Navegando na Filosofia. Carlos Fontes

Análise Crítica dos Métodos Científicos

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Textos

 

 

  O romance policial perfeito existe na imaginação. Esse romance mostra todos os fios da meada ou pistas essenciais, e compele-nos a formular a nossa teoria pessoal sobre o caso. Se seguirmos cuidadosamente o enredo, por nós próprios descobriremos a solução, antes que o autor no-la desvende no fim do livro. E, além de nos aparecer no momento exacto em que a esperamos, não nos desaponta - ao contrário do que se dá nos mistérios vulgares.

Ser-nos-á possível comparar o leitor de tal romance aos cientistas que através de sucessivas gerações continuam a procurar a chave dos mistérios do livro da natureza? A comparação é falsa; (...) mas  possui uma parcela de justificação que pode ser alargada e modificada com proveito para o esforço da ciência no decifrar dos mistérios do Universo.

O grande romance policial do Universo está ainda sem solução: e nem sequer podemos afirmar que comporte solução. A sua leitura já nos deu muito; ensinou-nos os rudimentos da língua da natureza, Albert Einstein e Leopold Infeld, Evolução da Física.

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Síntese da Matéria

Análise Crítica dos Métodos Científicos

 

 

1. Ciências de Referência

Todos as definições genéricas sobre ciência continuam a repetir invariavelmente conceitos extraídos das denominadas ciências experimentais, entre as quais se destaca a física. Quando no século XVII a física se tornou numa ciência experimental, os seus métodos  tornaram-se o padrão para as restantes ciências. No século XIX, o positivismo consagra esta concepção. Os conhecimentos da  física  são considerados  como proposições sobre a  totalidade da natureza.  Muitas vezes proclama-se que uma verdadeira filosofia deve ser uma ciência natural. Esta concepção encontra-se totalmente ultrapassada.

O grande objectivo das ciências experimentais é dar por meio de conceitos apropriados e deduzidos da experiência, uma representação mental dos processos que objectivamente se desenrolam na natureza.  

2.A Importância do Método na Ciência

 A objectividade do conhecimento científico é desde o século XVI, associado ao rigor do método de investigação utilizado. Nas ciências experimentais, o método assenta, em termos correntes, em quatro fases fundamentais: Observação, Hipótese, Experimentação e Formulação de leis:.

3. Observação

O cientista não tem uma atitude passiva face aos fenómenos, dado que não se limita a registar factos. Pelo contrário a observação científica implica:

- Uma selecção dos dados a observar em função de um dado modelo teórico que o cientista já dispõe, que determina o que deve ser observado e como deve ser observado. Neste sentido uma observação é já uma interpretação. O essencial é separado do acessório, unificando-se a diversidade empírica.

- A observação pode dar origem a múltiplas experiências cuja finalidade é proporcionar uma melhor observação dos fenómenos em condições controladas.

- A observação é mediatizada por instrumentos (microscópios, telescópios, etc), mas também por uma linguagem específica( a matemática, por exemplo) que permite conferir maior rigor à recolha de dados. É interessante verificar que o aparecimento da ciência moderna coincide com o aparecimento de inúmeros instrumentos de medida. 

4.Hipótese

Trata-se do momento inventivo da investigação. Uma hipótese é uma explicação provisória sobre as relações entre dois ou mais  fenómenos. É costume afirmar-se que estas explicações são obtidas através de induções e de deduções.

- Após ter observado as relações ou as propriedades comuns a vários fenómenos da mesma espécie, através de um raciocínio indutivo extraí-se uma lei comum. Galileu, por exemplo, após ter realizado várias experiências de queda de corpos supôs que todos os corpos caem ao mesmo tempo, independentemente do seu peso.

- Para controlar a validade e a generalidade destas relações, formula-se a hipótese da sua generalidade, através de um raciocínio dedutivo, procurando-se extrair as consequências destas relações. Estabelece-se então um teoria científica. 

