1.
Ciências de Referência
Todos as definições genéricas sobre
ciência continuam a repetir invariavelmente conceitos extraídos das
denominadas ciências experimentais, entre as quais se destaca a
física. Quando no século XVII a física se tornou numa ciência
experimental, os seus métodos tornaram-se o padrão para as
restantes ciências. No século XIX, o positivismo consagra esta
concepção. Os conhecimentos da física são
considerados como proposições sobre a totalidade da
natureza. Muitas vezes proclama-se que uma verdadeira filosofia
deve ser uma ciência natural. Esta concepção encontra-se totalmente
ultrapassada.
O grande objectivo das ciências
experimentais é dar por meio de conceitos apropriados e deduzidos da
experiência, uma representação mental dos processos que
objectivamente se desenrolam na natureza.
2.A Importância do Método na Ciência
A objectividade do conhecimento científico
é desde o século XVI, associado ao rigor do método de
investigação utilizado. Nas ciências experimentais, o método
assenta, em termos correntes, em quatro fases fundamentais:
Observação, Hipótese, Experimentação e Formulação de leis:.
3. Observação
O cientista não tem
uma atitude passiva face aos fenómenos, dado que não se limita a
registar factos. Pelo contrário a observação científica implica:
- Uma selecção dos dados a observar em
função de um dado modelo teórico que o cientista já dispõe, que
determina o que deve ser observado e como deve ser observado. Neste
sentido uma observação é já uma interpretação. O essencial é
separado do acessório, unificando-se a diversidade empírica.
- A observação pode dar origem a múltiplas
experiências cuja finalidade é proporcionar uma melhor observação
dos fenómenos em condições controladas.
- A observação é mediatizada por
instrumentos (microscópios, telescópios, etc), mas também por uma
linguagem específica( a matemática, por exemplo) que permite conferir maior
rigor à recolha de dados. É interessante verificar que o
aparecimento da ciência moderna coincide com o aparecimento de
inúmeros instrumentos de medida.
4.Hipótese
Trata-se do momento
inventivo da investigação. Uma hipótese é uma explicação
provisória sobre as relações entre dois ou mais fenómenos.
É costume afirmar-se que estas explicações são obtidas através de
induções e de deduções.
- Após ter observado as relações ou as
propriedades comuns a vários fenómenos da mesma espécie, através
de um raciocínio indutivo extraí-se uma lei comum.
Galileu, por exemplo, após ter realizado várias experiências de
queda de corpos supôs que todos os corpos caem ao mesmo tempo,
independentemente do seu peso.
- Para controlar a validade e a generalidade
destas relações, formula-se a hipótese da sua generalidade,
através de um raciocínio dedutivo, procurando-se extrair as
consequências destas relações. Estabelece-se então um teoria
científica.
-Uma hipótese considera-se adequada quando
cumpre algumas condições, tais como: a) ser compatível com os
factos estudados; b)Ser coerente com outras hipóteses anteriormente
admitidas; c)Permitir que se façam observações ou experiências que
a confirmem ou refutem;
4.Experimentação
Trata-se de
"testar" a hipótese na sua máxima generalidade
em condições controladas. No caso da hipótese ser refutada pela
experiência, volta-se ao início do processo.
5. Formulação de leis
Confirmada a hipótese na sua máxima generalidade, pode então
formular-se uma lei. O princípio base de uma lei é a sua
universalidade, enunciada da seguinte forma: sempre que nas mesmas
circunstâncias ocorram as mesmas causas, produzir-se-ão os mesmos efeitos.
6. Este método tem sido objecto de inúmeras
críticas. Alguns autores afirmam que o mesmo jamais foi aplicado,
questionando-se alguns dos seus conceitos fundamentais.
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Crítica
do conceito do Método Experimental (Indutivo) |
O método experimental (indutivista) tem sido objecto de várias
críticas.
David Hume
foi o primeiro a colocar em causa a legitimidade deste método para a partir da
observação de casos singulares e particulares extrair leis gerais e
universais. Não podemos legitimar a passagem de casos particulares a leis
universais. A conclusão indutiva não é logicamente irrefutável.
Experiências passadas não podem comprovar situações que ainda não
ocorreram, como acontece nas leis científicas. Ex. Por o Sol ter surgido ontem,
não podemos ter a certeza absoluta que amanhã esta ocorrência se venha a
verificar. Neste sentido, o conhecimento cientifico é apenas probabilístico
não absoluto.
Karl Popper
considera o indutivismo como um mito que contamina as ciências da
natureza. A prática cientifica é diversa da concepção teórica sobre os
procedimentos seguidos na investigação.
Ao contrário do que se afirma, os cientistas não partem de observações,
mas de problemas.
Os cientistas partem sempre de conhecimentos ou expectativas
quando estudam um dado problema. As observações não são puras, estão
impregnadas de teorias, conceitos, expectativas, etc.
A observação apresenta-se assim como um confronto entre as suas expectativas e
teorias dos cientistas e os factos observados, gerando novos problemas. Nem tudo
o que se pensava sobre caso é corroborado pela observação.
À semelhança de Hume, questiona que a indução possa servir de elemento de
prova. Não é possível logicamente
extrair de um conjunto de observações particulares, um
princípio de alcance universal, isto é, aplicável às
restantes observações que não foram feitas.
