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História da Formação Profissional e da Educação em Portugal

Carlos Fontes

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Idade Contemporânea - (Séc.XIX)

Instrução Pública

As ideias liberais, no século XIX,  apelava a uma ampla instrução da população. Segundo os pressupostos ideológicos que o sustentava, a instrução dos povos seria a melhor defesa do regime democrático e a condição para o próprio progresso do país. 

A questão da Instrução publica foi um tema que suscitou um profundo debate durante na preparação da Constituição de 1822, onde a necessidade da difusão da instrução publica registou um largo consenso[1]. As escolas públicas eram concebidas como veículos das ideias liberais, e a condição de sobrevivência do próprio regime liberal. Ainda em 1854, escreviam os lentes da Academia Politécnica do Porto:

" A Revolução Política, a inauguração do novo regime governamental acarretavam consigo necessariamente uma revolução no sistema da instrução, a reforma nos estabelecimentos destinados a dá-la, e a criação de outros novos; porque m sistema de governo qualquer não pode ter estabilidade enquanto não assenta sobre a vontade e a opinião dos governados, e particularmente o sistema liberal nunca passará de uma grande mentira enquanto assentar no seio de um povo ignorante e desmoralizado" (8).

A abordagem desta questão reveste-se contudo de algumas particularidades que é necessário clarificar, para podermos entender a riqueza das contribuições deste século: a instrução de menores e a de adultos constituíam dois problemas distintos.  

1. Obrigatoriedade da Instrução Primária.

 A Instrução nas primeiras letras dos menores, regista uma largo consenso, e mobiliza praticamente toda a sociedade. Mais do que o Estado são entidades privadas que assumem esta tarefa como uma missão social dignificante.

A obrigatoriedade das crianças frequentarem uma escola foi um medida essencialmente ideológica, mas a maioria da população não sentiu como uma necessidade. A Constituição de 1822 reconhece o direito à educação, mas pouco se fez para a difundir. A guerra civil entre liberais e absolutistas (1828-1834), marcou um profundo retrocesso neste processo. Após o restabelecimento da Carta Constitucional, em 1834, o ministro do Reino - Agostinho José Freire - assume a tarefa de relançar a instrução pública. A obra prosseguiu com o seu sucessor - Rodrigo da Fonseca -, que encarregou António Luis Seabra, a 3 de Agosto de 1835, da formação de um sistema e regulamento completo da instrução pública. 

A 7 de Setembro de 1835 eram finalmente publicados dois diplomas que marcaram uma viragem na educação em Portugal: o "Regulamento Geral da Instrução Primária" e diploma que criava o "Conselho de Instrução Pública", com sede em Lisboa (9). A reacção foi enorme, provocando a publicação de novos diplomas no ano seguinte. 

O decreto de 15 de Novembro de 1836, de Passos Manuel, criava de novo a Instrução Publica, determinando que os pais tinham apenas a obrigatoriedade moral de enviarem os seus filhos ás escolas. Em 1844 a instrução primária foi considerada obrigatória, sujeitando-se os pais que não enviassem os filhos ás escolas a multados, mas excepcionavam-se nem seguida todos os que por razões económicas não pudessem fazer[3], a esmagadora maioria. A situação persistiu até meados do século XX..  

2. Escolas Públicas e Analfabetismo

As cortes de 1821 e a Constituição 1822, proclamou a liberdade de ensino das primeiras letras, mas a remuneração dos professores régios, assim como as instalações das escolas seriam suportadas pelos particulares (10).  A carta constitucional de 1826 continua a "garantia" a todos um ensino primário gratuito, pago pelos particulares. As escolas públicas eram uma ficção. A "Gazeta de Lisboa" (1826), por exemplo, a Junta da Directoria Geral de Estudos publicava dezenas de anúncios de concursos públicos para "cadeiras de primeiras letras" vagas em todas as provedorias do Reino. A maioria destes anúncios eram repetidos, o que nos leva a pensar que a alegada rede de 1.000 escolas, das quais 25 femininas, não correspondia à realidade (11). Não parecia também haver falta de professores, pois no mesmo jornal eram publicados anuncios de muitos que ofereciam os seus serviços.

A reacção miguelista (1929-1832) levou ao fecho de 149 escolas primárias. Inúmeros professores foram perseguidos e mortos.

A rede de escolas públicas só voltou a crescer depois de 1834. No Relatório que acompanhava o Regulamento de 7/9/1835, apresentavam-se alguns números sobre o panorama da Instrução Pública: "seiscentos mil individuos de ambos os sexos entre os seis e os dezasseis anos, não recebem instrução alguma no momento actual, ou recebem de tal modo miserável, que se pode considerar nula". 

Em meados do século XIX o panorama continuava a ser deprimente. Em 1858, por exemplo, das 3 mil paróquias do país, cerca de 2 mil não tinham professores de primeiras letras, e naquelas que os havia ou eram insuficientes ou a situação era deficiente (12). Dez anos depois, um atento observador escrevia que das 750 mil crianças com idades entre os 7 e os 15 anos, apenas cerca de 100 mil frequentavam as escolas (13). Faltava quase tudo neste sistema de ensino: inspectores, bibliotecas, aulas de desenho, etc. Os professores, como veremos, não tinham sequer uma carreira. As dotações do ensino primário eram inferiores às do ensino superior.

 "Um país n´estas circunstâncias não é um país europeu, digamo-lo com profundo desgosto, é um país semibarbaro" (14).

Os avanços da instrução continuaram a ser muito lentos. A resistência da população à educação era um sério obstáculo, com que esbarravam os governos progressistas.. No final do século XIX, a taxa de analfabetos em Portugal só tinha paralelo nos países ortodoxos do leste da Europa, como a Rússia.

No ano lectivo de 1888/1889, em todo o país 3.825 escolas oficiais e 1.130 particulares. Em 1.351 freguesias não existia qualquer escola primária. O número de crianças em idade escolar era de 262.387, mas só se haviam matriculado 237.783. 

A maioria dos alunos abandonava a escola antes de concluir a instrução primária. No ano de 1888/89, apenas 9.269 alunos foram aprovados, ou seja -  0,038% - do total dos matriculados e 0,05% do número de frequências. Cerca de 50% destas aprovações correspondiam a Lisboa (2.488) e Porto (2.419). 

Para uma população total de 5.049.792 habitantes, em 1890, cerca de 4.000.957 eram analfabetos (79,8%). Dez anos depois a situação pouco se alterara. A população subira para 5.423.132 individuos, mas 4.261.336 (78,6%) eram analfabetos. Nas vésperas da implantação da República (1910), as escolas primárias públicas possuíam apenas 270.830 alunos matriculados. 

.Em construção !

  Carlos Fontes

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Notas:

[1]. Luis Reis Torgal  e Isabel Nobre Vargues, A Revolução de 1820 e a Instrução Publica.Porto.1984.

[3]Decreto de 20 de Setembro de 1844