A pobreza, isto é,
a carência de meios de subsistência mínimos para viver numa dada sociedade é
um fenómeno universal. No entanto há pobres e pobres, assim como há
diferentes maneiras de encarar e combater a pobreza.
A pobreza em
Portugal é muito diversificada, embora seja possivel apontar os seguintes
grupos sociais:
- 30% dos pobres
são reformados ou pensionistas. A maioria são pessoas pessoas de idade e
com problemas de saúde que carecem de apoios
continuados. Muitos nunca descontaram para a Segurança Social ou quando o
fizeram tiveram carreiras contributivas insuficientes para puderem ter uma
reforma que lhes permitisse situarem-se acima do limiar da pobreza.
- 30% dos pobres
são trabalhadores. Trata-se de pessoas com baixos níveis de escolaridade e
sem qualificações profissionais. Exercem em geral actividades informais, não
enquadradas por qualquer tipo legislação laboral ou de segurança social.
Auferem baixos salários e vivem em condições em geral deploráveis. Um
número crescente destes pobres é constituida por trabalhadores migrantes
(imigrantes).
- 10% dos pobres
são desempregados. Tratam-se de pessoas que foram atiradas
para a pobreza devido a dinâmicas económicas (despedimentos por encerramento
ou reestruturações de empresas, etc), muitos deixaram de ter meios para fazer face aos encargos que
tinham. Uma situação que é agravada quando
estes desempregados descobrem que não reunem as
condições necessárias para arranjar novos empregos devido à idade, falta de
qualificações profissionais ou outras.
- Os restantes
30% dos pobres são mais dificeis de enquadrar, pois correspondem a
situações muitos diversificadas: comunidades ciganas, famílias instaladas à
muito na pobreza e que se mostram avessas a programas de inserção social,
marginais, pessoas que se viram na situação de pobreza devido a desestruturações
familiares (divórcios, mortes de conjuges, etc), etc.
No meio de tudo há
uma larga percentagem dos que continuam a ser pobres devido ao modo como encaram
a sua situação. Uma atitude que tem a sua raiz no modo como a sociedade portuguesa
tem visto a própria
pobreza.
Números.
Nas últimas duas décadas as
estatísticas sobre a
pobreza em Portugal
mantém um valor constante: 20% da população é pobre ! (Consultar).
Este valor é tanto mais chocante quanto constatamos que a esmagadora maioria destes pobres
pertencem a famílias que são sistematicamente apoiadas pelo Estado e por
inúmeras entidades privadas. A pobreza tem no país uma dimensão estrutural,
assente numa multiplicidade de factores históricos que continuam a ser muito dificeis de
alterar.
a) Factores
Culturais
Relação com a
pobreza. A Igreja Católica, dominante no país, enalteceu durante
séculos a pobreza como uma virtude. A ambição de ter ou alcançar mais do que
aquilo que se tem foi apresentada como um pecado capital, idêntico à gula. A Inquisição
entre 1536 e 1820 perseguiu e matou de forma sistemática os grupos sociais mais
empreendedores do país, como os cristãos-novos. A ditadura (1926-1974) retomou
este ideário e procurou criar um país rural, povoado por pessoas conformadas e
resignadas à sua sorte. O
catolicismo, na sua forma tradicional, veiculou a ideia que Deus culpabilizava a
acumulação de capital.
Relação com o
trabalho. Pouco depois do inicio da expansão marítima (1415) surgem já as
primeiras criticas à aversão que se começava a manifestar em relação ao
trabalho. Os portugueses estavam a preferir o lucro fácil e rápido, resultante
da pilhagem e venda de escravos ao trabalho metódico e inovador. Em vez de
investir na produção, o país passou a apostar na importação de bens. Esta
tendência consolidou-se no século XVI entre os grupos dominantes, que se
entregam a explorar a população através do Estado ou da Igreja. A
maioria da população, seguindo o exemplo dado pelas elites, abandonam as
actividades produtivas e emigram à procura do seu quinhão numa qualquer parte
do mundo. Os que ficam dedicam-se a pedir esmolas, subsídios ou empregos no
Estado furtando-se ao trabalho produtivo, socialmente
desconsiderado. Viver
de esmolas tornou-se não uma necessidade extrema, mas um modo de vida
socialmente aceite.
