O que intrigava Tâmara era como Taciana
conseguira escrever três páginas, sobre um painel
que estava no átrio da escola. Também ela olhara para ele, gostara até das cores, mas para dizer só
isso, pouco mais dava que três linhas, e foi o que
fizera. Três páginas era demais, pensou para si, ainda por cima em letra miudinha! Rafael escrevera
apenas uma página. Contou o seu primeiro contacto com o painel, depois a descoberta que foi fazendo
desde o 7º. dos seus pormenores, e até descreveu um episódio hilariante. Estava tão
distraído a conversar com a Liliana que bateu com a cabeça na
chapa. "Era quase um diário, numa página!".
Espantou-a também o Francisco, escrevera página e meia. "Mas esse fez batota". Descobriu, num
livro de português que a personagem reproduzida era
o Padre António Vieira, mencionou a
data do seu nascimento, a congregação religiosa a
que pertencia, descreveu as suas vestes e terminou
transcrevendo parte de um lindo sermão
pregado em Roma em 1672. Apesar de ter sido algo
"chato" havia que reconhecer, dizia para
consigo Tâmara, aprendera a ver com outros olhos o
painel. Aliás era-lhe agora difícil não se lembrar
quando o via de tudo o que aprendera. "Estava lá
tudo!". Uma verdadeira surpresa foi também o
Pedro: escreveu duas páginas. Discursou sobre o
"fora" e o "dentro", o que se
mostrava e o que se ocultava. Mostrava-se um painel
moderno, mas escondia-se, porque deteriorado, um
fresco da pintora Estrela Faria. Colocou em seguida
em confronto duas épocas, dois estilos e duas técnicas
de expressão, parecendo um verdadeiro filósofo,
afirmou: na nossa vida, sempre que concentramos a
nossa atenção em algo, tudo o mais é como se
desaparecesse. Daí afirmar que mostrar é também
ocultar. "Enfim, sempre se aprendeu qualquer
coisa sobre o que estava lá por baixo". Mas o
que ela não se conformava era com as "três páginas,
ainda por cima em letra miudinha!".
Carlos Fontes