Carlos Fontes

Barbárie

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Europa:

Os imigrantes negros e muçulmanos são um perigo público ?

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A onda de destruição que varreu a França, em Novembro de 2005, foi interpretada em muitos países da Europa como a confirmação da teses há muito propaladas pela extrema-direita: a entrada maciça de imigrantes africanos e muçulmanos, mais dia menos dia acabaria por se tornar num perigo para a ordem pública. A razão não seria de natureza racial, mas cultural. 

1. Negros e Árabes 

Os africanos negros, estariam marcados pelas memórias da colonização europeia, nomeadamente pela escravatura. Ainda que os seus filhos possam aceder à cidadania francesa, inglesa, portuguesa, italiana, alemã ou outra qualquer europeia, jamais se sentirão verdadeiramente europeus. A cultura e a história destes países europeus, seria um obstáculo intransponível para o nascimento de laços de pertença. 

A mais pequena dificuldade nos seus percursos de vida, acaba inevitavelmente por fazer renascer antigas humilhações, complexos de inferioridade ou memórias colectivas julgadas esquecidas ou aceites sem desconforto. A culpa será sempre atribuída aos antigos colonizadores, nunca assumida pelos próprios. O ódio torna-se um lema de vida.

Os muçulmanos, não importa a raça, seriam sempre uma ameaça pela forma como procuram impor-se e não integrar-se num espaço cultural que não é seu. Onde chegam procuram desde logo delimitar o seu território, subtraindo-o ao domínio dos infiéis. A cidadania quando lhes é concedida num qualquer país de matriz cristã, pouco mais é do que uma mera formalidade legal aceite por questões de sobrevivência. 

Um muçulmano jamais se sentirá francês, português, italiano, espanhol, etc. Com base nestas teses está a ser explicada as "reais " motivações dos muçulmanos envolvidos nos atentados e assassinatos nos EUA, Espanha, Holanda, Grã-Bretanha e agora nos actos de vandalismo ocorridos em França. O seu objectivo comum é o de destruírem os povos infiéis (cristãos, judeus, etc). Neste contexto, de nada serve à França proclamar-se como um Estado laico, quando o que está em jogo é a justamente a sua matriz cultural cristã. 

A conclusão acaba por ser sempre a mesma: Os imigrantes muçulmanos nunca serão integráveis, e quantos mais forem maior será o perigo que representam para a ordem pública.     

Este tipo de discursos aponta claramente para uma perspectiva de in-comunicação entre os povos e culturas. A mestiçagem é assumida como um caminho perigoso, porque enfraquece uns em detrimento de outros, nada cria de novo.  

2. Um Difícil Parto

A globalização acentuou um fenómeno que em alguns países europeus, nomeadamente Portugal, evidenciavam desde os anos 70: Está a nascer uma nova Europa, fruto do cruzamento entre os europeus e os povos das suas ex-colónias. Um intensa mestiçagem está a ocorrer na Europa, semelhante à que ocorreu no Brasil.

Como em qualquer processo histórico desta natureza há um factor que é essencial, mas é sempre doloroso - o tempo. É necessário tempo para que ocorram cruzamentos de povos e culturas,  para que entre pessoas de origens muitos diferentes se crie e consolide uma história em comum, permitindo o nascimento de novas culturas que superem velhos ódios e discriminações.

Uma coisa é certa, os europeus manifestam hoje um profundo e generalizado sentimento de nostalgia pelo seu passado. Um sentimento muito  idêntico àquele que experimentaram os romanos quando assistiram impotentes à derrocada do seu Império. Os europeus, durante séculos, viveram orgulhosos da sua herança cultural (greco-latinas, judaico-cristão), mas também dos seus valores e histórias nacionais. Hoje sentem que os seus valores estão em declínio. A razão é simples: a maioria dos novos habitantes da Europa, fruto de uma intensa e imprescindível imigração,  não se identificam com os seus valores, nem com a sua cultura e história. Em muitos casos manifestam uma viva hostilidade a tudo o que a mesma significa.

O Exemplo Francês

A França é, neste aspecto, o melhor exemplo desta agonia cultural da Europa. A imagem que este país tem de si próprio e aquela procura difundir no exterior está desfasada do tempo. A forma como a França interpreta o seu passado nos dois últimos séculos, por exemplo, é inaceitável para os novos imigrantes. Eles são oriundos de países conde os franceses praticaram em larga escala o tráfico de escravos, saques e matanças sem fim. É por isso que as grandes referências culturais da nação que se auto-proclama guardião dos grandes valores universais, como Liberdade, Igualdade e Fraternidade,  nada dizem a mais de 10% da sua população originária do norte de África e a sul do Sahara, quase todos de religião muçulmana (argelinos, marroquinos, tunisinos, etc).

A França acolheu imigrantes (mão-de-obra barata), mas remeteu-os para os arredores das suas cidades, confinando-os a guetos. Espera que as suas raízes desapareçam ou os seus traços fisionómicos se ocidentalizem. Se por um lado lhes concede a cidadania, por outro recusa integrar a cultura destes povos na cultura francesa (assumida como muito superior).

A discriminação instalou-se na sociedade francesa. Uma parte da sua população começou a ser tratada como franceses de segunda, olhados com desconfiança. Acontece que estes imigrantes não pararam de aumentar. O dilema é que sem eles a economia francesa não funciona.

Toulouse. 8 de Novembro de 2005. Imagens como esta esvaziaram a credibilidade da retórica francesa sobre os direitos humanos. 

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Estes processos históricos nunca foram pacíficos, as guerras no passado foram sempre uma constante, esperemos que agora não ocorram. Se assim acontecer, algo já se terá aprendido. 

Carlos Fontes

 

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