Colégios e Repúblicas de Coimbra
D. Dinis fundou a Universidade (Estudos Gerais) em Lisboa (1288). Em 1308 foi transferida para Coimbra. Voltou a Lisboa em 1328, para regressar a Coimbra em 1354. Volta de nova a Lisboa em 1377, para regressar definitivamente a Coimbra em 1537. Uma das singularidades desta universidade foi o facto de ter sido praticamente a única em Portugal durante séculos (1).
Corria o ano de 1527 quando D. João III foi para Coimbra para fugir à peste que grassava em Lisboa. Esta mudança despertou-o para a necessidade de uma mudança no sistema de ensino secundário e superior em Portugal. O novo prior do Mosteiro de Santa Cruz - Frei Brás de Braga, formando em Paris - acabou por ser o obreiro desta transformação.
Durante algumas décadas a universidade revelou grande abertura às novas correntes de pensamento, mas rapidamente devido ao movimento da contra-reforma, perseguição da Inquisição e ao monopólio do ensino pelos jesuítas tornou-se num bastião do conservadorismo. No século XVIII, sob o impulso da reforma pombalina ocorreu uma nova abertura, agora às ciências da natureza e experimentais (2).
Outra enorme mudança ocorreu a partir de 1942, quando da ditadura decidiu reconstruir o edificado da Universidade. Mais de 200 prédios foram demolidos na Alta de Coimbra, e erguidos grandes blocos para instalar as faculdades e outros serviços académicos.
Vista de Coimbra, in, Civitates Orbis Terrarum, Georg Braun, 1575
Antigos Colégios de Coimbra
As várias ordens religiosas e militares criaram em Coimbra colégios para alojarem todos aqueles que nas mesmas pretendiam seguir cursos superiores. Para além de alojamentos para os estudantes e professores, estes colégios possuiam igrejas, refeitórios, bibliotecas e outros serviços. Estes colégios eram em tudo semelhantes aos que podemos visitar em Cambridge ou Oxford.
Com a extinção das ordens religiosas, em 1834, os colégios foram encerrados. Os seus magnificos edificios foram vendidos pelo Estado a particulares, sofrendo a partir daí todo o tipo de alterações. Desta forma um riquissimo património existente na cidade de Coimbra foi destruído e saqueado.
Apesar disto, o que resta destes colégios permite-nos ter uma ideia da sua dimensão, riqueza e funções na Universidade de Coimbra antes de 1834. O problema do alojamento dos estudantes que resultou da sua extinção, como veremos, foi em parte colmatado pela proliferação das "repúblicas".
Percurso: Inicie o percurso a partir do Mosteiro de Santa Cruz.
Mosteiro de Santa Cruz
Fundado em 1131 pela Ordem dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, foi o primeiro grande centro intelectual do reino de Portugal. É prova disso o espólio que nos chegou da sua Biblioteca. Panteão Nacional onde estão sepultados D. Afonso Henriques e D. Sancho I.
Entre os muitos elementos de excepcional importância histórica e artística, são assinaláveis: Frontaria ( Diogo Pires-o-Moço, Diogo de Castilho, Nicolau Chanterene e Juão de Ruão), Igreja (Boitaca e Diogo Castilho), Sacristia (Pedro Nunes Tinoco, 1622-24), Capítulo (túmulo de S. Teotónio, autoria de Tomé Velho, 1582), Claustro do Silêncio (Marcos Pires,1517), Cadeiral (mestre Machim,1512), Orgão (Gomes Herrera, 1719-1724), e o Santuário. Fora do edificio, o antigo Refeitório (Sala da Cidade, pertencente à CMC) e o Jardim da Manga que estava no centro de um claustro que foi destruído. O Parque de santa Cruz (Jardim da Sereia), fazia parte do mosteiro, tendo sido mandado construir pelo prior Frei D. Gaspar da Encarnação, ministro de D. João V (1723-1752).
Ao longo dos século sofreu inúmeras mudanças e destruições. Da sua estrutura medieval quase nada resta, pois durante o reinado de D. Manuel I foi quase tudo refeito: Igreja, Capitulo e o Claustro. As obras prosseguiram, mas as grandes alterações ocorreram depois de 1834, quando a Câmara Municipal de Coimbra decidiu ocupar parte do mosteiro e começá-lo a amputar as suas dependências, como um claustro.
Claustro do Silêncio, Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra
Santuário das Relíquias, Mosteiro de Santa Cruz. Construído por volta de 1730, para reunir num mesmo espaço as reliquias do mosteiro. Numa sala eliptica, destacam-se seis pirâmides-relicários, de seis alvéolos, cujas três faces visiveis , possuem reliquias dos santos de cada um dos meses do ano liturgico. O vértice de cada pirâmide, tem um estrela de oito pontas, tendo no centro uma reliquia. A contabilidade das reliquias acumuladas é revelador do antigo poder deste mosteiro: 870 relíquias de 589 santos, incluindo 6 apostolos (S. Pedro, S. Paulo), 46 papas, 20 reis e rainhas canonizados, 54 bispos, 15 abades, 231 martires e 57 virgens. Entre as suas relíquias mais sagradas contam-se as de S. Teotónio (primeiro santo português), Santa Comba e os Santos Martíres de Marrocos. A estética é barroca, mas com um simbólica que muitos afirmam ser maçónica (1).