Modo de Vida.
A pobreza em países como Portugal constituiu um modo de vida de inúmeros
individuos que vivem à custa de "esmolas", sejam estas dadas pela
própria família quando tem posses para tal ou pela segurança social e
instituições públicas e privadas de solidariedade social. Trata-se de um modo
de vida que lhes permite viver sem assumirem grandes responsabilidades, embora
sem qualquer perspectiva de futuro. Não estamos perante nenhum processo de
conformismo ou resignação, mas de uma opção de vida guiada pela lei do menor
esforço.
b) Factores
Políticos
Dependência. Os enormes investimentos que o Estado
português tem feito na luta contra a irradicação da pobreza tem tido muito
fracos resultados. O dinheiro público é gasto sem que haja qualquer
avaliação credível sobre os resultados da sua aplicação. É fácil constar
que muitas instuições e organismo públicos não actuam de modo a tornar as
pessoas autonómas ou independentes, mas dependentes de forma a justificar a sua
própria existência, garantindo assim a continuidade do emprego dos dirigentes
e funcionários envolvidos no combate à pobreza. Trata-se de um estratégia que
prolongou sob novas formas as antigas práticas de caridade pública, quando as
dávidas dos ricos serviam sobretudo para gerar reverência e dependência por
parte dos pobres.
Prioridades
públicas. Durante séculos os portugueses habituaram-se a verem a maioria
da população a viver com graves carências, mas em contrapartida todos os que
viviam à custa do Estado e na
Igreja Católica esbanjam vastos recursos económicos em proveito próprio
ou em obras improdutivas
e socialmente inúteis. Este facto que tanto chocou os estrangeiros que
visitaram Portugal, era aqui assumido como natural. Ainda hoje é facil de
constatar que a maioria dos impostos sacados aos contribuintes são
prioritariamente aplicados a manter instituições públicas perdulárias. O que
é inacreditável nesta sitaução é que os dirigentes do Estado não se sentem
na obrigação de prestarem contas pelo uso que fazem dos dinheiros públicos,
mas também os cidadãos não assumem que tem o direito e o dever de o
exigirem. Vastos
recursos públicos que podiam ser canalizados para combater a pobreza são
diariamente delapidados na maior das impunidades.
c) Factores
Sociais
Indiferença
Social. Em países como Portugal, onde a diferenças entre os muitos ricos e
os muitos pobres são abissais, constata-se uma chocante a ausência de
sensibilidade social por parte dos mais possuem. A pobreza dos outros não os
afecta, nem sentem qualquer responsabilidade social perante os trabalhadores que
deram o melhor de si para que fossem tão ricos como são. A sua única
preocupação é o aumento da sua riqueza pessoal. Recorde-se que as 500 pessoas
mais ricas em todo o mundo, tem mais dinheiro que 400 milhões de pobres (dados
de 2007).
Esta insensibilidade
social está também patente também nas grandes empresas, onde apesar de
continuarem a acumular elevados lucros todos os anos, se mostram avessas a assumirem qualquer
responsabilidade social no combate à pobreza.
A "classe política" portuguesa
é entre todas das mais indignas, pois nas últimas décadas a maioria dos
políiticos (deputados, autarcas, etc) entregou-se a uma verdadeira rapina dos recursos públicos,
distribuindo entre os seus membros escandalosos subsídios, reformas, etc. que a
legislação por eles aprovada nega a qualquer outro cidadão.
Uma sociedade que
convive pacificamente com esta indiferença social, sem que a mesma seja alvo de
uma censura ou reparo, só pode ser uma sociedade profundamente desigual como é
a portuguesa.
Carlos Fontes |