O ensino da filosofia possui em
Portugal uma longa tradição que não pode ser descurada na sua
abordagem. Tem sido múltiplas as influências que nele se fizeram sentir,
embora nos dois últimos séculos predomine a influência francesa.
1. Finalidades
Três finalidades costumam ser apontadas para o ensino da
filosofia:
a) Estruturar numa síntese coerente os vários saberes que de uma forma dispersa
são ensinados nas escolas. A filosofia é, neste ponto, encarada como o coroando
dos estudos pré-universitários. Referência filosófica: Hegel
b) Possibilitar uma aprendizagem de questionamento, de dúvida
metódica, de problematização do senso comum e dos preconceitos sociais e
culturais. Referência filosófica: Sócrates.
c)Educar em liberdade e para a liberdade. O ensino filosófico
desde a revolução francesa que se constituiu como uma educação para
cidadania, o que implica uma consciência dos direitos e dos deveres enquanto
cidadãos, assim como a sua
fundamentação alicerçada numa teoria moral e da política, independente de
todas as referências religiosas ou ideológicas. Trata-se de facultar o acesso
à autonomia da razão, numa altura que os alunos vivem uma fase de profundas
incertezas. Referências filosófica: Kant e os grandes ideais republicanos.
2. Programas
Os programas de filosofia até 1974 foram quase sempre
organizados em função das grandes áreas disciplinares da filosofia-
Psicologia, Lógica, Moral e Metafísica. A partir de 1974 os programas começam a
estruturarem-se em torno de temas ou noções específicas.
A orientação global dos programas, desde o século XVIII,
oscilou entre o ecletismo e o dogmatismo.
3. Métodos
O problema central do ensino
da filosofia foi sempre a questão de como despertar os alunos para
uma atitude reflexiva. Os diversos métodos empregues pelos
professores são no fundo, o expediente julgado adequado para
atingir este objectivo.
1.O professor de filosofia até 1974,
só em alguns curtos períodos históricos possuiu liberdade de alterar a sequência dos conteúdos
programáticos. O seu ensino estava estritamente vinculado a um manual
ou um programa oficial.
2. O método de
ensino que maior tradição adquiriu em Portugal foi o magistral.
A atitude reflexiva e o discursiva do professor sobre os diversos
temas, era considerado suficiente para que o aluno adquirisse as competências
filosóficas. O professor era o modelo a imitar em termos morais e
intelectuais. Os conteúdos eram apresentados de uma forma dogmática
ajustada às tarefas de memorização. O professor expunha um assunto,
fazia o seu exame crítico, argumentava de acordo com as diversas teses, e
concluía em conformidade com o esperado.
3.Nos anos trinta, do século XX,
os textos oficiais começaram a recomendar o método
socrático para o ensino da filosofia. O professor através de interrogações
sucessivas conduziria o aluno à verdade, única e universal. É preciso
dizer que durante séculos foi questionado vezes sem conta, a utilidade da memorização para o
exercício do filosofar. O método socrático tem todavia um grande
inconveniente: exige da parte dos professores um conjunto de
competências e habilidades que só raramente se encontram
reunidas. Conclusão: o que se recomenda quase nunca é
praticado.
4. Nos anos cinquenta, aponta-se
o comentário de textos como o método mais adequado para estimular a
reflexividade dos alunos. Esta prática pedagógica só será efectivada depois de 1974.
5. Nos anos oitenta face às
mudanças qualitativas e quantitativas da população escolar no
ensino secundário, começam
a difundirem-se novas concepções de ensino que suprimem a carga mais
teórica, em favor do treino de certas capacidades próprias do pensar. O ensino
da filosofia aparece, por vezes, reduzido a três objectivos:
a) Conceptualização: Definição e elaboração de conceitos
a partir noções vagas, ou dito de outra forma, elaboração de noções
abstractas a partir de casos concretos.
b)Problematização: Colocar em questão
as evidências do senso comum, ou na sua forma mais imediatista: análise de
problemas, avaliação de posições em confronto, formação de opiniões
fundamentadas.
c)Argumentação: Exposição de razões de duvidar e
argumentar. Elaboração de discursos coerentes e fundamentados.
A estas objectivos, junta-se um outro mais pacífico, isto é, a
transmissão de um conjunto de conhecimentos de natureza histórica
sobre algumas figuras e questões que marcaram o pensamento ocidental.
4. Modelos de Ensino da
Filosofia
Tomando como referência os trabalhos de
François Galichet, podemos dizer que em termos globais, o ensino da filosofia é percorrido por quatro lógicas que se
entrecruzam, mas não se confundem totalmente:
1. Lógica
da instrução: A filosofia é
assumida como um acesso à racionalidade. Este acesso pode ser obtido
a partir de dois métodos distintos: a) o método magistral; b) o
método socrático. Referências filosóficas fundamentais: Platão e
Hegel.
2.Lógica
da Aprendizagem: Acentua a liberdade
e a aquisição dos meios para o exercício autónomo do pensar (
rigor, espírito crítico, capacidade de argumentação, etc.). A
finalidade do ensino filosófico é essencialmente a de
possibilitar a aquisição de conhecimentos ou saberes indispensáveis
à vivência numa sociedade democrática ( problematizar,
conceptualizar e argumentar). Referências filosóficas fundamentais:
J. Dewey.
3. Lógica da Explicação: O
ensino filosófico é integrado no contexto de uma actividade
científica transdisciplinar. Trata-se de permitir que o aluno seja capaz de analisar,
explicar e criticar as ideologias e o senso comum, habilitando-o com
conhecimentos oriundos da sociologia, psicanálise, história,
estética, linguística, etc. A filosofia apresenta-se como uma
prática transdisciplinar que recorre à multiplicidade de saberes
científicos para decifrar imagens, textos, ideologias, etc que
atravessam a sociedade contemporânea. Referências filosóficas
fundamentais: Michel Foucault, J. Derrida.
4.Lógica de confrontação: O
ensino é concebido como um reencontro com o outro, como princípio de
uma normatividade divergente da minha que reclama uma clarificação
de posições. Referências filosóficas
fundamentais: Habermas e a sua ética da discussão.