As Duas
Alemanhas
A ideia de um "Império Europeu" é um dos mitos mais persistentes
nos países germanófonos (Alemanha, Austria), mas também nas regiões onde
existentes importantes comunidades de falantes desta língua (Suíça, Luxemburgo,
Bélgica).
Carlos Magno.
Pintura de Albrecht Durer, 1512. Museu Nacional de Nuremberga.
Primeiro Reich
A própria propaganda oficial da União Europeia, sob influência germanófona, com
alguma frequência estabelece remonta a origem da União Europeia ao ano 800,
quando Carlos Magno (Charlemagno, Great Karl) funda o Sacro-Império Romano -
Germânico, o Iº. Reich. O império não tardou a ser desmembrado, mas a ideia de
o reconstituir sob a égide de um imperador
germano irá alimentada durante séculos inúmeras guerras por toda a Europa.
Leonor de Portugal
por Hans Burgkmair, o Velho, 1473-1531
Portugal está
associado à génese da única altura em que este Império possuiu uma dimensão
mundial.
Frederico III de Habsburgo (1415-1493), casou-se com uma
princesa portuguesa - Leonor de Portugal ( 1436-1477),
mãe do imperador
Maximiliano I da Germânia (1459–1519),
de quem descendem Carlos V .
Isabel de Portugal por Ticiano
Carlos V casou-se
com Isabel de Portugal (rainha da germania, espanha, sicilia e nápoles, maiorca,
itália, sardenha, arquiduquesa da Austria, duquesa da borgonha e condessa de
Barcelona) dos quais descende Filipe II de Espanha (I de Portugal).
A "curta"
existência deste Império mundial, reduzida ao reinado de Carlos V-Isabel de
Portugal, mostrou que o
império germânico era essencialmente continental, convivendo mal noutras
dimensões terrestres como se veio a verificar mais tarde.
A luta pela
expansão do Sacro Império Romano-Germânico, como é sabido, desde muito cedo
levou a um constante conflito com a Santa Sé. No final do século XV já se havia
transformado numa divisão entre "católicos" e "protestantes", degenerando nos
séculos seguintes em várias guerras religiosas que ensanguentarem a Europa.
O sacro Império
Romano-Germânico desapareceu, no século XVI, devido à intolerância religiosa, mas a
ideia do Império não morreu na Alemanha.
Paris 1870. Tropas alemães cercam a
cidade e provocam uma onda de destruição.
Segundo Reich
No século XIX, a
ideia do Império Europeu germânico ressurge com toda a força num estado militar
alemão - a Prússia. Na segunda metade Guilherme I (imperador) e Otto Von
Bismarck (chanceler), através de uma hábil estratégia político-militar unificam
uma parte importante do antigo Império, criando a actual Alemanha. A Europa
mergulha novamente num período de intensas guerras.
Com o império
alemão ressurgiram as suas antigas tendências históricas: o expansionismo
continental e a intolerância religiosa.
A poderosa
máquina militar alemã, aproveita os acontecimentos ocorridos em Sarajevo (o
assassinato, no dia 28/6/1914, do arquiduque
Francisco Fernando, herdeiro do
Império Austro-Hungaro,
e da sua esposa, a duquesa de Hohenberg),
para mergulhar a Europa e depois o mundo numa guerra mundial.
A Alemanha com
esta guerra (1914-1918) contava anexar vastas regiões da Europa e expandir as
suas colónias em África. O resultado foi a morte de mais de 10 milhões de
pessoas.
A intolerância
religiosa, nomeadamente contra os judeus, mas também a exigência de se acabar
com a minorias étnicas, começa a estar na ordem do dia. Os judeus não
tardam a serem a acusados de ser o causadores das desgraças dos impérios
germânicos, o alemão e o austriaco.
Foi especialmente
neste período que emergiu um conjunto de pensadores germânicos que denunciaram a
mentalidade bélica (exterminadora) que estava profundamente enraizada na cultura
germânica, como o caso de Karl Marx, Niezstche e tantos outros. Tinham a firme
convicção que se a mesma não fosse travada iria conduzir a Europa à uma
tragédia, como veio a acontecer. A outra Alemanha tinha finalmente uma voz
audível à escala planetária.
A derrota em 1918
da Alemanha e da Austria, os dois grandes impérios germânicos, não acabou com o
sonho do grande império germânico europeu.
Hitler entra em Paris, 14/06/1940
Terceiro Reich
Adolfo Hitler (austriaco),
líder desde 1921 do Partido Nacional-Socialista
dos Trabalhadores Alemães (Nationalsozialistische
Deutsche Arbeiterpartei - NSDAP),
partindo do sentimento de humilhação dos povos germanófonos, propõem-se criar um
novo reich, retomando três ideias que se haviam enraizado na cultura imperial
germânica: a superioridade do povo alemão; a "Europa", do antigo Império Sacro
Romano-Germânico pertence-lhes, é o seu espaço vital; por último, a
"necessidade" de se acabar com as minorias religiosas e éticas, de modo a
unificar política, religiosa e etnicamente o Império alemão.
O resultado, como é sabido, foi uma nova guerra mundial (1939-1945), onde
perderam a vida cerca de 60 milhões de pessoas.
A outra Alemanha, pela vozes como as de H. Husserl, Hannah
Arendt, Bertolt Brecht, Wilhelm Reich
e tantos outros, denunciaram a nova barbarie que a "Alemanha" (imperial) estava
a conduzir o mundo.
Quatro Reich
Após a queda do "Muro de Berlim"
(1989), o mundo assistiu à pacífica reunificação da Alemanha. De imediato
surgiram vozes dando conta que estavam a ressurgir antigos aspectos da alemã que
todos julgavam ter desaparecido, cujo primeiro sintoma foram o crescente número
de ataques racistas contra os imigrantes.
A crise económica, que eclodiu
depois de 2008, revelou numa nova dimensão o tradicional expansionismo alemão,
agora convertido ao domínio económico e financeiro da Europa, utilizando as
estruturas da União Europeia.
Em construção!
Carlos Fontes |