História da Formação Profissional e da Educação em Portugal Carlos Fontes |
Idade Contemporânea - 3ª. República (1974-1986) Ensino Técnico-Profissional O Ensino Técnico-Profissional atravessou um período de enorme confusão entre 1974 e 1983, marcado pela continuidade das reformas iniciadas por Veiga Simão e a desvalorização do sistema de formação profissional. Para compreendermos estas mudanças, temos de ter em conta três medidas de fundo que alteraram por completo o sistema de ensino: o aumento da escolaridade obrigatória ,a unificação do ensino liceal e tecnico e as medidas administrativas de caracter pontual. 1. Aumento da escolaridade obrigatória da população e a fixação da nova idade das opções profissionais. Desde o século XIX que a instrução primária compreendia em geral 4 anos, e a idade de opção dos alunos para a frequencia do ensino liceal ou do ensino técnico situava-se á volta dos dez anos. A Reforma de 1931 continuava a manter esta idade, mas reduziu o tempo de escolaridade obrigatória para 3 anos (a 3ª. Classe). A Reforma de 1948 manteve a idade de opção profissional nos dez anos, mas criou no ensino tecnico-profissional um "ciclo preparatório" de dois anos, antes do aluno deste ensino optar por um curso técnico especifico. A idade da opção profissional era assim aparentemente fixada aos doze anos. O aumento da escolaridade obrigatória em 1956 de 3 para 4 anos, mas apenas para o sexo masculino, e só em 1960 para o feminino, pouco alterou esta questão. Em 1964 o ministro da educação Galvão Teles, aumentou a escolaridade de 4 para 6 anos, mas apenas para as crianças que iniciassem o ensino primário no ano seguinte[9], este aumento integrava assim o ciclo preparatório já criado em 1948, mas traduziu-se pelo aumento da idade das opções de 10 para os doze anos. Assim em 1967 foi criado o "ciclo preparatório" do ensino secundário que unificou de facto os ciclos preparatórios das escolas técnicas e dos liceus[10]. O aumento da escolaridade obrigatória desde os anos 60 que era seguido na maioria dos países da a Europa[11]. Este aumento foi imposto pelas profundas mudanças da economia, e a rápida mutação das tecnologias e profissões que exigiu um numero crescente de trabalhadores com melhores qualificações para as acompanhar. Este aumento da escolaridade implicou também o retardamento da idade de uma opção profissional, que agora se considera prematura ser feita antes dos dos 14 ou 15 anos. Uma melhor formação geral permitia reduzir também os periodos de aprendizagem de um oficio, questão decisiva num momento de grande instabilidade profissional. Na RFA as opções de caracter profissional começaram a fazer-se após o 9.ano de escolaridade [12]0. Na França fazia-se igualmente depois do 9. ano, optando os alunos pelos "Lycées d Enseignement Professionnel" (criado em Julho de 1975, por conversão dos "Collèges d Enseignement Technique") e os" Lycées" que para além de um ensino mais académico, ministravam também cursos de formação profissional[13] A reforma de Veiga Simão em 1973, inserem-se neste movimento internacional. Aumentou a escolaridade obrigatória de 6 para 8 anos, mas não consagrou a gratuidade deste ensino. Mais tarde afirmou este ministro que a tencionava aumentar esta escolaridade para 9 anos[14]. A idade das opções profissionais foi retardada e situava-se agora nos catorze anos. As grande mudanças estruturais no ensino que se processaram após 1974 não decorreram de novos aumentos da escolaridade, mas da extensão do "ensino unificado" que absorveu progressivamente todos os ramos de ensino até quase ao 12. ano de escolaridade. Deste modo apenas com 17 ou 18 anos de idade os jovens realizavam a partir de agora as suas opções profissionais ... 