
prenderem ou mataram os seus membros. Magalhães Lima será uma das vítimas
destas perseguições.
- Grande
Guerra. A intervenção
de Portugal durante a 1ª. Guerra Mundial (1914-1918), sob o pretexto de
defender as suas colónias em África ameaçadas pela Alemanha, agravou a situação
social e económica. O país viveu num clima de pré-guerra civil, centenas de
pessoas foram assassinadas.
O Corpo Expedicionário
Português, acabou vergonhosamente abandonado nos campos de batalha pelo
governo, espelhando o profundo caos em que a 1ª. Republica se havia tornado. Ao
todo 35 mil portugueses morreram, regressaram a casa com ferimentos ou foram
feitos prisioneiros.
Como uma desgraça nunca vêm só,
em Maio de 1918, declara-se em Portugal a Gripe Espanhola (Pneumónica)
que vitimou cerca de 120 mil pessoas num ano.
A participação na Guerra
implicou uma mudança profunda na organização das forças armadas e no aumento
do número dos seus efectivos. Após ter findado Portugal passou a dispor de um
novo corpo militar, treinado e consciente da sua força que não tardou em usá-la.
A partir de 1923 os militares
passaram conspirarem em nome do próprio exército, e não em apoio a um
partido. Em 1926 derrubaram o que restava da República instaurando uma Ditadura
Militar.
- Corrupção.
Durante a Monarquia os republicanos reclamaram por justiça no combate à corrupção
e ao caciquismo. Implantada a República esqueceram-se rapidamente dos casos que
haviam denunciado e começaram a fazer aquilo que antes condenavam.
As páginas dos jornais durante a
República continuaram repletas de casos de corrupção e de relatos de uma
justiça ineficaz e incompetente no combate à criminalidade. É neste período
que actua um dos célebres ladrões de todos os tempos - Alves dos Reis.
IV. Educação
Durante a monarquia os
republicanos tornaram-se os arautos da difusão ensino, como um meio de libertação
social de um regime opressivo dominado pela realeza e a Igreja. Em 1911 o
analfabetismo atingia 70% da população com mais de 7 anos.
Nos dois primeiros anos após a
implantação da República, mostraram alguma coerência com as ideias que antes
defendiam. O número de escolas estatais subiu de 5.552 no ano lectivo de
1909/10 para 6.412 no ano lectivo de 1911/12. A verdade é que em 1913, a
sua paixão pela educação estava esgotada, centenas destas novas escolas nunca
funcionaram ou foram fechadas. Os investimentos na educação começaram a
diminuir de forma drástica. Em 1926 existiam no papel apenas 7.114 escolas
estatais.
As escolas durante a República
tornaram-se em verdadeiros centros de propaganda do regime e do Partido Democrático.
Em 1926 foi com surpresa que se
constou que havia mais analfabetos em Portugal do que em 1910, devido ao aumento
da população.
A grande obra educativa da República
centrou-se em torno de casos exemplares que foram largamente publicitados: a Escola
Oficina Nº. 1, em Lisboa, obra da maçonaria e do movimento anarquista; as
Universidades Populares e as reformas do ensino superior.
V. Colónias
A propaganda republicana acusava
os vários governos monárquicos, não apenas de incompetência na gestão das
colónias, assim também de subordinação aos interesses estrangeiros, em
particular aos ingleses.
Após a implantação da República,
revelaram-se um completo falhanço neste domínio, tendo prosseguido com a mesma
política colonial, assente no proteccionismo mercantilista, trabalho forçado,
diminutos investimentos públicos e subordinação a interesses estrangeiros, em
particular aos ingleses.
A única nota positiva foi a acção
de Norton de Matos em Angola. Enquanto governador-geral (1912-1915)
e depois como Alto-Comissário (1921-1924), que procurou impor o trabalho
assalariado, generalizar o uso da moeda, facilitar o acesso ao crédito,
promover o desenvolvimento local assente na agricultura, diversificar as produções,
e permitir uma maior mobilidade social na população branca e indígena. A
verdade é os governos republicanos, não discordaram destas ideias, mas boicotaram-nas de forma sistemática.
Um dos maiores falhanços da 1ª.
república foi a desarticulação das missões católicas nas colónias,
sob o pretexto de as virem as virem a substituir por missões laicas. A
verdade é que nunca o fizeram, limitando-se a combater neste domínio o
catolicismo, abrindo o terreno às missões protestantes.
