O currículo
constituiu um dos factores que maior influência possui na qualidade do ensino.
Este aparente consenso, esconde um equívoco. Não existe uma noção mas várias
noções de currículo, tantas quantas as perspectivas adoptadas O curriculo continua a ser frequentemente identificado, com o "plano de
estudo". Currículo significa, neste caso, pouco mais do que o elenco
e a sequência de matérias propostas para um dado ciclo de estudos, um nível
de escolaridade ou um curso, cuja frequência e conclusão conduzem o aluno a
graduar-se nesse ciclo, nível ou curso. "Em termos práticos, como escreve
Ribeiro (1989), o plano curricular concretiza-se na atribuição de tempos
lectivos semanais a cada uma das disciplinas que o integram, de acordo com o seu
peso relativo no conjunto dessas matérias e nos vários anos de escolaridade
que tal plano pode contemplar". Este conceito de
currículo, muito próximo do conceito de programa, como foi formulado por
Bobbit (1922), evoluiu para um conceito mais amplo que privilegia o contexto
escolar e todos os factores que nele interferem. Procurando traduzir estas novas
concepções Ribeiro (1989), propôs a seguinte definição mais operacional de
currículo : "Plano estruturado de ensino-aprendizagem, incluindo
objectivos ou resultados de aprendizagem a alcançar, matérias ou conteúdos a
ensinar, processos ou experiências de aprendizagem a promover".
Mas o
curriculo não é apenas planificação, mas também a prática em que se
estabelece o diálogo entre os agentes sociais, os técnicos, as famílias, os
professores e os alunos. O currículo é determinado pelo contexto, e nele
adquire diferentes sentidos conforme os diversos protagonistas.
A Natureza Política do Currículo
No final dos anos quarenta, Tyler (1949),
definiu as quatro questões básicas que qualquer currículo deveria responder:
a) Que
finalidades educacionais deve procurar a escola atingir?
b) Como podem
seleccionar-se as experiências de aprendizagem que podem ser úteis para alcançar
estes objectivos?
c) Como podem
organizar-se as experiências de aprendizagem para uma instrução eficaz?
d) Como se
pode avaliar a eficácia das experiências de aprendizagem?
Estas questões
partem do pressuposto que a primeira definição de um currículo é de natureza
filosófica e política e não técnica. A primeira tarefa não é seleccionar
ou organizar experiências de aprendizagem, mas definir a finalidade da educação.
Antes da definição de um currículo as sociedades devem interrogar-se sobres
as intenções e funções sociais das escolas e quais os saberes relevantes em
cada cultura que se deseja que os seus cidadãos possuam. A principal função
de um currículo é assim, a de materializar estas intenções, tornando-as
explicitas, isto é, susceptíveis de serem debatidas e conhecidas pelo conjunto
da sociedade, e para poderem servir de orientação aos diversos agentes que
intervêm na planificação e concretização do processo de ensino e
aprendizagem.
A
reforma curricular não é mais do que a concretização, dos objectivos
definidos numa nova política educativa para todo o país, tendo em vista
produzir alterações significativas no sistema educativo. É neste quadro
complexo que se irá configurar o currículo, sendo essencial ter presente questões,
tais como: a) A definição mais ou menos explicita dos objectivos que
deverão ser prosseguidos;
b) A tradição curricular do respectivo sistema educativo;
c) O tipo de
currículo (aberto ou fechado); d) O modelo de organização (centrado em
disciplinas ou em temas); e)
A selecção
das matérias e respectivos conteúdos;
f)
A forma como os intervenientes no sistema educativo participarão;
g)
As medidas de apoio à mudança curricular, etc.
Definição, Inovação e
Adaptação Curricular
A definição
curricular é um momento de grande tensão. A fundamentação racional da
selecção das matérias e conteúdos do currículo é apenas uma parte do
processo. A outra menos evidente, mas decisiva são os conflitos entre as
disciplinas por questões de status, recursos e territórios ( Goodson, 1987).
