Revista Filosofia Actual

Revista Logos

Uma História Mal Contada

Entre 1982 e 1984 surgiram em Portugal dois projectos editoriais cuja história anda a ser mal contada.

 

 
 
João Paisana (1945-2001)

Foi uma importante fonte de inspiração e ensinamentos para entender a arte numa perspectiva fenomenológica. Participou no grupo de discussão que se formou em torno da "Filosofia Actual".

-Fenomenologia e Hermenêutica. A relação entre as filosofias de Husserl e Heidegger, Presença, 1992
- História da Filosofia e Tradição Filosófica, Colibri, 1993
- Husserl e a Ideia de Europa, Ed. Afrontamento, 1997
- Da responsabilidade ético-política de um filósofo e das relações entre o seu pensamento e as suas opções e compromissos políticos efectivos , in Vértice,n.º 23, 2.ª série (Fevereiro de 1990). Lisboa

 

Joaquim João Coelho da Rosa (1949-)

Revelando uma enorme abertura de espírito participou nas discussões iniciais da Filosofia Actual, dando importantes contributos para uma nova releitura sobre a poética das artes e a política em Aristóteles.  Escreveu alguns textos. Farto da tacanhez do meio universitário português mudou-se para o Brasil.

-Lógica e metafísica em Aristóteles. introdução à lógica sapiencial. UC.FFBraga. Braga.1991

 

João Queiróz

Se em 2003 começou por produzir cartazes para os eventos em torna da Filosofia Actual, dois anos depois já realizava a sua primeira exposição -Katholische Hochschulgemeinde, em Viena (Austria). A fenomenologia continua a ser uma ideia inspiradora.

 

Luís Pedro Morais

Mergulhou na cosmologia produzindo uma das mais rigorosas obras de metafísica: O problema epistemológico das relações na cosmologia de Whitehead (2003).

 

Portugal não tem uma longa tradição de revistas filosóficas, quando as mesmas surgem quase sempre estão ligadas a contextos sociais e políticos marcantes.

 

Poucos anos depois do 25 de Abril de 1974, alguns jovens que antes e a seguir a esta data marcante na sociedade portuguesa haviam estado envolvidos em lutas políticas resolvem estudar filosofia na Faculdade de Letras de Lisboa, uns pela primeira vez, outras para concluírem cursos que haviam interrompido. Entre eles haviam também brasileiros fugidos à ditadura militar. Todos procuravam "arrumar" ideias numa época de refluxo de movimentos populares,

 

Filosofia, Política e Arte

Devido ao seu percurso pessoal os debates deste pequeno grupo centrou-se em torno da relação entre a filosofia, a politica e a arte.

Não foi por acaso que  certos espaços de aulas prologavam-se pela noite fora até de madrugada, com alguns professores que relevam grande abertura a estas temáticas, como João Paisana que dirigia o seminário sobre Maurice Merleau-Ponty ou Joaquim João Coelho da Rosa cuja cadeira de Ontologia (1982/3) foi transfigurada num espaço de debate sobre o discurso político de Aristóteles. 

Primeiro número da Filosofia Actual.  A capa foi desenhada por João Queiroz e sede da revista era a minha casa.

Revista Filosofia Actual

Em Maio de 1983, na sequência de um largo debate sobre o significado político e intelectual comentário filosófico foi publicado 1º. número da Filosofia Actual, com os "últimos" comentários A. J . Lamy, J.V.R.de Queiróz, Marcello F. F. , Carlos Fontes. Os comentários não eram simbolicamente assinados.

No número dois, saiu em Junho de 1983, e todos tinham que afirmar-se como filósofos, sendo proibidas simbolicamente as referências bibliográficas. Participaram com textos A. J. Lamy, Carlos Fontes, João Coelho da Rosa, J. Duarte Saraiva, J.V. R. de Queiróz e Manuel J. Rodrigues.

O espaço de ruptura para uma parte do grupo devia centrar-se no campo de intervenções públicas e não em revistas. Neste sentido, o número três, saído em Novembro de 1983, contou apenas com textos de A. J. Lamy, Carlos Fontes, João Tiago Mexia e Luís Pedro de Morais.

Os novos elementos que entretanto começaram a participar no projecto da revista  manifestaram-se desde logo interessados num tipo de revista filosófica mais "tradicional", o que levou ao meu afastamento e do Luís Pedro de Morais. O número quatro surgiu em Abril de 1984, e a sede passou para a casa do Lamy. O projecto acabou por morrer.  

