Navegando na Filosofia - Carlos Fontes

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Breve História da Estética

O belo e a beleza têm sido objecto de estudo ao longo de toda a história da filosofia. A estética enquanto disciplina filosófica, surgiu na antiga Grécia, como uma reflexão sobre as manifestações do belo natural e o belo artístico. O aparecimento desta reflexão sistemática é inseparável da vida cultural das cidades gregas, onde era atribuída uma enorme  importância aos espaços públicos, ao livre debate de ideias. Os poetas, arquitectos, dramaturgos e escultores desfrutavam de um grande reconhecimento social. 

 

Ideal de Beleza

Platão foi o primeiro a formular explicitamente a pergunta: O que é o Belo? O belo é identificado com o bem, com a verdade e a perfeição. A beleza existe em si, separada do mundo sensível. Uma coisa é mais ou menos bela conforme a sua participação na ideia suprema de beleza. Neste sentido criticou a arte que se limitava a "copiar" a natureza, o mundo sensível, afastando assim o homem da beleza que reside no mundo das ideias. 

As obras de arte deviam seguir a razão, procurando atingir tipos ideais, desprezando os traços individuais das pessoas e a manifestação das suas emoções. Platão ligou a arte à beleza. 

Aristóteles concebe a arte como uma criação especificamente humana. O belo não pode ser desligado do homem, está em nós. Separa todavia a beleza da arte. Muitas vezes a fealdade, o estranho ou o surpreendente converte-se no principal objectivo da criação artística. Aristóteles distingue dois tipos de artes:

 

a) as que possuem uma utilidade prática, isto é, completam o que falta na natureza.

 

b) As que imitam a natureza, mas também podem abordar o que é impossível, irracional, inverosímil.

O que confere a beleza a uma obra é a sua proporção, simetria, ordem, isto é, uma justa medida. Aristóteles associou a arte à imitação da natureza. 

 

 

As ideias de Platão e Aristóteles tiveram uma larga influência nas ideias estéticas da arte ocidental. 

 

 

Apolo de Belveder. Cópia romana de uma estátua grega do século IV a.C.

 

Discóbolo (Lançador de Disco). Cópia romana de uma escultura de Mirón (séc.V a.C.).

 

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Grécia, Laocoonte (c.25 a.C.)

Esta escultura ilustra a lenda do sacerdote troiano Laocoonte e dos seus filhos, que, por ordem de Atena, foram estrangulados por duas serpentes vindas do mar.  

 

 

A arte Helenística e Romana, embora influenciadas pelas concepções de beleza platónicas, acentuaram a individualidade física dos corpos e as emoções.

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Dimensão Simbólica

Durante a Idade Média, o Cristianismo, difundiu uma nova concepção da beleza, tendo como fundamento a identificação de Deus com a beleza, o bem e a verdade. 

Santo Agostinho concebeu a beleza como todo harmonioso, isto é, com unidade, número, igualdade, proporção e ordem. A beleza do mundo não é mais do que o reflexo da suprema beleza de Deus, onde tudo emana. A partir da beleza das coisas podemos chegar à beleza suprema (a Deus). 

 

Manuscrito de Las Huelgas  (1220), Iluminura do Comentário ao Apocalipse do Beatus de Liebana 

Mosteiro de Leça do Bailio, Porto (Portugal)

Vitral da Catedral de Leon,

Agnus Dei

 

Catedral de Chartres

 

 

A partir do século XIII , começa a desenvolver-se um estética da luz, que terá  no gótico a sua expressão artística.

 

São Tomás de Aquino identificou a beleza com o Bem. As coisas belas possuem três características ou condições fundamentais: a) Integridade ou perfeição (o inacabado ou fragmentário é feio); b) a proporção ou harmonia (a congruência das partes); c) a claridade ou luminosidade. Como em Santo Agostinho, a beleza perfeita identifica-se com Deus.

 

A Obra Prima

No Renascimento (séculos XV só em Itália, e XVI em toda a Europa), os artistas adquirem a dimensão de verdadeiros criadores. Os génios têm o poder de criar obras únicas, irrepetíveis. Começa a desenvolver-se uma concepção elitista da obra da obra de arte: a verdadeira arte é aquela que foi criada unicamente para o nosso deleite estético, e não possui qualquer utilidade. Entre as novas ideias estéticas que então se desenvolvem são de destacar as seguintes:

a ) Difusão de concepções relativistas sobre a beleza. O belo deixa de ser visto como algo em si, para ser encarado como algo que varia de país para país, ou conforme o estatuto social dos indivíduos. Surge o conceito de "gosto".

b) Difusão de uma concepção misteriosa da beleza, ligada à simbologia das formas geométricas e aos números, inspirada no pitagorismo e neoplatonismo.

c) Difusão de uma interpretação normativa da estética aristotélica. Estabelecem-se regras e padrões fixos para a produção e a apreciação da arte. 