Os demagogos que dirigiram a
primeira república, sustentaram a intervenção na 1ª. Guerra Mundial
(1914-1918), sob o pretexto de defenderem as colónias em África. É certo que
os alemães, em 1914, haviam atacado o norte de Moçambique (posto de Maziua) e
o sul de Angola (Naulila, fortaleza de Cuangar, etc). A verdade é os soldados
foram atirados para os campos de batalha na Europa e em África, sendo
progressivamente abandonados à sua sorte.
A política republicana para as
colónias revelou-se ao longo dos 16 anos um completo falhanço que envergonhava
o próprio regime.
VI. Emigração
A balbúrdia que reinava no país
desde o inicio do século XIX e que se agravou durante a República fez disparar
a desconfiança quando ao seu futuro. É neste período que ocorre uma das
maiores vagas de emigração de todos os tempos, só tendo paralelo com a que
ocorreu nos anos 60 do século XX. Entre 1900 e 1930 mais de um milhão de
portugueses emigraram para o Brasil e os EUA. Entre 1910 e 1914 mais de 300 mil
portugueses foram para o Brasil. A república, como a monarquia nada lhes
dizia.
VII. Grandezas e Misérias da
República
A propaganda republicana afirmava
a superioridade da República no campo dos princípios, não apenas por
alegadamente garantir a liberdade, mas também por defender a igualdade entre
todos os homens. Em pouco tempo, os factos desmentiram a propaganda. A 1ª. república
revelou-se um regime avesso á democracia, anulando importantes avanços
verificados desde 1820 no sentido do sufrágio universal.
A primeira república (1910-1926)
foi tudo menos um exemplo de democraticidade. O debate politico foi substituído
pela ameaça e a violência. Milhares de cidadãos foram mortos por bandos ao
serviço dos vários partidos republicanos.
Após a noite sangrenta de 1921,
o fim da República estava traçado. Um número crescente de republicanos, como
dissemos, passou a defender uma solução ditatorial para o regime. A ditadura,
afirmavam, era a única forma de governo susceptível de salvar a "nação".
O jornal O Século, um dos
orgãos históricos do republicanismo português, tornou-se num dos mais activos
propagandistas da necessidade da instauração de uma ditadura nacional. Este
jornal esteve directamente envolvido no golpe militar frustrado de 1925, mas
também no vitorioso de 28 de Maio de 1926. Foi depois um dos baluartes da
propaganda do Ditadura Militar (1926-1933) e do Estado Novo salazarista.
Nos anos vinte os republicanos
esqueceram-se dos conflitos com a Igreja católica, mas também da questão da
defesa das "liberdades". O seu ideário político resumia-se a uma
ideia: salvar a nação através de uma ditadura, assente no culto da pátria e
da autoridade. A chegada de Salazar ao poder (1929) é recebida com agrado pela
maioria dos republicanos, nomeadamente os maçónicos.
Com excepção dos anarquistas,
muito poucos foram os republicanos que reagiram ao golpe militar de 1926, a
maioria já então se revelava admiradora de ditadores como Mussolini. As
revoltas de 1927 e outras que lhe seguiram promovidas por republicanos (reviralho),
foram sempre muito circunscritas e encaradas pela população com
distanciamento.
Tendo preparado o caminho para a
longa ditadura (1926-1974), os republicanos viram a sua obra durante 16 anos
alcunhada de "balbúrdia" pela ditadura que nunca lhes reconheceu a
paternidade.
VII. Comemorar o quê ?
As comemorações que estão em
curso do centenário da República, têm consistido numa vergonhosa operação
de branqueamento da 1ª. República.
Estão a branquear os crimes que
foram cometidos contra os trabalhadores, em particular os sindicalistas, que
estiveram na linha da frente pela implantação da República.
Estão a branquear o seu carácter
anti-democrático, nomeadamente a exclusão da esmagadora maioria da população
dos actos eleitorais.
Estão a branquear a forma como
os próprios republicanos prepararam a população para aceitação de uma
ditadura e depois a implantaram.
Estão a branquear demagogos como
Afonso Costa e António José de Almeida que conduziram o país para um desastre
colectivo.
Carlos Fontes
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