Intervenções (Públicas) Filosóficas

No espaço da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, em Maio de 1983, o grupo inicial da "Filosofia Actual"  realiza uma performance, onde consagra "Kant como Objecto Estético". A 23 de Junho  na Sociedade Portuguesa de Filosofia promovem três conferências sobre filosofia e estética: "O Novo Sentido do Filosofar" (João Barbosa), "O Fascínio dos Limites" (Carlos Fontes) e a abertura de possibilidades discursivas (A. Lamy).

Estas ações  tinham quase sempre algum impacto na comunicação social, graças a um excelente trabalho de bastidores. O Diário de Lisboa de 6/06/1983, por exemplo, destacava esta intervenção na FLL.

Dada a fragmentação do grupo, o projecto de intervenções públicas migrou, em 1984, para a nova revista - Logos.

E. Kant (1), Carlos Fontes e João Queiróz, a quem coube neste espaço o discurso de consagração de Kant como objecto estético. Dada a complexidade do tema foram espalhadas orelhas pela sala para que o próprio espaço fosse contaminado pela cerimónia.

Kant entrando na Biblioteca Matos Romão para assistir a mais uma cerimónia de consagração como objecto artístico. De pé pode ver-se Marcello F.F. (brasileiro)

A. Lamy na Biblioteca Matos Romão faz uma intervenção sobre os gostos de E. Kant. Ao fundo pode ver-se o antigo funcionário da biblioteca.

 

Vários espaços da Faculdade de Letras de Lisboa foram decorados com cartazes pintados por João Queiróz, que aqui pela primeira vez se revelou como um notável artista contemporâneo.

O vasto programa que foi organizado pela a consagração de E. Kant como objecto estético incluiu um concerto de música do século XVIII, interpretada por musico-funcionário da Secretaria de Estado da Cultura.

 

Revista Logos - Publicação Filosófica

Na minha casa, no inicio de 1984, estava já em gestação um novo grupo, com ideias muitos diferentes sobre o que devia ser uma nova publicação filosófica. Apesar diso três coisas foram consensualizadas: a gestão colectiva, a abertura a novos públicos não apenas universitários e arte como um eixo central da nova publicação.

O grupo inicial era constituído por Carlos Fontes e Luís Pedro de Morais, e em certa altura passou a contar com Adelino Cardoso, pois na sua qualidade de professor do ensino secundário podia trazer novas ideias ao projecto. 

O primeiro número da revista surgiu em Junho de 1984, como propriedade da Filosofia Aberta - Centro de Estudos  e Divulgação. A sede era na minha casa e a revista tinha três directores - Adelino D. Cardoso, Carlos Fontes e Luis Pedro de Morais. Os textos reflectiam a procura de novos públicos, nomeadamente entre os professores do ensino secundário.

Primeiro Número da revista Logos

Poética das Artes

Dando seguimento às intervenções públicas, um ponto central que fazia questão de manter, nos dias 29 e 30 de Novembro de 1984, realizamos na Sociedade Nacional de Belas Artes, um encontro entre filósofos e criadores de arte denominado "Poética das Artes", numa clara alusão a Aristóteles. Pelos intervenientes, número de participantes  e  temáticas abordadas o encontro foi um êxito assinalável. Consultar

Na forja estavam já novos projectos, mas que não tardaram a ser abandonados.

O número dois da revista Logos, no qual Adelino Cardoso altera a ficha técnica, assumindo-se como o director da revista.

Uma História Mal Contada

O número dois da revista estava pronto em finais de Novembro de 1984. Adelino Cardoso foi incumbido de levar os originais para impressão dada a sua maior disponibilidade na altura. Sem consultar ninguém resolveu alterar a ficha técnica da revista assumindo-se como o único director e transformando Carlos Fontes e Luís Pedro de Morais em seus colaboradores ! A própria morada sede da publicação desaparece neste número de modo a desligá-la do grupo fundador.

Tratou-se de uma clara traição ao espírito inicial que animara a revista Filosofia Actual e a Logos. Face a esta situação,  eu e o Luís Pedro tínhamos outros projectos e resolvemos mandar o Adelino às ortigas e à sua ideia peregrina de ser um dia professor universitário...  

Anos depois vem o dito atribuir a razão do fim da Logos ao amadorismo dos grupo inicial, omitindo o seu miserável oportunismo e deslealdade.  O Centro de Filosofia da FLL, onde Adelino se conseguiu encaixar, acabou por difundir esta versão dos factos, como se pode ver pela amostra.

- Philosophica

- Cultura

Da Logos saíram ainda alguns números, mas numa lógica e ao serviço de interesses que já nada tinham a ver com as ideias que inspiraram a criação deste projecto. 

Carlos Fontes

Notas:

 

 

 

 

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