Miguel Ângelo, Criação de Adão, pormenor do fresco na Capela de Sistina  (1508-1512)

Rafael Sanzio, O casamento da Virgem (1504)

 

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Arte Com Regras

Entre os séculos XVI e XVIII continuaram a predominar as estéticas de inspiração aristotélica. Procura-se definir as regras para atingir a perfeição na arte. As academias que se difundem a partir do século XVII, velam pelo seu estudo e aplicação. 

Paralelamente começam a adquirir crescente importância ideias estéticas que afirmam a subjectividade do belo. A questão é reduzida a um problema de gosto (sensitivo, não normativo).   

Hyacinth Rigaud, Luís XIV (1701)

Na segunda metade do século XVIII, a sociedades europeia atravessa uma profunda convulsão. O começo da revolução industrial, a guerra da Independência Americana (1776) e a Revolução Francesa (1789) criaram um clima propício ao aparecimento de novas ideias. O principal movimento artístico deste período, foi o neoclássico que toma como fonte de inspiração a antiga Grécia e Roma. A arte neoclássica será utilizada de forma propagandística durante a Revolução Francesa e no Império napoleónico. 


Jean Auguste Dominique Ingres, Édipo explica o enigma da Esfinge (1808)

É neste contexto que surge I. Kant, o principal criador da estética contemporânea. Para este filósofo os nossos juízos estéticos tem um fundamento subjectivo, dado que não se podem apoiar em conceitos determinados. O critério de beleza que neles se exprimem é o do prazer desinteressado que suscita a nossa adesão. Apesar de subjectivo, o juízo estético, aspira à universalidade.

 

 

Novos Conceitos

Ao longo do século XIX a arte atravessa profundas mudanças. O academismo  é posto em causa; artistas como Courbet, Monet, Manet, Cézanne ou Van Gogh abrem uma ruptura com as suas normas e convenções, preparando desta maneira o terreno para a emergência da arte moderna. Surge então múltiplas correntes estéticas, sendo de destacar as seguintes:

a) A romântica que proclama um valor supremo para a arte (F. Schiller, Schlegel, Schelling, etc). Exalta o poder dos artistas, os quais através das suas obras revelam a forma suprema do espírito humano, o Absoluto.  

b) A realista que defende o envolvimento da arte nos combates sociais. As obras de arte assumem muitas vezes, um conteúdo político manifesto.

 

Gustave Courbet, Os Britadores de Pedra (1849-50)

Coubert tinha uma visão sombria deste tipo de trabalhos, afirmando que rebaixavam o ser humano. O quadro foi destruído durante a IIª. Guerra Mundial.

Caspar David Friedrich, Viajante junto ao mar de neblina (1818)

 

Rupturas

O século XX foi a todos os níveis um século de rupturas. No domínio das práticas artísticas, ocorrem importantes mudanças no entendimento da própria arte, em resultado de uma multiplicidade de factores, nomeadamente:

a ) A integração no domínio da arte de novas manifestações criativas. Umas já existiam mas estavam desvalorizadas, outras são relativamente recentes. Esta integração permitiu esbater as fronteiras entre a arte erudita e a arte para grandes massas. Entre as primeiras destacam-se as artes decorativas, a art naif, a arte dos povos primitivos actuais, o artesanato urbano e rural. Entre as segundas destacam-se a fotografia, o cinema, o design, a moda, a rádio, os  programas televisivos, etc.  Todas estas artes são hoje colocadas em pé de igualdade com as artes consagradas, como a pintura, escultura etc., denominadas também por "Belas Artes". 

b ) Os movimentos artísticos que desde finais do século XIX tem aparecido, em todo o mundo, tem revelado uma mesma atitude desconstrutiva em relação a todas as categorias estéticas. Todos os conceitos são contestados, e todas as fronteiras entre as artes são postas em causa. A arte foi des-sacralizada, perdeu a sua carga mítica e iniciática de que se revestiu em épocas anteriores, tornando-se frequentemente um mero produto de consumo. Quase tudo pode ser  considerado como arte, basta para tanto que seja "consagrado" por um artista. 

c ) No domínio teórico aparecem inúmeras as teorias que defendem novos critérios para apreciação da arte. No panorama das teorias estéticas predominam as concepções relativistas. Podemos destacar  três correntes fundamentais:

- As estéticas normativas concebem a beleza fundamentada em princípios inalteráveis. Entre elas sobressaí a estética fenomenológica de Edmund Husserl.

- As estéticas marxistas e neomarxistas marcadas por uma orientação nitidamente sociológica. O realismo continuou a ser a expressão que melhor se adequa às ideias defendidas por esta corrente. A  arte nos países socialistas, por exemplo, cumpria através de imagens realistas uma importante função: antecipar a "realidade" da sociedade socialista, transformando-a numa utopia concreta. 

- A estética informativa que deriva das teorias matemáticas da informação. Esta estética procura constituir um sistema de avaliação dos conteúdos inovadores presentes numa obra de arte.

 

Man Ray, Le Violon d'Ingres (1924)

 

Joseph Beuys, Das ende des 20, Jahrhunderts (1982-83)

Jean Dubuffet, Dhotel nuance d`abricot (1947)

 

 

  Carlos Fontes

Referências Históricas

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