-Uma hipótese considera-se adequada quando cumpre algumas condições, tais como: a) ser compatível com os factos estudados; b)Ser coerente com outras hipóteses anteriormente admitidas; c)Permitir que se façam observações ou experiências que a confirmem ou refutem; 

4.Experimentação

Trata-se de  "testar" a  hipótese na sua máxima generalidade  em condições controladas.  No caso da hipótese ser refutada pela experiência, volta-se ao início do processo. 

5. Formulação de  leis

Confirmada a hipótese na sua máxima generalidade, pode então formular-se uma lei. O princípio base de uma lei é a sua universalidade, enunciada da seguinte forma: sempre que nas mesmas circunstâncias ocorram as mesmas causas, produzir-se-ão os mesmos efeitos.

6. Este método tem sido objecto de inúmeras críticas. Alguns autores afirmam que o mesmo jamais foi aplicado, questionando-se alguns dos seus conceitos fundamentais.

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Crítica do conceito do Método Experimental (Indutivo)

 

       

       O método experimental (indutivista) tem sido objecto de várias críticas. 

 

       David Hume foi o primeiro a colocar em causa a legitimidade deste método para a partir da observação de casos singulares e particulares extrair leis gerais e universais. Não podemos legitimar a passagem de casos particulares a leis universais. A conclusão indutiva não é logicamente irrefutável.

 

       Experiências passadas não podem comprovar situações que ainda não ocorreram, como acontece nas leis científicas. Ex. Por o Sol ter surgido ontem, não podemos ter a certeza absoluta que amanhã esta ocorrência se venha a verificar. Neste sentido, o conhecimento cientifico é apenas probabilístico não absoluto.

 

       Karl Popper considera o indutivismo como um mito que contamina as ciências da natureza. A prática cientifica é diversa da concepção teórica sobre os procedimentos seguidos na investigação. 

 

       Ao contrário do que se afirma, os cientistas não partem de observações, mas de problemas.   

 

       Os cientistas partem sempre de conhecimentos ou expectativas quando estudam um dado problema. As observações não são puras, estão impregnadas de teorias, conceitos, expectativas, etc.

 

       A observação apresenta-se assim como um confronto entre as suas expectativas e teorias dos cientistas e os factos observados, gerando novos problemas. Nem tudo o que se pensava sobre caso é corroborado pela observação.

       

       À semelhança de Hume, questiona que a indução possa servir de elemento de prova. Não é possível logicamente extrair de um conjunto de observações particulares, um princípio de alcance universal, isto é, aplicável às restantes observações que não foram feitas.

       

        Método Hipotético-Dedutivo:

 

        1. Os problemas são o ponto de partida da investigação cientifica;

 

        2. Perante um problema criam-se  hipóteses (conjecturas), isto é, prováveis soluções do mesmo;

 

        3. Deduzem-se em seguida consequências da hipótese;

 

        4. Testam-se depois as consequências, recorrendo, por exemplo, a observações e experiências. O objectivo é verificar se as mesmas são incompatíveis com a hipótese (falsificabilidade);

 

        5.  Esta verificação das consequências não nos garante que a hipótese esteja certa, mas apenas nos permite verificar a sua compatibilidade com as consequências dela deduzidas. Se as mesmas não superarem os testes, a hipótese estará "falseada" ou "refutada". Se superar estará corroborada, isto é, confirmada provisoriamente.

 

         6. O conhecimento científico é hipotético e provisório, não é definitivo.

  

 

        O que distingue o conhecimento científico de outros tipos de saber é que o mesmo não depende do procedimento indutivo, mas assenta no princípio da falsificação (refutação) empírica (através da experiência) das proposições. 

O conhecimento cientifico é refutável. 

 

"As teorias mais válidas nunca são teorias verdadeiras, mas apenas teorias que ainda não são falsas", Jean Baudouin, Karl Popper.

 

 

Como Newton descobriu a Lei da Gravitação Universal, segundo J. Bronowski

      De uma maneira geral temos a propensão para pensar que toda a ciência é um processo lógico de natureza indutiva. A partir da observação de uma série de factos similares, o cientista formula uma hipótese de causalidade comum. Trata-se  segundo J.Bronowski de uma  ideia frequentemente errada. Newton, por exemplo, terá chegado à concepção da Lei da Gravitação Universal por um processo muito distinto. 


