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História da Formação Profissional e da Educação em Portugal

Carlos Fontes

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Idade Contemporânea - (Séc.XIX)

Alfabetização de Adultos

A alfabetização dos adultos, fora dos regimentos militares, só começa a despertar em Portugal, em meados do século XIX, quando se inicia um importante esforço de desenvolvimento industrial, comercial e agrícola. 

A relação entre a instrução primária e a aprendizagem de uma oficio são ainda duas questões distintas. A cultura profissional e a Instrução escolar não está interligada, e gera  frequentes resistências[2] . Só muito lentamente se vai impondo a ideia que a aprendizagem de um oficio deveria ser precedida pela aprendizagem das primeiras letras.

Algumas fábricas começam a sentir a necessidade de alfabetizarem os seus trabalhadores para poderem introduzir novas técnicas, assim como os próprios trabalhadores começam a ver na instrução um meio da sua libertação. Mas mais uma vez o processo foi longo.  

O Estado e inúmeras entidades privadas promoveram cursos de alfabetização para operários, com resultados em geral muito fracos. O desinteresse dos operários provocou o fecho antecipado de muitas destas aulas. 

O jornal " O Corticeiro"( Lisboa, 24.12.1910), explicava as suas razões: "Criaram-se nalgumas  escolas  oficiais cursos nocturnos, destinados a ministrar instrução aqueles que, durante o dia, trabalham pelo pão dos filhos, porém o ensino era insuficiente e por isso de resultados nulos. Pela péssima organização, certamente propositada -- admissão de crianças nesses cursos, numero demasiado de alunos para cada professor, imposição dos programas adoptados nas escolas de crianças, --o aproveitamento não podia por forma alguma ser apreciável... mas isto era unicamente o que convinha !".  (3). 

1. Cursos Oficiais. Os cursos de instrução nas primeiras letras destinados a adultos, datam em Portugal de finais do século XVIII. Jorge Thomaz Bulkeley ( ou Bulkeley), tendo montado uma fábrica de trefilaria na Quinta do Condado, a Marvila, decidiu recrutar mulheres, raparigas e rapazes com idades superiores a 10 ou 11 anos, incluindo aleijados e adultos cegos. Nesta fábrica criou uma unidade formação para capacitação dos operários e uma aula para os instruir nas primeiras letras (8). 

Em 1825, o juíz do Povo de Lisboa, António Simões de Carvalho, solicitava a abertura de escolas destinadas a trabalhadores (9).  

O decreto de 15 de Novembro de 1836, foi o primeiro documento oficial que contempla este tipo de instrução. Estabelecia que os ajudantes de professores de instrução primária, entre outras tarefas, deveriam ministrar três lições nocturnas por semana aos adultos que não as pudessem frequentar de dia. Os resultados desta medida são desconhecidos. A reforma de Costa Cabral, decretada a 20/9/1844, suprimiu estas disposições.  

Feliciano de Castilho, quando em 1850 foi ano nomeado Comissário Régio para a Instrução Primária, estabeleceu desde logo cursos para adultos em Lisboa, Porto e Coimbra, tendo por base um método de leitura criado pelo próprio Castilho, complementadas por uma série de obras, de que se destacaram titulo como: A Felicidade pela Agricultura; Noções Rudimentares; Gramática Intuitiva; Primeiros Exercícios; Directório para as Escolas; 

Outras iniciativas oficiais se lhe seguiram ao longo do século, mas encontrando quase sempre pela frente o desinteresse e a resistência dos alunos adultos.

Em 1866 publicou-se mais um decreto sobre as escolas para instrução de adultos, onde se apelava para o concurso de professores primários, municípios, juntas de paróquias, corporações e individualidades. Á semelhança de outros diplomas, era omitida a questão das verbas (10).

Em 1890, escrevia J. Simões, escrevia sobre estes cursos oficiais: Em 1888/89,havia 175 cursos nocturnos em todo o país, mas "o governo não despendeu um real, apesar de ter no orçamento verbas para os subsidiar" (4). 

O ensino nocturno para adultos foi também amplamente promovido por entidades particulares, como destaque para as associações de classe, associações de instrução, beneficência, religiosas , etc. Entre elas destacavam-se as Associações de Classe[5]

1.1. Voz do OperárioAs associações operarias no inicio viam na instrução um meio para retirar os seus membros do ambiente obscurantista em que viviam, mas depressa  começam a alimentar o sonho que seria pela instrução do povo que passaria a sua libertação os trabalhadores. Convicção muito bem ilustrada na história da fundação d`A Voz do Operário:

    "Soubesse eu escrever" (...) "Do pequeno circulo de tabaqueiros que a hora do almoço discutiam , em plena oficina, o agravo de lhes ter sido recusada a publicação na imprensa de uma noticia  sobre a sua situação e a sua luta, a frase passou a relato escrito. Tê-la-ia dito um trabalhador tabaqueiro analfabeto: Custódio Gomes. e terá sido Custódio Gomes que, no dia seguinte, na reunião da Associação de Socorros Mútuos União Fraternal dos Operários dos Tabacos, fez a proposta da criação de um jornal da classe dos manufactores de tabaco"[6]

O combate contra o analfabetismo estava no centro das preocupações das antigas associações de classe ao longo deste sculo  quer a favor dos seus membros, quer dos seus familiares:

O celebre "Centro Promotor dos Melhoramentos das Classes Laboriosas", criado em  1852 ,no  Bairro de Alcantara em Lisboa,  que até 1872 vai servir de palco a todas as "ideias sociais" do tempo, sob  a influencia de destacados politicos da época  foi um meio de difusão do associativismo operário e um centro de instrução. Os seus estatutos redigidos por Sousa Brandão , que na época ocupava um lugar de destaque no recém criado Ministério das Obras Publicas, Comércio e Industria estabeleciam que competia ao Centro "Difundir tanto o ensino elementar  como o ensino geral e técnico das artes e oficios, com especialidade a leitura , os principios de cálculo e geometria prática" ( Art.3.-  2. ), "Promover o aperfeiçoamento moral e intelectual das pessoas  pertencentes ás classes laboriosas que por falta de meios não possam cuidar da sua educação" ( Art.3.- 4 ), propagar os conhecimentos da economia industrial e domestica, aperfeiçoar os métodos  de trabalho, difundir as novas invenções,  criar associações congéneres, estabelecer depósitos e  bazares, e outras acções de carácter filantrópico e mutualista.

