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O Falhanço Anunciado do Sistema
de Cotas O estabelecimento de cotas para a entrada de
imigrantes foi, em 2003, uma das mais publicitadas medidas anunciadas pelo
governo. Destinava-se a controlar os fluxos migratórios, estabelecendo
anualmente um contingente de entradas, em função de estudos do mercado de
trabalho. Antes de entrar no país o imigrante tinha que ter um visto e um
contrato de trabalho.
Este sistema entrou em vigor em Janeiro de 2004,
estabelecendo-se um contingente de 8.500 pessoas. Os empresários na altura
afirmaram que o número era muito pequeno.
Em Setembro de 2004 o jornal Público, revela que
apenas 3 ( três ) imigrantes tinham entrado em Portugal por este sistema. Ao
longo deste ano muitos milhares de imigrantes continuaram a entrar
clandestinamente no país. Porquê este fracasso do sistema de cotas?
Trata-se de um fracasso que há muito era
previsível, nomeadamente tendo em conta as características específicas da
economia do país.
Portugal possui uma enorme economia paralela,
onde muitos poucos pagam impostos ou fazem declarações ao fisco.
-Uma elevada percentagem das empresas apresentam
prejuízos anos a fio, mas os seus donos levam uma vida faustosa.
-A esmagadora maioria dos profissionais liberais
afirma que recebe o salário mínimo, furtando-se a qualquer contribuição para
o fisco.
- O exemplo é dado diariamente por políticos e
gestores públicos corruptos e incompetentes que montaram um sistema para
sacarem dinheiro não declarado ao Estado através de reformas antecipadas, viagens
fantasmas, ajudas de custo, cartões de crédito ilimitados, etc, etc.
Face a este panorama, compreende-se que ninguém
queira empregar legalmente nenhum trabalhador imigrante, e prefira recrutá-los
sem papéis. A exploração pode ser desta forma total e sem qualquer
compromisso por parte da entidade empregadora.
CF
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Governo
não explica fracasso
Sistema
de quotas para a imigração só legalizou três pessoas
PÚBLICO, 29/9/2004
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A tentativa do Governo de regular a imigração através do apuramento
das necessidades de mão-de-obra no país - tarefa que coube ao
Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) - não está a ter
resultados. Dos 8500 imigrantes que deveriam entrar em Portugal este ano
(2004), no âmbito da quota definida pelo Governo, apenas três
obtiveram o visto de trabalho que lhes permite estabelecerem-se em
Portugal e apenas 60 se candidataram.
Segundo dados do Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE), os três
imigrantes legalizados ao abrigo do sistema de quotas são um
brasileiro, um moldavo e um ucraniano, que irão exercer as profissões
de trabalhador agrícola, escriturário e copeiro, respectivamente.
Este valor vai contra as todas as expectativas, quer do Governo, quer da
oposição, quer de várias entidades ligadas ao mercado laboral e à
imigração, a maioria das quais entendia que a própria quota de 8500
seria demasiado reduzida.
A fixação de um limite máximo anual de entradas de cidadãos de
Estados terceiros foi considerada pelo Governo como "um instrumento
decisivo para a regulação e estabilização das entradas em território
nacional". O Governo acreditava que este sistema permitiria que o número
de imigrantes que viessem para Portugal se ajustasse às necessidades do
mercado de trabalho. Desta forma - defendia o Governo -, evitar-se-ia
que continuassem as correntes de imigração ilegal e que bolsas de
desemprego contribuíssem para a marginalização das comunidades
estrangeiras.
Dos diversos ministérios que lidam directamente com o processo - MNE,
Ministério da Administração Interna (MAI), e Ministério dos Assuntos
Económicos e do Trabalho (MAET) - ninguém avançou com uma explicação
para o fracasso desta filosofia, verificado até ao momento. Do Serviço
de Estrangeiros e Fronteiras e do IEFP, apesar da insistência do PÚBLICO,
também ninguém quis fazer qualquer comentário.
Mas alguns responsáveis relacionados com o fenómeno da imigração
admitem que o falhanço do processo revela que os empresários
portugueses continuam a preferir recrutar ilegalmente imigrantes - que
entraram clandestinamente em território nacional -, em vez de
enveredarem pelo processo oficial e legal.
Um dos responsáveis que ficaram mais admirados com a fraca concessão
de vistos foi, precisamente, o presidente da Confederação da Indústria
Portuguesa, Francisco Van Zeller. Recorde-se que Van Zeller mostrou-se
muito crítico relativamente à quota fixada pelo Governo, em Janeiro
(as 8500 vagas), dizendo publicamente que "lhe dava vontade de
rir" por ser tão baixa relativamente às carências de mão-de-obra
existentes em Portugal.
"Não sei bem o que aconteceu", disse. "Mas tenho a
certeza que continua a haver uma grande falta de mão-de-obra pouco
qualificada no país", referiu, acrescentando depois algumas hipóteses
explicativas: "É possível que os imigrantes prefiram vir para cá
clandestinamente. É possível que os empresários estejam mal
informados sobre o processo ou sobre os procedimentos para contratar lá
fora. Ou que muitas empresas, uma vez em dificuldades, tenham preferido
os imigrantes ilegais, sem contrato", afirmou, salientando que os
patrões em situação de crise "ligam pouco às leis".
Timóteo Macedo, presidente da associação Solidariedade Imigrante,
também se mostrou incrédulo, mas não tem dúvidas que "isto só
prova que as empresas não estão interessadas em trabalhadores
legais": "Para quê ter que enfrentar a burocracia, para quê
ter de fazer um contrato, se há por aí já tantos imigrantes ilegais
prontos a serem explorados?", ironiza.
Outra das causas para o facto de o sistema de quotas não estar a
funcionar relevará de não se terem concretizado os acordos bilaterais
de contratação de trabalhadores celebrados com a República de Cabo
Verde, com República da Bulgária e com a República Federativa do
Brasil - em 1997 e em Maio e Setembro de 2003, respectivamente.
A lei que regulamentou o sistema por quotas, entrada em vigor no dia 12
de Março de 2004, deveria também agilizar os procedimentos burocráticos
de legalização de estrangeiros, visto que a lentidão do anterior
processo era apontada como uma das razões para o facto de os empresários
não aderirem à contratação pela via legal. A avaliação dos pedidos
de visto de trabalho passou a ser tratada, no prazo máximo de 30 dias,
simultaneamente, por todas as entidades implicadas: Instituto do Emprego
e Formação Profissional (IEFP), Inspecção-Geral do Trabalho e Serviço
de Estrangeiros e Fronteiras."
Ricardo Dias Felner |
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