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Marcos
Históricos da Cidadania em Portugal - I
(
Direitos Políticos) | A
ideia que todos os cidadãos possuem os mesmos direitos foi a bandeira dos
liberais na sua luta contra os regimes absolutistas. Os liberais no século
XVIII, assumiram-na como um princípio essencial da própria cidadania,
propondo-se estabelecer regimes constitucionais que garantissem os
direitos individuais, assim como a transferência do poder do monarca para
a colectividade ( ou para grupos sociais em condições de falar em nome
de todos). Instaurou-se desta forma os governos representativos,
legitimados periodicamente através de eleições.
A verdade é que mal
conquistavam o poder, começavam de imediato a estabelecer restrições
aos direitos políticos dos cidadãos. Quem tinha direito de votar?
A partida nem todos os homens e mulheres. As limitações do sufrágio
eram várias, destacando-se as seguintes:
- Os cidadãos tinham
que ter certos rendimentos ( sufrágio censitário);
- Os cidadão tinham que
ser do sexo masculino (sufrágio sexual);
- Os cidadãos não podiam
ser analfabetos (sufrágio capacitário);
- Os cidadãos tinham que
ter uma idade superior à maioridade legal (sufrágio etário).
Neste panorama o sufrágio
universal era uma pura miragem. A esmagadora maioria dos eleitores nos países
europeus não participava na escolha dos deputados, muito menos dos
governos. O século XIX e XIX foi marcado por este problema de fundo: a
pouca representatividade dos políticos. As limitações impostas à
consulta dos cidadãos era um dos expedientes então usados para se
manterem no poder. Portugal não é excepção a este respeito, confirma
aliás a regra.
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Portugal
1820- 1910: Liberais e
Absolutistas. Monarquia Liberal
Á semelhança do que
acontecia em outros países europeus, a questão da igualdade de direitos,
é o grande argumento dos liberais na sua luta contra o absolutismo.
A revolução liberal de
1820 (24 de Agosto no Porto e 15 de Setembro em Lisboa), constitui um
marco na história da cidadania em Portugal. As promessas dos liberais
rapidamente se tornaram numa desilusão. Nas eleições de Dezembro de
1820 para a elaboração de um nova constituição, é desde logo adoptado
um sistema eleitoral indirecto: o "povo" escolhia os eleitores e
estes depois escolhiam os deputados. A esmagadora maioria da população
foi excluída deste sufrágio: mulheres, pessoas com poucos rendimentos,
etc. Apenas um pequeno grupo de cidadãos podia ser eleito deputado. A
Constituição aprovada 1822 estava longe de reflectir a composição da
sociedade portuguesa. A falta de representatividade do novo regime
acaba por ser explorada pelos absolutistas, conduzindo o país para uma
guerra civil (1828-1834).
O comum dos cidadãos
sentia-se defraudado com a organização política do país e não se
identificava com os seus representantes. É neste contexto que em 1826,
D. Pedro IV, autorga uma Carta Constitucional à semelhança do que
ocorrera em França e no Brasil. A Carta que reforça as restrições
anteriores irá manter-se até ao fim da monarquia, em 1910, embora com várias
modificações. Facto que acabará por conduzir ao crescente descrédito
do próprio regime monárquico.
Entre as alterações
introduzidas no regulamento das eleições, destaca-se as de 1852,
consagrando-se o princípios do parlamentarismo. As eleições continuavam
a ser indirectas e muito restritivas. Os que podiam ser eleitos deputados
deveriam ter uma renda anual mínima de 400$00 réis, o que para o tempo
era uma soma considerável.
Registou-se na segunda
metade do século XIX, um número crescente de eleitores
recenseados: em 1864 era inferior a 10% da população total, subindo para
18% em 1878 e atingindo o valor mais alto durante a monarquia 1890, com
19%. Mas por volta de 1910, quando a influência republicana era
significativa, este valor andava à volta de 11%. O número dos exerciam o
seu direito de voto muitíssimo inferior. Por todas estas razões
compreende-se a quase nula representatividade das Cortes (Parlamento) e
dos sucessivos governos monárquicos. Este facto impulsionou o Partido
Republicano, que defendia o sufrágio universal.
