1.Conceito filosófico da
realidade
A
distinção entre realidade e aparência sempre foi um dos problemas
centrais da filosofia. Foi colocada pela primeira vez por
Parménides, no século VI a.C..
Entende-se vulgarmente por realidade
tudo aquilo que existe ou é, por oposição aquilo que
designamos por nada, aparência, ilusão, desejo, projecto.
Não existe
todavia consenso sobre o que é real (existe), pois a resposta a esta
questão pressupõe desde logo uma dada concepção sobre a própria
realidade.
2. Concepções sobre a
Realidade
A
questão - o que é a realidade? -, tem originado nas várias
correntes filosóficas respostas muito diversas. Cada uma
traduz de uma forma explicita ou implícita uma dada concepção da
mesma.
- Realidade
Sensorial.
O homem comum
como o empirista radical tende a associar a realidade com aquilo que pode ser empiricamente observado.
A realidade existe independentemente da consciência dos indivíduos.
Basta olhá-la para a descobrir e captar na sua totalidade. A realidade é assim algo que
existe independente da consciência dos indivíduos. Esta
posição traduz-se na crença que só as coisas observáveis são
reais. Neste sentido, tudo o que não pode ser captado através dos
sentidos tende a ser negado, ou é tratado como um produto da
imaginação. Estamos perante uma visão ingénua da realidade,
desmentida pela investigação científica.
- Realidade
Científica.
A ciência
dá-nos uma visão objectiva da realidade. Para isso o cientista
municia-se de um método e instrumentos apropriados ao seu objecto
de estudo, selecciona "factos",
"acontecimentos", e interpreta-os à luz de um dada
teoria. A realidade para a ciência é assim uma construção, nunca
é algo dado. Mas esta
realidade é real? A questão prende-se com o conceito de
objectividade e de realidade com que trabalham os o cientistas. É
real tudo aquilo que pode ser observado por mais do que uma pessoa,
e pode ser portanto objecto de um consenso de percepção, e
em especial pode ser provada
(ou refutada) experimentalmente. Se seguirmos os procedimentos
adoptados, em princípio, chegaremos todos à mesma
visão da realidade. A legitimidade destas visões duram
enquanto durar o acordo com os resultados das observações e das
experiências. Nada na ciência é eterno, todas as explicações
são válidas até serem refutadas.
- Realidade Ideal.
A realidade não se
confunde com as imagens efémeras das coisas que obtemos através
dos sentidos. A verdadeira realidade é da ordem das ideias. Só
nestas poderemos encontrar algo imutável e eterno. A
verdadeira realidade está nos próprios indivíduos e não nas
coisas. Parménides e depois Platão numa forma
sistemática, sustentaram esta concepção do real. Outros
filósofos desenvolveram concepções idênticas. Berkeley, no
século XVII, sustentou que a única realidade que existia era a das
nossas percepções.
3.Realidade e
Abstracção
Uma
das formas tradicionais de encarar a realidade é vê-la como um
processo de abstracção. Podemos distinguir diversos níveis de o
fazer:
- Experiência
directa das coisas na sua singularidade.
Cada coisa é única e irrepetível nas suas propriedades.
- Nomeação das
coisas. Ao referimos as coisas
utilizamos os conceitos que nos são dados pela linguagem que usamos. Estes conceitos,
como vimos, são o produto de uma abstracção, através da qual
determinamos o que há de essencial em seres da mesma espécie.
- Estudo
científico das coisas. Cada ciência
dá-nos uma visão própria da realidade, não a realidade como ela
é, mas sim como é vista ou construída numa dada comunidade
científica. Estamos perante um processo de abstracção mais elevado
que aquele que encontramos na linguagem corrente.
- Metafísica.
Na filosofia construiu-se o processo mais abstracto de estudar a
realidade, trata-se da metafísica. A realidade é encarada como um
Todo, para além de todas as determinações. A metafísica pode dividida em duas disciplinas
filosóficas fundamentais:
a)Cosmologia:
Estuda o mundo, abstraindo-se do facto dos seres serem ou não vivos.
b)Ontologia:
Trata do "ser enquanto ser".
4.Realidade e
Linguagem. O Problema dos Universais
Muitas questões tem sido colocadas a propósito das relações da
linguagem com a realidade. Um dos problemas centrais trata-se da
natureza ontológica dos universais, também designados por noções
genéricas, ideias ou entidades: Será que as palavras ou as ideias
têm valor ontológico, ou têm apenas um valor semântico? Um
conceito ou ideia traduz a essência comum a todos os seres da mesma
espécie ou é apenas uma palavra? Estas e outras questões
apaixonaram os homens medievais, originando três correntes
fundamentais: os conceptualistas, os nominalistas e os realista.
a) os
conceptualistas
afirmavam que os conceitos universais apenas existem na nossa cabeça,
são ideias abstractas. Não são meros nomes, nem algo concreto.
b)
os nominalistas afirmam
que os universais são simples palavras, meros símbolos convencionais
que usamos para designar grupos de seres. As únicas coisas que
existem são individuais, os nomes são abstracções.
c) os realistas
afirmam, pelo contrário que os universais são entidades eternas,
imutáveis e inteligíveis como as ideias de Platão.
