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Rotas
Europeias de Comércio de Escravos
Escravatura Moderna
Em tempos de imigração massiva dos países mais
pobres para os mais desenvolvidos, como os que integram a União Europeia,
multiplicam-se os estudos e as publicações sobre as rotas da escravatura entre
o século XV e finais do século XIX. Neste imenso negócio em que participam
inicialmente os países europeus (Portugal, Flandres, Inglaterra, França,
Espanha, Holanda, Alemanha, Dinamarca, etc), e depois os novos estados
americanos (EUA, Brasil, etc), não seria possível na escala que adquiriu, sem
a participação
activamente dos chefes africanos que se encarregam da captura dos escravos e
depois os negociavam com os negreiros.
A grande
novidade desta escravatura empreendida pelos europeus, em relação à que se
fazia noutras regiões do mundo, como no norte de África e nas arábias, estava
na sua elevada racionalização e crescente sofisticação. Nenhuma aspecto foi
descurado para obter o máximo lucro destes seres humanos, desde a montagem de
redes de captura, construção de locais de embarque e navios próprios,
passando pela avaliação, classificação e marcação dos escravos, ao leilão
e o abate dos revoltosos, não esquecendo a fixação de impostos devidos ao
Estado, etc.
A escravatura
moderna tem uma data simbólica: 1415. O ano em que os portugueses conquistaram
Ceuta. A expansão marítima através do Atlântico e depois do Pacífico
alargou à escala mundial as possibilidades deste negócio. No século XV, os
portugueses dominam este negócio, mas a partir do século XVI, deixam de estar
sózinhos, tem agora que concorrer com outras potências europeias. No século
XVII, toda a África, tanto na costa ocidental, como oriental torna-se num
imenso campo para a captura de escravos. Um sem número de companhias e bandos
de negreiros praticam, legal ou legalmente este negócio até o século XX.
Entre os século
XV e meados do século XIX, calcula-se que cerca de 30 milhões de africanos
tenham sido traficados ou mortos pelos europeus nestas operações.
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Portugal . Espanha .Grã-Bretanha . Holanda .
França . EUA . Brasil . Austria . | |
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Portugal
A expansão
portuguesa é indissociável da escravatura. O seu móbil não foi a difusão
do cristianismo, nem tão pouco se centrou no ouro ou marfim, mas sim nos escravos.
Eles eram a mão-de-obra que geravam a riqueza. O
próprio Infante D. Henrique, em 1443, chama a si o monopólio da sua exploração.
No século XV,
os escravos destinavam-se sobretudo a abastecer os trabalhos em Portugal, ou as
explorações da cana do açucar na Madeira (escravos canários), mas também a
serem vendidos para Espanha. Lisboa, Alcácer do Sal e Lagos estabelecem-se
florescentes mercados de escravos. No Algarve, em 1444, forma-se a primeira
companhia moderna para o tráfico, muitas outras lhe seguirão pela Europa. Ao
longo da costa ocidental de África criam feitorias, cuja principal actividade
estava neste tráfico: Arguim, Mina, Cacheu e S.Tomé. Os pontos de
embarque preferidos dos portugueses concentram-se sobretudo na costa ocidental
de Africa, em especial pela costa da
Guiné, costas de Loango, Ngoyo e do Kalongo (actual enclave de Cabinda), mas
também do Soyo e, sobretudo, da colónia de Angola, que era alimentada por
importantes centros esclavagistas de São Paulo, de Assumpção de Loanda e de
Benguela.
No século
XVI, o tráfico dispara para abastecer as “necessidades” do país, a
colonização do Brasil, as explorações de S. Tomé, mas também as
necessidades de Espanha e das suas possessões na América. Os portugueses
funcionam nesta altura, como negreiros ao serviço de Espanha, actividade que
exerceram quer numa forma legal (monopolista), quer ilegal (contrabando) até à
abolição da escravatura. O período da ocupação filipina
(1580-1640) foi particularmente vantajoso para os negreiros portugueses. Entre
1595 e 1640 conseguem o exclusivo da Coroa Espanhola (assiento) do comércio de
escravos para as suas possessões na América. Entre 4 a 5 ml escravos foram
vendidos por ano (cerca de 150 mil no total). Só mais tarde, entre 1685 e 1701
virão de novo a obter tão lucrativo monopólio.
A própria igreja participa
activamente neste negócio, nomeadamente por intermédio das ordens religiosas
envolvidas na evangelização. Os Dominicanos e os Jesuitas foram os que
mais se destinguiram no trafico de escravos africanos. A Companhia de Jesus, por exemplo, possuía
navios exclusivamente destinados ao comércio de escravos angolanos para o Brasil.