Isto explica, como refere Marchesi (1998), que apesar dos avanços científicos
e técnicos, o currículo tende a manter a mesma estrutura de disciplinas ao
longos dos tempos. Qualquer alteração ao currículo é vivida como uma ameaça
aso grupos instalados, e uma oportunidade aos que pretendem entrar no sistema.
Os grupos de pressão ligados às várias disciplinas, nas alturas de reforma
curricular, desenvolvem no sistema educativo uma intensa luta de bastidores por
uma distribuição das matérias e conteúdos mais favoráveis aos respectivos
grupos.
A inovação
curricular apesar de tudo acontece. Gonzáles e Escudero (1987), definiram neste
domínio três grandes enfoques teóricos: a) No enfoque técnico-científico as
mudanças curriculares são tratadas como meras questões técnicas. Os currículos
são altamente estruturados, limitando-se o papel dos professores á simples
execução de instruções superiores. b) No enfoque cultural dá-se uma grande
importância à complexidade dos processos de mudança e às suas interacções.
A cultura das escolas é particularmente valorizada. O papel do professor é
valorizado, como agente e interprete das culturas em presença. c) No enfoque sócio-político,
a mudança é perspectivada em termos políticos e ideológicos. O que é
particularmente valorizado são as condições históricas e sociais. Os
professores tendem a ser reduzidos ao papel de simples instrumentos do poder.
O curriculo
está permanentemente a ser construído. Na prossecução dos objectivos
definidos para o curriculo, os professores não realizam simples operações mecânicas.
Embora apliquem o curriculum para atingirem certos objectivos, podem sempre
seleccionar e organizar as experiências de aprendizagem, adaptando assim o
curriculo. A questão é saber se ao fazê-lo não estarão já a definir novos
objectivos e portanto a alteraram a essência do curriculo.
Avaliação Curricular
A avaliação
curricular, no entendimento que desde os anos oitenta tem sido consagrado,
procura justamente averiguar, em diferentes níveis, a eficácia dos
objectivos que foram definidos para o currículo.
A avaliação curricular deveria constituir
um trabalho prévio a qualquer reforma curricular. A realidade portuguesa
demonstra que só muito pontualmente esta avaliação é feita. Decreta-se uma
reforma curricular sem previamente se analisarem as causas dos resultados
negativos de todo o sistema de ensino. As causas podem não estar nos currículos,
mas em outros factores que interferem nas escolas.
Foi contra esta tentação apressada de
decretar reformas curriculares que Hoeben (1994), revendo a literatura, definiu
os parâmetros de uma avaliação do currículo centrada nos resultados. Segundo
este autor a mesma deveria considerar apenas questões, tais como: Estão os
objectivos ou os efeitos pretendidos com o currículo a ser cumpridos? O tempo
é suficiente para os professores poderem ensinar e os alunos aprenderem? A
estruturação dos objectivos e dos conteúdos é clara, progressiva e geradora
de novas oportunidades de aprendizagem ? O currículo está dividido em pequenas
unidades que possibilitem uma eficaz construção de instrumentos de avaliação
da aprendizagem (testes, observações, etc.) ? Face ao rendimento inadequados
oferece aos professores possibilidades para deixarem que os alunos recuperem os
atrasos? O currículo eficaz, nesta perspectiva, é todo aquele que
apresenta uma estruturação que facilita a estruturação das oportunidades dos
alunos a aprenderem num tempo e ritmo adequados ao seu desenvolvimento.
Esta perspectiva técnica, não ignora que
outros factores não possam influir na eficácia de um currículo, como: as
características dos alunos ( capacidades, desenvolvimento, motivação, nível
sócio-económico dos país, etc); as características dos professores (formação
académica, formação pedagógica, actualização científica, motivação, etc),
as características dos recursos didácticos disponíveis (manuais, mediatecas,
etc); as características dos subsistemas educativos (aulas, escolas, administrações
regionais e locais, etc). Em todo o caso, estes factores não se podem
confundir com o currículo propriamente dito, são de outra natureza.