Os partidos políticos que
se formaram ao longo do século XIX, com excepção do Partido Republicano
e do Partido Socialista, eram todos monárquicos. Os principais partidos
eram verdadeiras máquinas clientelares, alternando-se no poder até ao
fim do regime. . |
1910-1926:
1ª. República A implantação da República
a 5 de Outubro de 1910, representou uma grande esperança na instauração
de um regime amplamente participado. Recorde-se que os republicanos haviam
denunciado vezes sem conta as fraudes e manobras eleitorais dos partidos
monárquicos, atribuindo aos mesmos o afastamento da maioria da população
do exercício da cidadania. Com a implantação da República estava nas
suas mãos alterar o sistema tornado-o mais democrático.
A lei eleitoral
republicana, aprovada a 14 de Maio de 1911, constituiu uma enorme desilusão,
pois limitava ainda mais a participação dos cidadãos na vida política.
A lei conferia o voto apenas aos cidadãos maiores de 21 anos que
soubessem ler e escrever ou que fossem chefes de família há mais de um
ano. O código eleitoral de 1913, excluía do direito de voto os chefes de
família analfabetos e os militares no activo. Durante a ditadura de Sidónio
Pais (1918), os analfabetos voltaram a poder votar. Finda a ditadura
voltaram a ser excluídos.
O colégio eleitoral da 1ª.
República era limitadíssimo, sendo mesmo inferior ao existente na
monarquia Em 1910 haviam 850 mil eleitores recenseados, em
1913 apenas 400 mil. O número subiu para 471 em 1915, até atingir um
total de 574.280 eleitores em 1925 (Em 1890, recorde-se, haviam sido
recenseados 900 mil eleitores ). Para agravar esta situação, a abstenção
era elevadíssima (40% em 1915. 30% em 1925).
Instalados no poder, os
republicanos passaram a combater o próprio sufrágio universal,
continuando a negar o direito de voto às mulheres. O sistema eleitoral
criado pelo Partido Republicano servia apenas para manter no poder as suas
clientelas partidárias.
Durante 16 anos, os
republicanos impediram sob diversas formas o aumento da participação cívica
da população portuguesa. Facto que acabou por minar a sua base social de
apoio, dado que muito poucos eram os que se sentiam representados no
Parlamento ou no Governo, contribuindo para popularizar os regimes
ditatoriais. A 1ª República, como já havia acontecido com a Monarquia,
cavou o seu próprio fim ao afastar-se dos cidadãos.
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| 1926-1974:
Ditadura ( 2ª. República )
A Ditadura que é
implantada, na sequência de um golpe militar a 28 de Maio de 1926, não
tardou a explorar a questão do sufrágio universal como uma forma de
legitimação. A sua medida mais significativa ocorreu em 1931, quando de
forma mitigada foi concedido pela primeira vez o direito de voto às
mulheres. Em 1946 e 1968A acabou com alguns restrições ao direito de
votos às mulheres .
É curioso constatar
que muitas das práticas actuais usadas nos actos eleitorais tenham sido
criadas durante a ditadura. Algo semelhante ocorreu no Brasil, durante a
ditadura de Getúlio Vargas.
As eleições durante a
ditadura (autárquicas, legislativas e presidenciais) eram contudo, uma
verdadeira farsa, dada a sua total manipulação. A ditadura condicionava
não apenas a apresentação das listas dos candidatos da Oposição, mas
também falseava os próprios resultados eleitorais. O número de
eleitores recenseados continuou muito baixo
No dia 25 de Abril de 1974,
a ditadura caiu sem qualquer base de apoio. Muito poucos foram os que saíram
à rua para a defender, com excepção dos esbirros da polícia política.
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1974-2005:
3ª. República
O regresso à Democracia,
em Abril de 1974, foi marcado, em 1975, por uma nova lei eleitoral que
consagrava sem restrições o sufrágio universal.
Trinta e um anos depois, o
sistema político português continua a revela graves problemas em termos
de representatividade democrática. Continua a predominar no Estado
português, uma cultura anti-democrática com séculos de existência, e
que serviu para sustentar ideologicamente um vasto império colonial, mas
também para justificar a exploração da população em nome do interesse
nacional (consultar).
Os sucessivos governos democráticos, desde 1974, quase sempre muito frágeis,
nunca conseguiram romper com esta cultura. O resultado foi o reforço de
uma estrutura política que não visa servir a população, mas manter os
grupos privilegiados que dela se alimentam. Os contribuintes são
sobrecarregados de impostos para pagar estruturas perdulárias e
ineficazes na educação, saúde, justiça, autarquias, etc. Esta é
uma das razões porque a abstenção não pára de aumentar, minando os
fundamentos do próprio regime. Problemas que tem sido apontados:
1. Partidos
Fechados aos Cidadãos.
