Marcos e Figuras da Ciência Moderna
Novo
Universo | Criação da Física Experimental | Isaac Newton | Universo Newtoniano | Charles Darwin | Sigmund Freud | Albert Einstein
Há figuras na história da ciência em que é difícil
separar a ficção da realidade. Galileu Galilei (1564-1642) é um desses casos. É-lhe atribuída a criação da ciência
moderna. Embora seja bastante exagerada esta afirmação ela contém
algo de verdade.
O Novo Universo.
A concepção de que o universo não tinha centro, nem
limites, e que a terra não girava à volta do Sol, fora já sustentada na
antiga Grécia, mas a concepção dominante foi sempre a contrária.
Aristóteles, o grande génio da filosofia, apresentou, em defesa do
geocentrismo, argumentos que foram considerados durante séculos irrefutáveis.
Estes argumentos eram corroborados pelas descrições do Universo feitas na
Bíblia. A grande ruptura com esta concepção geocentrica ocorreu somente no
século XVI. Entre os que contribuíram para a revolução que então aconteceu
destaca-se Nicolau Copérnico (1473-1543). Na sua obra Sobre as Revoluções
dos Corpos Celestes explicou em pormenor como era mais belo ou estético
que o centro do universo não fosse a Terra, mas o Sol. Como escreveu: "Neste templo (o cosmos), o mais belo que
existe, quem poderia achar para esta lâmpada (o Sol) um lugar
melhor que este (o centro), de onde pode iluminar ao mesmo tempo
todas as coisas?".
Aristóteles numa
representação medieval
Gravura
do final do século XIX onde se ilustra a imagem medieval do mundo. Um viajante, nos confins do universo, vislumbra por
detrás das estrelas os mecanismos que produziam o seu movimento de rotação em torno da terra.
Galileu Galilei também acreditava nesta harmonia
cósmica, no entanto as suas observações levaram-no a concluir
que a mesma não se encaixava na antiga concepção do cosmos,
finito e hierarquizado segundo graus de perfeição. As observações
com a luneta revelaram-lhe que a lua não era um corpo cristalino
e sem peso, pelo contrário tinha vales e altas montanhas.
Acreditou mesmo que possuía rios, mares e florestas. Esqueceu-se
de afirmar era habitada. O Sol perdeu também a sua perfeição
cristalina, quando lhe descobriu manchas. Par espanto de todos descobriu que um planeta, Saturno, era rodeado de anéis. Esta
imagem era inconcebível na concepção anterior dos astros.
Todos deviam naturalmente de ser esféricos, porque a forma mais perfeita de
todas era a esfera. Observando o movimento pendular do lampadário
do Duomo de Pisa mostrou ainda que o mesmo se devia ao movimento de rotação da Terra.
Estes e outros factos eram mais do que suficientes para sustentar
que foi ele que apresentou provas concludentes a favor da concepção
heliocêntrica do Cosmos, embora não tenha sido o seu criador.
A
Criação da Física Experimental. A concepção matemática da
natureza defendida por Galileu não era nova, os pitagóricos
foram os primeiros a formulá-la na antiga Grécia, mas ninguém
o conseguira demonstrar. Neste aspecto, fez aquilo que ninguém
alcançara: fazer uma descrição matemática dos movimentos dos
corpos. Para isso utilizou um novo método - o método
experimental. Não foi também ele o seu criador. Há muito que
pululavam por toda a Europa filósofos que o defendiam, afirmando
que todas as teorias deveriam ser demonstradas através de experiências.
Mas Galileu foi mais longe, construiu instrumentos para medir
rigorosamente, por exemplo, a queda dos corpos. Afirmou todavia
que fazia estas experiências não para se convencer a si mesmo,
mas para convencer os outros.
Uma coisa podemos todavia concluir, é que quando
Galileu morre, todos aqueles que se dedicavam à descoberta da
natureza, tinham-no como uma referência. Ele era o símbolo de
uma ciência que procurava através do método experimental,
descobrir as leis matemáticas que governavam os fenómenos
naturais. A nova concepção do universo, heliocêntrica, apesar
de ser condenada pela Igreja era aceite por uma vasta comunidade
científica. Lentamente desde finais do século XV começou a
difundir-se uma outra concepção mais radical que retomava as
ideias dos atomistas gregos: o universo era infinito e os corpos
constituidos por atómos. Mas essa é outra história.