Rua da Sofia
A Rua da Sabedoria (Sofia) começou a ser aberta entre 1533 e 1535, para aí serem construídos os colégios da Universidade de Coimbra. Foi projetada por Diogo de Castilho. No final do século XVI era uma das ruas mais largas Portugal, que causa espanto na época pelo seu urbanismo e edificado. Foi consagrada pela UNESCO como Património da Humanidade (2013).
A maioria dos edificios dos antigos colégios na rua da Sofia, incluindo as suas Igrejas e claustros, estão fechados. Uma situação completamente absurda. A Câmara Municipal de Coimbra, conhecida por tratar muito mal o património da cidade, faz propaganda destes colégios, mas não tratou do acesso aos mesmos.
Percurso:
1. Real Colégio das Artes (1548-1566) / Inquisição (1566-1821).
Ocupou as instalações do Colégio de S. Miguel (concl.1546) e de Todos os Santos (concl. 1536), os primeiros colégios a serem construidos. A adaptação foi realizada por Diogo de Castilho (1549). Fica junto ao Mosteiro de Santa Cruz, a quem pertenciam os terrenos e as casas. Em 1555 foi entregue à Companhia de Jesus, que por sua vez em 1566 o cedeu ao Tribunal do Santo Ofício - Inquisição (1566-1821). Alberga atualmente o Centro de Artes Visuais de Coimbra (1997-2003)
Real Colégio das Artes/Pátio da Inquisição/Centro de Artes Visuais.
2. Colégio do Espírito Santo ou de S. Bernardo (1541).
Ordem de Cister. Em 1838 passou a propriedade particular. Parte do mesmo, no século XIX, foi transformado num palacete. Possui dois claustros, vestigios do antigo refeitório cisterciense.
Colegio de S. Bernardo
3. Colégio do Carmo (1540).
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Ordem dos Carmelitas Calçados (1547). Está instalado um Hospital-Asilo da Venerável Ordem Terceira de S. Francisco. No interior da igreja encontra-se o túmulo de João de Ruão. No claustro 19 painéis de azulejos (séc. XVIII). |
Claustro do Colégio do Carmo
4. Colégio da Graça (1543).
Ordem dos Eremitas de Santo Agostinho. Projecto de Diogo de Castilho. Em 1828-34 foi hospital das tropas miguelistas. Passou para posse da Câmara Municipal de Coimbra que o deu ao exercito. Em 1998 saiu o exercito, mas ficaram diversos serviços a ele ligados. A Universidade de Coimbra está finalmente a reocupar este espaço.
Igreja do Colégio da Graça
5. Colégio de S. Pedro dos Terceiros (1543-1548).
Ordem dos Franciscanos calçados. Ficava situado junto ao Colégio de S. Tomás. Em 1572 muda-se para junto da universidade. As suas instalações na rua da Sofia foram dadas à Ordem Terceira Regular de S. Francisco. Esta igreja foi profundamente remodelada no século XVII. Em 1869 foi vendido a particulares. Em 1877 passou a albergar o Asilo da Mendicidade de Coimbra, e está hoje transformado na Casa de Repouso de Coimbra.
6. Colégio de S. Tomás (1543).
Ordem de S. Domingos. Atual Tribunal da Relação). Projecto de Diogo de Castilho. No século XIX foi adquirido pelo Conde do Ameal que o transformou num edificio neoclássico. Foi adquirido pelo Estado que, em 1928, o transformou, por sua vez, no Palácio da Justiça. O seu portal desenhado por Diogo de Castilho foi colocado por volta de 1912 na fachada norte do Museu Machado de Castro.
Colégio de S. Tomás/Tribunal da Relação
7. Colégio de São Boaventura (1543).
Ordem dos Franciscanos Conventuais da Provincia de Portugal. Foi vendido a particulares em 1859. Está muito descaracterizado, com multiplas ocupações (comerciais, etc).
Colégio de S. Boaventura. Do colégio, incluindo a igreja, pouco resta.
Ao pouca distância deste colégio, são visiveis os restos da igreja do Convento de S. Domingos. Foi projetada por Isidoro Almeida (1560). Funciona um inacreditável (de mau gosto) centro comercial.
A Rua de Santa Sofia termina com a Igreja de Santa Justa, cujas obras se iniciaram em 1710, para substituir a primitiva Igreja românica que estava situada no Terreiro das Ervas.
Igreja de Santa Justa
Ruinas da primitiva igreja românica, no Terreiro das Ervas
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