Associações como a dos Sapateiros , não perdem o ensejo de fazerem propaganda dos seus cursos gratuitos , inclusive para os filhos dos operários :

     "Não digam que não tem meios para os mandar ensinar, quando há tantas aulas gratuitas; o que se pretende é que conheçam o verdadeiro valor da instrução, para não a negarem a seus filhos; antes de os fazerem aprender um oficio, façam-nos ler e escrever, e poderão ser no futuro artistas perfeitos , bons inovadores; deixem-nos na ignorância , e o mais certo será serem uns operários que jamais passarão da velha rotina que aprenderam"[7].

    As entidades oficiais promoveram igualmente algumas iniciativas para a instrução dos operários, só que os resultados foram sempre muito reduzidos. As razões foram muitas: desinteresse do operariado pela instrução, a chacota a que se expunha todos aqueles que ia aprender já em idade adulta, a deficiência na organização escolar que juntava crianças e adultos. Tudo um pouco encontramos.

    Na segunda metade do século, nos movimentos revolucionários onde pontuavam os anarquistas, começa-se a forjar uma nova concepção de educação, que terá reflexos em muitas experiencias de formação profissional. A educação torna-se num meio para regenerar a sociedade a partir da infância.   Estas ideias apoiavam-se nas novas correntes da psicologia que evidenciavam a infância como uma fase própria da vida, muito distinta da dos adultos. Mas também, em autores que desde J.J. Rousseau , Pestalozzi e Froebel afirmavam que a criança possuía uma energia espontânea, que o processo de socialização ofuscara e reprimira. A partir desta matriz, começou a gerar-se a ideia de que através de uma educação liberta de preconceitos ou constrangimentos, desde a infância era possível criar o homem novo, regenerando assim a sociedade.  

1.2. Escolas Anarquistas.  Em Portugal apesar da sua forte influencia  Francesa, o seu ideário pedagógico mais consistente veio de Espanha, da "escola moderna" de  Francisco Ferrer (1859-1909), fundada em Barcelona em Agosto de 1901. Os métodos inovadores desta escola, a sua paradigmática separação entre ensino e religião, rapidamente se espalharam por toda  a Espanha. Este movimento contava já por volta de 1906, com cerca de 40 escolas espalhadas  por este pais, seguindo todas os mesmos métodos e manuais. Para além de uma revista ( L'ecole Renovee, publicada em Paris de 1908 a 1909), o movimento fundou igualmente a "liga Internacional Pró-Educação Racional da Infância", em que participaram alguns portugueses como Emilio Costa. Varias foram as tentativas para se fundarem entre nós , escolas tomando como modelo a "escola moderna. 

Entre estas iniciativas destacam-se: "A Escola Livre" de "ensino integral", "Obra de Educação e Solidariedade" promovida pelo "Grupo da Escola Livre" de Coimbra, fundado em 1906, e de que era o principal obreiro Campos Lima, e, a "Crecherie", no Largo da Graça, em Lisboa, cujas aulas chegaram a funcionar pouco mais de um ano (1912), da iniciativa do Grupo Libertário Acção-Directa.

  Esta corrente deste logo, teceu uma viva critica ao ensino profissional típico do século XIX, marcadamente pratico, como mais um instrumento de alienação social. Apelando para um que abolisse as barreiras entre a formação intelectual e a manual, ou entre as actividades próprias dos homens e as das mulheres. Um exemplo claro destas ideias será a "Escola Oficina n. 1". 

No final do século o sindicalismo revolucionário veio trazer novas contribuições para esta questão. Em 1895, escrevia um dos seus mais destacados ideólogos, F. Pelloutier, que o sindicalismo se apoiava em quatro princípios base: a educação, a resistência, a mutualidade e a propaganda. A sociedade futura

afirmavam-no, seria gerida pelos trabalhadores apoiados nos seus sindicatos. Para esse grande dia, o trabalhador deveria ir-se preparando, educando-se em todas as suas dimensões. Em todos os congressos operários passa a estar á cabeça dos objectivos da luta dos trabalhadores a sua formação global, mas muito especialmente a profissional.  

Em construção !

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  Carlos Fontes

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Notas:

[2] Adolfo Coelho, Cultura e Analfabetismo

[5] Não pretendemos com isto desvalorizar a importante acção de outras iniciativas, mas tão só valorizar uma dada acção da própria luta dos trabalhadores. Para uma analise desta questão consultar, as obras de D. António da Costa: Auroras da Instrução; Instrução Nacional; etc. Notar que desde muito cedo a instrução de adultos foi introduzida no exercito, assim como o irá ser nas prisões por iniciativa de um preso.

[6]. Fernando Piteira Santos, A Fundação de "A Voz do Operário2 -- do "Abstencionismo politico" á participação no "congresso possibilista de 1889, in, Análise Social,n.67,68,69. 1981.

[7]. in, Jornal da Associação Fraternal dos Sapateiros e Artes que Trabalham em Cabedal. Lisboa. 11.10.1853.