Método Hipotético-Dedutivo:
1. Os problemas são o ponto de partida da investigação cientifica;
2. Perante um problema criam-se hipóteses (conjecturas), isto é,
prováveis soluções do mesmo;
3. Deduzem-se em seguida consequências da hipótese;
4. Testam-se depois as consequências, recorrendo, por exemplo, a observações e
experiências. O objectivo é verificar se as mesmas são incompatíveis
com a hipótese (falsificabilidade);
5. Esta verificação das consequências não nos garante que a
hipótese esteja certa, mas apenas nos permite verificar a sua compatibilidade
com as consequências dela deduzidas. Se as mesmas não superarem os testes, a
hipótese estará "falseada" ou "refutada". Se superar
estará corroborada, isto é, confirmada provisoriamente.
6. O conhecimento científico é hipotético e provisório, não é definitivo.
O que distingue o conhecimento científico de outros tipos de
saber é que o mesmo não depende do procedimento indutivo, mas
assenta no princípio da falsificação (refutação)
empírica (através da experiência) das proposições.
O
conhecimento cientifico é refutável.
"As
teorias mais válidas nunca são teorias verdadeiras, mas apenas
teorias que ainda não são falsas", Jean Baudouin, Karl
Popper.
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Como Newton
descobriu a Lei da Gravitação Universal, segundo J.
Bronowski
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De uma maneira geral temos a propensão para pensar que toda
a ciência é um processo lógico de natureza indutiva. A partir
da observação de uma série de factos similares, o cientista
formula uma hipótese de causalidade comum. Trata-se
segundo J.Bronowski de uma ideia frequentemente errada. Newton,
por exemplo, terá chegado à concepção da Lei da Gravitação Universal
por um processo muito distinto.
De Galileu e de outros italianos, recolheu certas noções
gerais sobre o comportamento das massas que percorrem
rectas em movimento uniforme, a menos que uma força as
desvie, e outros princípios similares.
O momento decisivo para a descoberta, ocorreu quando Newton supôs
que as regras que as massas de razoável grandeza parecem obedecer,
eram também verdadeiras para todas as partículas da matéria,
independentemente da sua grandeza. Deste modo, começou a
construir um modelo, onde as mais ínfimas partículas
obedeciam as mesmas leis ou axiomas. Estas partículas - que
Newton nunca identificou explicitamente com os átomos -,
estavam reunidas em massas, tais como a maçã, a lua, planetas ou o
Sol. Era suposto que se as mesmas estivessem em repouso, assim
permaneceriam; Mas se estivessem em movimento todas se moveriam em linha
recta, a menos que uma força exterior a fizesse deslocar
noutra direcção.
Neste mundo fictício, Newton, faz então intervir uma força:
- A que provém de cada minúscula
partícula quando atrai cada uma das outras com uma força que
depende unicamente da distância que as separa: se a distância duplica a forca
diminui de um quarto. A alteração
da distância corresponde a uma alteração de força na proporção
inversa do quadrado da distância.
A partir daqui Newton, pode então sustentar que num mundo que
diferisse da lei que havia enunciado, os corpos celestes
redondos não funcionariam como pontos isolados de matéria
concentrada, e de um modo geral, as trajectórias dos planetas
não podiam ser calculáveis nem eram estáveis.
Este vasto modelo que estava longe de ser simplesmente
deduzido do mundo real, mostrou-se surpreendentemente capaz de
o explicar e prever os seu movimentos. A ficção permitira
desvendar os mistérios da realidade.
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7.Ciências da Natureza e Ciências do Homem
Apesar dos sucessos
alcançados pelo método experimental nas
ciências naturais, no século XIX, começou a ser posto em causa a
sua adequação para todas as ciências, nomeadamente as ciências sociais e humanas( história,
sociologia, psicologia, antropologia, etc). Dilthey, como vimos,
introduziu então uma distinção entre ciências da natureza e
ciências do espírito.
8. Métodos Quantitativos e Métodos Qualitativos
A distinção entre
ciências da natureza e as ciências sociais e humanas, acabou
por estimular a consagração de dois
tipos de metodologias, as quantitativas e as qualitativas.
a) As metodologias quantitativas seriam as
mais apropriadas para todos os fenómenos matematizáveis, como os que ocorrem na natureza.
A método de referência destas ciências seria o método
experimental. Tratam-se de metodologias reconhecidas como muito
objectivas, que nos dão uma explicação precisa dos fenómenos
observados.
b)As metodologias qualitativas seriam as mais
recomendáveis para o estudo de fenómenos mais complexos, como os humanos.
Nestas ciências acabaram por aparecer toda uma série de metodologias
de estudo, apoiadas em análises de conteúdo de documentos,
entrevistas, observações participantes, etc., procurando dar conta
de aspectos específicos da realidade humana. Tratam-se de
metodologias onde são mais evidentes os conflitos de
interpretações, e notória a subjectividade do cientista.
Esta distinção originou
igualmente uma dicotomia interminável de conceitos
(objectividade/subjectividade, quantidade/qualidade, explicação/compreensão,etc),
que pretendem traduzir o fosso que existiria entre os dois tipos
de ciências e de metodologias. Embora ainda muito
difundida, não tem qualquer fundamento objectivo, na medida que nada impede que
um cientista aplique um ou outro método, num ou noutro tipo de
ciência.
8. A Questão da cientificidade
A questão decisiva em qualquer ciência
é, contudo, sempre a mesma: o que permite garantir a validade dos dados
e das teorias, isto é, conferir legitimidade científica aos
resultados da investigação?
A confrontação com os factos continua a
ser o critério essencial para a validação dos dados ou de uma
teoria. Mas estes, como Karl Popper afirmou, não nos garantem a
verdade, mas apenas a refutabilidade ou não das hipóteses colocadas.
Carlos Fontes