      De Galileu e de outros italianos, recolheu certas noções gerais sobre o comportamento das massas  que percorrem rectas em movimento uniforme, a menos que uma força as desvie, e outros princípios similares.


      O momento decisivo para a descoberta, ocorreu quando Newton supôs que as regras que as massas de razoável grandeza parecem obedecer, eram também verdadeiras para todas as partículas da matéria, independentemente da sua grandeza. Deste modo, começou a construir um modelo, onde as mais ínfimas partículas obedeciam as mesmas leis ou axiomas. Estas partículas - que Newton nunca identificou explicitamente com os átomos -, estavam reunidas em massas, tais como a maçã, a lua, planetas ou o Sol. Era suposto que se as mesmas estivessem em repouso, assim permaneceriam; Mas se estivessem em movimento todas se moveriam em linha recta, a menos que uma força exterior a fizesse deslocar noutra direcção.

 

       Neste mundo fictício, Newton, faz então intervir uma força:  - A que provém de cada minúscula partícula quando atrai cada uma das outras com uma força que depende unicamente da distância que as separa: se a distância duplica a forca diminui de um quarto. A alteração da distância corresponde a uma alteração de força na proporção inversa do quadrado da distância.


      A partir daqui Newton, pode então sustentar que num mundo que diferisse da lei que havia enunciado, os corpos celestes redondos não funcionariam como pontos isolados de matéria concentrada, e de um modo geral, as trajectórias dos planetas não podiam ser calculáveis nem eram estáveis.


       Este vasto modelo que estava longe de ser simplesmente deduzido do mundo real, mostrou-se surpreendentemente capaz de o explicar e prever os seu movimentos. A ficção permitira desvendar os mistérios da realidade.

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7.Ciências da Natureza e Ciências do Homem

Apesar dos sucessos alcançados pelo método experimental  nas ciências naturais, no século XIX, começou a ser posto em causa a sua adequação para todas as ciências, nomeadamente as ciências sociais e humanas( história, sociologia, psicologia, antropologia, etc). Dilthey, como vimos, introduziu então uma distinção entre ciências da natureza e ciências do espírito.

8. Métodos Quantitativos e Métodos Qualitativos

A distinção entre ciências da natureza e as ciências  sociais e humanas, acabou por estimular a consagração de dois tipos de metodologias, as quantitativas e as qualitativas.

a) As metodologias quantitativas seriam as mais apropriadas para todos os fenómenos matematizáveis, como os que ocorrem na natureza. A método de referência destas ciências seria o método experimental. Tratam-se de metodologias reconhecidas como muito objectivas, que nos dão  uma explicação precisa dos fenómenos observados.

b)As metodologias qualitativas seriam as mais recomendáveis para o estudo de fenómenos mais complexos, como os humanos. Nestas ciências acabaram por aparecer toda uma série de metodologias de estudo, apoiadas em análises de conteúdo de documentos, entrevistas, observações participantes, etc., procurando dar conta de aspectos específicos da realidade humana. Tratam-se de metodologias onde são mais evidentes os conflitos de interpretações, e notória a subjectividade do cientista.

Esta distinção originou igualmente uma dicotomia interminável de conceitos (objectividade/subjectividade, quantidade/qualidade, explicação/compreensão,etc), que pretendem traduzir o fosso que existiria entre os dois tipos de ciências e de metodologias. Embora ainda muito difundida, não tem qualquer fundamento objectivo, na medida que nada impede que um cientista aplique um ou outro método, num ou noutro tipo de ciência. 

8. A Questão da cientificidade

A questão decisiva em qualquer ciência é, contudo, sempre a mesma: o que permite garantir a validade dos dados e das teorias, isto é, conferir legitimidade científica aos resultados da investigação? 

A confrontação com os factos continua a ser o critério essencial para a validação dos dados ou de uma teoria. Mas estes, como Karl Popper afirmou, não nos garantem a verdade, mas apenas a refutabilidade ou não das hipóteses colocadas.

 

Carlos Fontes 

Carlos Fontes

 11º Ano - Programa de Filosofia  

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