Isaac Newton (1642-1727) é outra
das figuras envolta em lendas, são-lhe atribuídas mais
descobertas do que aquelas que terá porventura feito. Não
parece ter qualquer veracidade a história da maçã que lhe caiu
em cheio no nariz quando debaixo de uma macieira reflectia sobre
os problemas da filosofia natural. Tudo não passou de um invenção
do seu sobrinho que contou a Voltaire e este se encarregou
escrever e difundir. Outras coisas oferecem todavia menos dúvidas.
O Cálculo Infinitesimal foi o poderoso instrumento
matemático que lhe serviu para muitas das suas descobertas. A sua criação foi o culminar do trabalho de gerações de matemáticos
desde a antiga Babilónia, passando no século XVII por figuras como Fermat ou Descartes, e a que Leibniz (1646-1716) deu a forma
que hoje lhe conhecemos.
A invenção foi atribuída a Newton, o
que é injusto para Leibniz. O importante é que Newton o soube
aplicar e ensinou outros a fazê-lo.
O Universo Newtoniano. A ideia que o universo é uma espécie de um grande
relógio que funciona segundo leis naturais simples (matemáticas),
e que uma vez posto em movimento por Deus se mantém eternamente,
não era seguramente uma ideia nova. Ao longo de todo o século
XVII muitos a haviam defendido como Descartes. Mas a descoberta
da Lei da Gravitação Universal por Newton, deu uma outra
consistência a estas ideias. Era a prova que faltava para que
pudesse ser assumida como uma teoria científica. A astronomia
matemática tornava-se assim uma das referências fundamentais da
ciência moderna. A sua mecânica assentava em alguns princípios
que julgou eternos: o conceito de um tempo e um espaço absolutos,
e a transmissão instantânea da atracção gravitacional. A história
veio depois a mostrar que em ciência, nada é absoluto, tudo está
sempre a ser revisto. No seu tempo, os países passaram a medirem-se
não apenas pelo seu desenvolvimento económico, mas também pelo
avanço das suas ciências. Newton teve neste ponto uma influência
determinante, não fosse um dos símbolos do progresso e poder do
Reino Unido.
A imagem do universo de Newton deixou ao seus
contemporâneos como o retrato fiel da natureza não durou nem
meio século. Era demasiado estático, numa altura que os homens
começavam a pedir mudanças. Em meados do século XVIII aparecem
as primeiras teorias sobre a origem do universo. Muitas das suas
formulações eram idênticas às dos antigos atomistas da antiga
Grécia e Roma, mas o modo como eram agora apresentadas faziam
uma grande diferença. Em 1745, o naturalista Buffon apresenta
uma hipótese sobre a formação da Terra e dos Planetas, dizendo
que se haviam formado a partir de fragmentos de matéria solar
que haviam sido libertados em consequência de um choque entre o
Sol e um grande cometa. Dez anos depois o célebre filósofo Kant,
em 1755, formula uma nova explicação para a origem do sistema
solar, com base em leis inerentes à própria matéria, sem
intervenção de forças divinas, sobrenaturais. No final do século,
o matemático e astrónomo Laplace publica, em 1796, a obra Exposição
do Sistema do Mundo, onde enuncia, nas notas,a sua hipótese da formação do sistema solar que, em muitos
pontos, era idêntica à de Kant. A sua hipótese é rapidamente
aceite entre os cientistas que a adoptam durante mais de século
e meio.
Há medida que se difundia estas
novas concepções do universo, mais clara se tornava a questão
de fundo: - Porque excluir o Homem de um processo evolutivo que
se aceitava ter ocorrido no Universo? No século V a.C. já
Anaximandro de Mileto havia afirmado que os primeiros homens
tinham origem noutros espécies, oriundas do mar. As primeiras
ideias evolucionistas, apoiadas em observações naturalistas,
devem-se ao botânico Lamarck (1744-1829). Outros se lhe seguiram.