Os partidos políticos, teoricamente expressões organizadas das correntes
de opinião existentes numa sociedade, cabendo-lhes, entre outras coisas,
escolherem, apresentarem e promoverem um conjunto de candidatos sobre os
quais os cidadãos se prenunciam através do voto. Acontece que os
partidos se tornaram com o tempo em estruturas fechadas aos próprios
cidadãos, funcionando segundo lógicas e interesses que neles predominam,
olhando com crescente desconfiança para tudo o que lhes é exterior. As
únicas ocasiões que se mostram mais abertos aos cidadãos é quando são
confrontados com importantes quebras no número de votantes. Ora como não
há democracia sem partidos, a maioria dos cidadãos acaba por se sentir
profundamente condicionada na sua participação cívica pelos partidos
que os representam. Este facto acaba por contribuir para o afastamento dos
cidadãos da política.
2.Deputados Dependentes.
A maioria dos deputados são figuras completamente desconhecidas da população
e sem qualquer ligação com os cidadãos. Escolhidos pelos respectivos
partidos, de acordo com as suas lógicas internas de poder, revelam uma
completa falta de independência. Muitos nunca fizeram outra coisa na vida
senão trabalhar para o partido, do qual dependente para poderem
subsistir. Um dos melhores exemplos das consequências desta situação,
está bem patente na forma como são usados nas próprias eleições.
Muitos apresentam-se às mesmas como candidatos, mas depois por conveniências
do próprio partido são obrigados a abandonar os cargos para os quais
foram eleitos, num total desprezo pelos próprios eleitores .
3. Ausência de
Princípios Éticos.
Tornou-se normal ver membros do governo aparecerem com contas nos Bancos
da Suiça, envolvidos no tráfico de influências ou a beneficiarem
familares ou amigos. É também normal ver-se deputados servirem-se do seu
estatuto de imunidade para se furtarem a prestar contas à justiça.
Muitos foram já apontados como estando envolvidos em apropriações ilícitas
no próprio parlamento (viagens fantasmas, etc). Outros aparecem
ligados a interesses estrangeiros. Estas situações acabaram por se
repercutirem em toda a máquina do Estado, onde se tornou corrente
verem-se altos funcionários servirem-se da sua posição para obterem
privilégios especiais. Os princípios básicos de um regime democrático,
como a igualdade, imparcialidade e transparência da coisa pública são
desta forma esquecidos por aqueles que deviam de ser os seus garantes. A
impunidade é total.
4.Corrupção nas
Autarquias. A situação
política em muitas autarquias ultrapassa tudo o que é admissível num
regime democrático. É hoje normalíssimo verem-se autarcas a usarem da
coisa pública par seu benefício pessoal ou dos seus amigos. Exemplo: a
acumulação de vencimentos em empresas municipais que eles próprios
criarem. É "assustador" o número dos autarcas que estão
envolvidos em casos de corrupção. Factos que revelam a ausência de um
verdadeiro sistema de vigilância e controlo das autarquias, nomeadamente
por parte dos cidadãos.
6. Mandatos vitalícios.
O regime constitucional consagrado em 1976, apenas limitava os mandatos
dos presidentes da república. O resultado foi que os cargos políticos se
tenham eternizado nas autarquias, nos governos regionais e até no
parlamento. Bandos de políticos incompetentes instalaram-se no Estado apoiados em
vastas redes de cumplicidades e interesses obscuros.
7. Democracia Limitada.
Na organização política de Portugal, continuam a existir inúmeros
cargos de enorme relevância política, como os governadores civis, cujos
detentores não são eleitos.
Ao longo de trinta e um
anos de democracia muito poucas iniciativas tem sido tomadas para aumentar
a participação dos cidadãos na vida política. Estas enormes deficiências
do sistema político português, acabam por traduzir-se num enorme descrédito
de muitas das instituições públicas, com as quais os cidadãos se
sentem pouco ou nada identificados. O Parlamento, por exemplo, surge em
todas as sondagens com uma apreciação sempre negativa. É evidente que a
culpa deste estado de coisas não é apenas dos políticos, mas também
dos cidadãos que ao demitirem-se da República apenas favorecem a
mediocridade, a incompetência e a corrupção.
|
Carlos
Fontes |
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