Nacionalismo ou
Ignorância ? Os
programas sobre a cultura popular brasileira, produzidos no Brasil e difundidos
em Portugal através da rede de canais por cabo, são para os portugueses
magníficos programas de humor devido aos seus comentários. Ainda
recentemente, no canal GNT (ligado à Globo), transmitia-se uma perspectiva
sobre as festas de São João, Santo António e São Pedro em várias regiões
do Brasil. As tradições que mostravam ligadas a estes santos eram tipicamente portuguesas, sem
paralelo em nenhuma outra parte da Europa. No entanto, os vários especialistas
brasileiros que foram chamados a comentá-las afirmavam as coisas mais
disparatadas sobre a sua origem, chegando a atribui-las a recônditas regiões
da Europa onde não há memória que tais festividades alguma vez tenham
existido ou fossem festejadas daquela forma. Nenhum destes reputados especialistas
se referiu ao longo do programa a Portugal ou à origem portuguesa das
tradições que comentavam. Esta
aparente ignorância, que não pode deixar provocar gargalhadas, embora tenha uma justificação:
o nacionalismo brasileiro fabricado pela República. Desde a sua implantação, em 1889, que a república
brasileira procurou anular no país as referências
às suas raízes lusitanas. Essa foi
uma das formas que encontrou para se demarcar do regime monárquico
(1822-1889), muito ligado a Portugal através da família real. O
"português" torna-se então na figura central das piadas brasileiras. Portugal,
é evocado como uma
terra que no passado possuiu heróicos navegadores, mas cuja missão histórica se esgotou na descoberta
do Brasil e no inicio da sua colonização. A partir do século XVII, o Brasil
é obra do povo brasileiro. Um "povo" muito distinto dos portugueses.
Os únicos que são lembrados são os nascidos no Brasil. Os restantes não
contam. São os
primeiros que comandam a política portuguesa em relação a esta colónia.
Batem-se na Europa, na América e em África pela consolidação e expansão do
Brasil. Os caciques locais que se envolvem em acções de fragmentação do seu
território são rapidamente transformados em nacionalistas, em obreiros da
nação brasileira. O disparate é total. Portugal é completamente secundarizada na sua construção e povoamento ao
longo de mais de três séculos. Depois da independência é também apagada a
importância da sua enorme comunidade de milhões de imigrantes. A presença dos
portugueses no Brasil passa a ser vista como um mal que o "povo"
brasileiro suportou e do qual, após muitas lutas se conseguiu libertar dos seus
opressores. O
nacionalismo brasileiro, criado pelos republicanos, não tardou em entrar
num processo auto-fágico no qual foi devorando a história do país e as suas
próprias raízes culturais. Com
estes quadros mentais, presentes em muitos comentadores brasileiros,
não admira que o nacionalismo, se transforme frequentemente em ignorância,
capaz de provocar uma risota generalizada neste lado do atlântico. C
F
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