O mais célebre de todos foi Charles Darwin (1809-1882), que se
tornará especialmente conhecido pela sua teoria sobre a evolução
da espécie humana. Darwin caracteriza-a como um brutal processo
de selecção natural das espécies de primátas, através da qual
só os mais aptos sobrevivem, e os menos aptos são
progressivamente eliminados. O Homem actual, se perdia desta
forma a presunção de ter sido criado directamente por Deus, não
deixava contudo de poder orgulhar-se de resultar de um apuramento
entre os melhores, os mais aptos. No nosso século, a ciência irá
precisamente sustentar não devemos confundir mais adaptados ao
meio como mais inteligentes. O Homem terá surgido dos mais
fracos e impreparados biologicamente para resistirem às adversidades do meio. Esta desvantagem aguçou-lhes a inteligência,
levando-os a inventarem outros recursos para poderem sobreviver.
O campo das ciências
médicas no século XIX é atravessado por notáveis descobertas que proporcionarão irradicar as causas que milenares flagelos.
Num campo insuspeito, o das doenças mentais, Sigmund Freud ((1856-1939)
mudará a nossa concepção do próprio homem. Acreditando que existia um determinismo na nossa actividade psíquica que nos
permite explicar mesmos as acções aparentemente sem qualquer
explicação, descobriu que a causa profunda do nosso comportamento estava no Inconsciente, onde encontrou uma força
dinâmica onde se agitam desejos e paixões, que nos "dirigem"
desde que nascemos, apesar de todas as censuras.
Conceitos
oriundos do método psicanalítico, criado por Freud, irão
influenciar todas as ciências, ditas sociais e humanas. Foi
acusado de reduzir as causas do comportamento humano, a simples
problemas de natureza sexual. Uma coisa é certa, as suas ideias
permitiram-nos perceber que os verdadeiros motivos que nos levam
a agir, não são necessariamente os que afirmamos ou temos
consciência. O homem tornou-se mais do que nunca um enigma para
ele próprio.
Há figuras incontornáveis no século XX, uma delas é Albert Einstein (1879-1955).
Em 1905, com apenas 26 anos de idade, publica quatro estudos que
revolucionaram as bases da ciência moderna, pondo fim aos princípios
absolutos de Newton. No primeiro artigo, aplicando à luz a
teoria dos quanta de Max Planck, explica o efeito fotoeléctrico: os quanta de luz, suficientemente enérgicos, podem extrair electrões dos
corpos em que batem. O próprio Planck hesita em aceitar esta
conclusão. No segundo artigo, demonstra que o movimento browniano, que se manifesta pela acção caótica das partículas
diluídas num gás ou num líquido, é um verificação observável
da teoria molecular da matéria.
No terceiro artigo estabelecia o célebre
princípio da equivalência da energia e da massa. O quarto
formulava as bases da Teoria da Relatividade, primeiro restrita a
sistemas com movimentos uniformes uns em relação aos outros.
Chega assim à mítica fórmula: E = mc2. O seu significado pode
não ser facilmente apreendido, mas todos sabemos que a mesma foi
provada de uma forma absolutamente terrível com a bomba atómica,
onde uma pequeníssima quantidade de urânio transforma a sua
massa minúscula em enorme energia. Uma quantidade que foi
suficiente para arrasar as cidades de Hiroxima e Nagazaqui. Com
Einstein não apenas se modificaram os nossos conceitos sobre o
espaço, tempo, energia, matéria e tantos outros que deixaram de
ser encarados como algo absoluto. Foi também durante a sua vida
que se alterou o nosso entendimento em relação à ciência.
Esta deixou de ser apenas sinónimo de progresso da humanidade,
para ser igualmente sinónimo de atentados contra o género
humano em que participam muitos cientistas. A ciência tornou-se
hoje um vasto conjunto de actividades, altamente especializadas,
envolvendo enormes investimentos, cujos resultados se expressam
frequentemente sob a forma de teorias dificilimas de entender
pelos não iniciados. Mas nunca foi tão necessário, como agora,
compreendê-la. Esta parece ser a única certeza.
Carlos Fontes |