2. Unificação do Ensino Técnico e Liceal. As reformas introduzidas em 1973 nos cursos de técnico-profissionais introduziram uma completa confusão nas escolas, agravada pelas reformas decorrentes da unificação do ensino secundário , e um sem numero de medidas pontuais nos currículos após 1974. O numero de cursos em extinção em 1977 era de veras surpreendente : os da reforma de de 1948, os experimentais de 1970, 1972 e 1973... O principal problema que a "Revolução" saída do 25 de Abral de 1974 enfrentou foi a Reforma de Veiga Simão. Os novos reformadores mantiveram praticamente todos os cursos anteriores, apenas introduziram alguns retoques de modo a abolir todos os laivos de descriminação social, nomeadamente a existente entre alunos nocturnos e diurnos. - Os cursos gerais ( comercial, industrial, artes visuais ou artes aplicadas, ou agricola ), instituidos em 1970/71 que resultavam de cursos experimentais, mantiveram-se quase todos, á excepção de o de formação feminina. Os cursos gerais nocturnos de 4 anos criados em 1972/73, alterados pela circular 11/04/1973, e depois pela circular de 21/10/1975, passando para três anos como os diurnos, e os complementares para dois. Ponha-se assim fim a um "descriminação" entre ensino nocturno e diurno que a Reforma de 1948 acentuara. - Os cursos complementares criados em 1973/74 ( circular 16/08/1973 ) para substituírem as secções preparatórias que davam acesso aos institutos industriais e institutos comerciais, foram modificados pela circular 20/08/1978, e entram numa completa descaracterização pois a exigência do acesso á Universidade era uma matriz absorvente em todas as áreas destes cursos. Formalmente mantiveram-se quase todos os cursos complementares, sendo apenas extintos os cursos de Desenho Industrial, de Controle de Qualidade e de Topografia, além dos referentes ao sector agricola. Em substituição destes últimos foi criado o Curso Tecnico de Agricultura[15]. A transformação dos Institutos Industriais e Comerciais em escolas superiores esvaziou de sentido muito das finalidades iniciais destes cursos. Em sintese, prosseguiu-se na as medidas já encetadas com Veiga Simão, podendo falar-se mais em continuidade do que em ruptura, se não fosse o facto de a extensão do ensino unificado ir extinguindo todos os cursos criados desde 1970. Os cursos assentavam todos num mesmo modelo genérico: um conjunto de disciplinas "gerais" e outro de "especificas" onde tem acento as matérias técnicas. Rapidamente as diferenças entre os cursos tornam-se irrisórias sob o ponto de vista técnico, apenas as observamos no quadro das disciplinas tradicionais, como a inclusão ou não da matematica, etc. Apesar da extinção dos antigos cursos gerais e complementares , as suas frequências mantiveram-se muito elevadas. Em 1974/75 contavam-se 160.400 inscritos, numero que começou a descer, para em 1977/78 se cifrar já em 75.100 alunos, assim repartidos : 26,7 mil no ensino diurno e 48,4 mil no nocturno. O peso dos alunos nocturnos é demonstrativo como o ensino nocturno continuava a ser a unica forma de acesso ao ensino pós-primário de largas faxas da população . No ano lectivo de 1977/78 antes da introdução do ensino unificado no 10º e 11º ano, as preferências dos alunos incidiam sobre os cursos gerais e complementares[16] de comercio, administração e as áreas de mecânica, assim distribuídas[17]: Cursos Gerais : Curso de Administração e Comercio (25.678 ) ;Curso de Mecânica ( 8.041);Curso de Electricidade ( 7.149); Curso de Artes Visuais ( 586) Curso de Construção Civil ( 535 ) Curso de Quimica ( 360 ); Curso de Textil (126); Curso de Agricultura ( 84 ); Cursos Complementares : Curso de contabilidade e administração (9637 ); Curso de Electromecanica ( 4374 ); Curso de Mecanotecnia ( 4267); Curso de Secretariado e Relações Publicas (3908 ); Curso de Artes dos Tecidos (1111); Curso de Radiotecnia ( 498); Curso de Construção Civil (407); Curso de Equipamento e Decoração ( 367 ); Curso de Artes Gráficas ( 264 ); Curso de Informatica ( 184); Curso de Produção Agricola (132); Curso de Quimiotecnia Laboratorial ( 130); Curso