Em fins do século
XVII, criam outra importante feitoria em Daomé (Ajudá), de apoio logístico a
este florescente negócio que se mantém muito activo até meados do século XIX.
Neste último século, o comércio de escravos português está já firmemente
implantado em Moçambique, de onde saem dezenas de milhares de escravos para as
colónias espanholas (Cuba), mas também para o Brasil e S. Tomé.
Depois da
escravatura abolida, em 1878, continua a exploração de mão-de-obra africana agora sob o nome de contratados. As colónias portuguesas abastecem
agora as explorações mineiras da África de Sul e da Rodésia, mas também nas
plantações de São Tomé e Príncipe, para só citar estes locais.
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Espanha
O mediterrâneo foi até ao
século XVI, um dos locais mais activos no tráfico de escravos. Muito antes da
descoberta América (1492), os Barcelona, Valencia ou de Sevilha eram
verdadeiros mercados de escravos. A expansão marítima dos portugueses abre uma
nova fonte para o abastecimento de escravos, a costa ocidental de África
depois também a costa oriental, o que é rapidamente aproveitado por negreiros
espanhóis.
Em
consequência do Tratado de Tordesilhas, a Espanha fica todavia limitado na exploração do
tráfico de escravos africanos. O seu único recurso foi o de recorrer aos
negreiros portugueses,
e depois já no século XVI, a negreiros franceses, alemães, holandeses,
ingleses e outros para abastecer a Espanha e sobretudo as suas possessões na
América.
Cristovão
Colombo, mal descobriu a América procurou desde logo explorar uma outra fonte
de mão-de-obra: os indios. Na sua segunda viagem à América trouxe
consigo um carregamento para vender em Espanha, mas estes revelam-se pouco aptos
aos trabalhos exigidos pelos europeus. Por razões teológicas o seu comércio de
indios foi também proibido em 1495, mas acabou autorizado em 1503. No século
XVI muitas cidades de Espanha, como Sevilha, possuíam enormes massas de
escravos. Nas
suas possessões na América, os espanhóis ficaram tristemente célebres por se
evidenciarem no extermínio dos povos que encontraram. Dezenas de milhões de indios foram
mortos de exaustão em trabalhos forçados pelos conquistadores espanhóis,
assim como pelas doenças que estes lhes transmitiram.
Perante a ameaça da sua completa extinção,
os espanhóis viram-se para os africanos. Começa então verdadeiramente a fase
da sua importação massiva. O
número deste escravos foi ainda diminuto no século XVI (cerca de 36 mil entre
1555 e 1595). No século XVII, a América Espanhola começa a encher-se de
escravos africanos, tendo o ritmo deste tráfico aumentado no século seguinte
(cerca 350 mil ao longo do século) . Ficou então célebre o sistema espanhol
de contabilizar o número de escravos, em vez de ser feito à cabeça (peça),
faziam-no à tonelada. Apesar de
pouco organizados no tráfico, devido à falta de apoios logísticos na costa
africana, os negreiros espanhóis mantiveram-se muito activos até meados do século
XIX. Entre 1765 e 1779, por exemplo, confiam o
monopólio da comercio de escravos para a América a um grupo de negreiros
bascos (Uriarte e Companhia Geral de Negros). A partir de 1789, abriram as
fronteiras das suas colónias ao comércio de escravos, procurando desta forma
fazer descer o preço por peça (escravo). A actividade dos negreiros
espanhóis estendeu-se, como era de esperar, muito para além da abolição da
escravatura. Na primeira metade do século XIX, muitos navios negreiros
espanhóis, adoptam a bandeira portuguesa para mais facilmente exercerem estes
tráfico. Ainda em Fevereiro de 1864, um navio negreiro
espanhol era aprisionado na costa de Angola, quando andava a apanhar escravos.
Cuba, a sua última das colónias na América, resistiu enquanto pode à
abolição da escravatura(1886).
Perdida
a sua colónia emblemática (Cuba), os espanhóis viram-se para o Norte de
África, e procuram conquistar Marrocos, onde possuem umas fortalezas
conquistadas aos portugueses. O problema é que a França está também
interessada neste quinhão de África.O povo marroquino é então, mais uma vez,
vítima das piores barbaridades ( Humilhação, discriminação e
escravização, as três palavras mágicas da colonização europeia).
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Continuação
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Carlos Fontes
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