5.Cosmologia
A cosmologia, enquanto
disciplina filosófica, procura compreender o mundo num elevado
grau de abstracção( o ser mundo). Trata de conceitos como a "quantidade", o
"número", o "lugar" e o "espaço", o
"movimento", o "tempo", as "qualidades",
a "natureza dos corpos", as "propriedades da vida e a
sua origem", etc. É também designada por Metafísica especial,
ou numa perspectiva mais restrita, Filosofia da Natureza.
A cosmologia filosófica pode ser dividida em
três períodos fundamentais:
a) No período clássico, medieval e
renascentista ( de Platão a Descartes) está centrada no problema da
origem e no princípio primordial da natureza ou cosmos.
b) No período moderno (de Descartes a
Einstein) está centrada na problemática da astronomia e na crítica
às deduções à priori.
c) No período contemporâneo ( de Einstein
aos nossos dias) centra-se na discussão das grandes questões
colocadas pela física moderna e na análise lógica das proposições
e conceitos científicos com implicações sobre a cosmologia. A
especulação filosófica cedeu terreno à epistemologia.
5.1. Cosmologia científica
No século XX a cosmologia constituiu-se também
como uma ciência. Trata-se de um ramo da física que estuda a forma
geométrica do mundo e as suas leis gerais. É interessante constatar
que muitos cosmólogos se entregam a especulações que se aproximam
mais da metafísica do que da ciência.
6. Cosmogonias
Uma das questões decisivas da
cosmologia foi sempre a da origem do cosmos. A religião foi a primeira a assumir este
tema, depois a filosofia e por fim coube a vez à ciência.
6.1. Cosmogonias
religiosas. A
explicação da origem do cosmos é na maioria das religiões um dos
seus temas centrais, conferindo sentido não apenas ao mundo,
mas também à existência da vida humana.
Os gregos acreditavam que a realidade era
um todo organizado (cosmos), formada por intervenção divina a partir de um caos inicial.
A matéria era eterna, o que se modifica é a sua forma.
O judaísmo
e o cristianismo concebem a formação do mundo como a
manifestação da vontade de Deus. Tudo
foi por Ele criado a partir do nada (creatio ex nihilo). Poderia
portanto não existir, ou poderá deixar de existir. Tudo depende da
vontade de Deus.
O islamismo
no essencial mantém esta cosmogonia judaico-cristã.
6.2. Cosmogonias Filosóficas
A
explicação da origem e funcionamento do cosmos foi o tema comum aos
primeiros filósofos. Qual o tipo de matéria inicial e como se
foi estruturando eram as grandes questões iniciais. Até aos nossos dias muitos filósofos têm
desenvolvido teorias cosmogónicas.
6.3. Cosmogonias Científicas
A
ciência moderna trouxe consigo um novo tipo de cosmogonias, as que
estava conformes aos conhecimentos científicos que predominam
numa dada época.
Universo Estático. Nos séculos XVII e XVIII
predominou a concepção do universo como um relógio. Criado e posto
a funcionar por Deus, mantinha-se inalterável e funcionava
segundo leis imutáveis. Galileu, Descartes e Newton foram três dos
principais obreiros desta cosmogonia.
Universo Evolutivo ( I ). Em meados do
século XVIII, começam a surgir as primeiras teorias sobre a
criação do cosmos a partir de uma massa caótica inicial. A
intervenção divina é secundarizada ou suprimida. Diderot e
Kant foram dois percursos destas teorias. No século XIX Lamarck e Darwin
estenderam estas concepções evolutivas à espécie humana. A
criação do universo é atribuída a uma dinâmica interna da matéria
fruto de uma
sucessão de felizes acasos.
Universo Evolutivo ( II ). Em 1929,
Edwin Hubble, após vários anos de observações dos céus com o
telescópio de Mount Wilson, anunciou a teoria que o irá marcar o aparecimento das novas
cosmogonias:. As
galáxias estão a afastarem-se entre si. Após a IIª. Guerra Mundial
George
Gamow, provavelmente influenciado pelas recentes explosões atómicas,
apresenta a tese do "Big Bang": o universo quando a matéria atingiu um elevado estado de compressão, entrou numa
fase muito instável, o que terá desencadeado uma explosão que
deu origem ao seu actual estado. Esta teoria em virtude das
descobertas, em 1965, de possíveis vestígios de radiações iniciais
do universo,
tornou-se na principal teoria cientifica sobre a origem do
universo.
Apesar de todas as teorias cosmológicas
construídas ao longo da história da humanidade, as grandes
questões continuam por explicar. "De Onde Viemos ?",
continua a ser hoje tão enigma como há 100 mil anos atrás. A grande
diferença está na atitude como a encaramos. Antes a questão
mobilizava povos inteiros e era susceptível de infundir medo perante
o desconhecido. Hoje tornou-se matéria de investigação e reflexão de
especialistas.
7. Ontologia. O Estatuto do Ser
Para muitos filósofos o objectivo
fundamental da filosofia está na compreensão integral da realidade,
isto é, do Ser. Mas o que é o Ser? O ente? a substância? os
acidentes? a essência? a existência? Estes são alguns conceitos
fundamentais que os filósofos foram criando para se referirem a tudo
o que é, tem ser ou participa do ser.
Carlos Fontes