de Artes do Fogo ( 74 ); O "fim" oficial desde ensino nunca foi declarado, mantendo-se em "morte lenta" até aos nossos dias... 3. Unificação do Sistema de Ensino. A Unificação do Ensino Técnico e do Ensino Liceal não apenas levou á extinção progressiva do antigo ensino tecnico-profissional, como introduziu uma nova concepção de ensino técnico nas escolas. A escola mais do que ensinar uma profissão, deveria dar uma cultura geral, e algumas breves noções sobre grandes campos de actividades profissionais, capazes de orientar o aluno em futuras opções profissionais na universidade, em escolas privadas, nas empresas, em suma ao sabor do acaso, oportunidades locais e posses individuais. O processo de unificação não foi traçado de uma unica vez, mas foi o resultado de um movimento de pressões e contradições várias. Vejamos os seus principais momentos. No ano lectivo de 1975/76 começou por unificar-se o "curso geral" dos liceus e das escolas tecnicas, que correspondiam então ao 7º. , 8º. e 9º. ano. Esta unificação assentava nos seguinte pressuposto: A escola não deve conferir nenhuma qualificação tecnica numa dada profissão, sem que antes ter fornecido uma ampla cultura geral. Esta decisão retardava deste modo qualquer opção profissional, no seguimento das medidas anteriores. O 7º. ano unificado lançado em 1975, tinha algumas novidades no seu curriculum[18], tais como o aparecimento duas disciplinas novas: Ciencias Sociais e Educação Civica e Politécnica[19]. Estas disciplinas cedo foram motivo de intensa polémica. A primeira porque não haveria professores qualificados para a dar sendo substituída em 1976 pela disciplina de história[20]. A segunda que procurava uma interligação escola-meio não tardou a ser apontada como reflectindo concepções "marxistas", sendo também suprimida. Em 1977 entrava em funcionamento o 9. ano unificado, com um elenco curricular depurado das disciplinas que poderiam ligar o aluno à realidade social e ao mundo das profissões. Aquando da unificação do 10. e 11. ano , que principia no ano lectivo de 1978/79, são criadas cinco grandes áreas de estudo, correspondentes a cinco grandes blocos de actividades[21]. Deste modo pretendia-se que o aluno começa-se a formular em termos gerais aqui as suas opções profissionais que depois, poderiam ter seguimento na Universidades ou no Ensino Superior de Curta Duração. A formação profissional far-se-ia assim a um nivel superior, e não nas escolas secundarias. O caracter generalista destas vias não permite sequer falar delas como qualquer ensino de conteudo profissionalizante, e nem sequer de sensibilização, no entanto elas vão substituindo os cursos tecnicos anteriores. Este é o novo modelo que se impõe nas escolas e vai perdurar até aos nossos dias, cuja orientação foi reforçada pela reforma curricular de 1989... As consequências desta unificação, como veremos, revelaram-se a diversos níveis desastrosas, tendo inclusive contribuído para o elevado número de jovens que abandonavam todos os anos o sistema escolar de ensino antes de cumprirem a escolaridade obrigatória. Em 1976‑1977, entre os 12 e os 14 e 15 anos, registou-se mesmo uma descida na frequência escolar de 155,8 milhares alunos. José Salvado Sampaio escrevia em 1980: " a adesão do autor deste escrito ao ensino secundário unificado, que será a via única numa obrigatoriedade escolar de nove anos, não impede que, atento nas dezenas de milhares de alunos que são expelidos anualmente do sistema escolar sem perfazerem, nalguns casos, a escolaridade primária, e noutros, com maior extensão, o 5º. e 6º anos de obrigatoridade escolar, se defenda a formação destes alunos. Ademais são oriundos das classes sociais mais pobre, o que reforça a necessidade de os auxiliar, por à partida não disporem do apoio que outros desfrutam."( José Salvado Sampaio, Portugal- A Educação em Números ).
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